Às margens do Paraíba do Sul, a jovem Caetana se casou à revelia com o também
escravo Custódio, em uma cerimônia simples, na capela da fazenda Rio Claro, em
1835. A mucama de 17 anos tinha “grande repugnância ao estado de matrimônio” e
não lhe animava a ideia de aderir à vida conjugal com aquele que se tornaria seu
esposo. Com medo de Luís Mariano de Tolosa, seu senhor, o qual ordenara que se
casasse, Caetana disse sim no altar, mas entre quatro paredes não tardou em
fazer valer sua vontade. Negou-se a consumar o laço sagrado por três noites
seguidas, mesmo após árduas investidas do cônjuge.
Humilhado, Custódio se queixou à família da moça e acabou por despertar a ira
do padrinho Alexandre, dono da casa em que o casal morava. Na quarta noite em
que ela se negou a aceitar o marido na cama, Alexandre ameaçou castigar Caetana
por desobediência. Provida de uma coragem incomum para as mulheres da época, a
escrava fugiu aos prantos, sozinha, em direção à casa-grande.
Não se sabe se foi por pena, mas Luís Mariano Tolosa ouviu as queixas da
mucama, que trabalhava diariamente em sua casa, e decidiu consultar um advogado
para iniciar o processo de anulação do casamento. O processo de Caetana e
Custódio foi o primeiro (e um dos únicos) no Brasil que teve como ponto de
partida a negativa de uma escrava a consumar um casamento arranjado, como
mostrou a pesquisa de Sandra Lauderdale Graham, que descobriu essa história. Uma
vez iniciado, o trâmite abriu uma brecha na legislação vigente ao permitir que
escravos fossem ouvidos em Corte, num julgamento que envolvia três partes:
esposa, marido e Igreja. As testemunhas “puseram a mão direita sobre a Bíblia e
juraram dizer somente a verdade”. Apesar de todo o empenho das partes, a
anulação foi negada.
Para tanto, foi fundamental o depoimento do padre que selou a união do casal,
o qual chegou a afirmar em carta redigida em próprio punho que antes do
casamento ouviu no confessionário da boca de Caetana que ela manifestava vontade
de se casar. Durante cinco anos, a moça viveu separada de Custódio, sem consumar
o casamento, até o processo passar por todas as instâncias burocráticas
necessárias. Não há registros se depois da decisão judicial ela cumpriu seus
deveres de esposa e voltou a morar com o marido, o qual, aliás, em juízo,
afirmou não ter interesse em permanecer com ela contra sua vontade. Tampouco se
conhece de onde Caetana tirou força para desafiar as estruturas de poder da
sociedade de seu tempo, já que casamentos forçados, principalmente entre
escravos, eram comuns. O que se sabe é que o audacioso “não” de Caetana
reverberou na história como símbolo de coragem.
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