No Brasil, não existe cultura de prevenção. Em países onde há ciclones e terremotos, há simulações e exercícios frequentes, até para crianças. Aqui, até há pouco, sirenes e Mapeamentos de Risco (MRs) inexistiam. A impunidade ambiental (e não só) é regra: empresas não pagam multas e protelam obrigações de reconstituir ecossistemas — artigo 225 da Constituição federal, que, independentemente de comprovação de culpa, é responsabilidade objetiva.
A tragédia de Mariana teve alertas não levados a sério. O Ibama multou a Samarco por desmatamento ilegal, que desprotege as barragens, e pediu sua interdição, após ouvir órgão ambiental de Minas, que não se pronunciou. Condicionante ambiental da licença exigia plano de contingência, sirenes, que não existiam.
A Lei 1898 — das auditorias ambientais para empresas poluidoras, aprovada no Rio de Janeiro em 1991 — foi criticada: seria caro. Só foi cumprida 15 anos depois, inclusive pela CSN e Reduc: com diagnóstico preciso e ações de mudança tecnológica preventiva de R$ 400 milhões e R$ 1 bilhão, respectivamente. Pelo potencial destrutivo das barragens de rejeitos, estas devem ser submetidas a auditorias independentes. Municípios do Rio de Janeiro passaram a ter MRs, sirenes e sistemas de alerta de cheias dos rios a partir de 2007, com recursos do Fecam para o Departamento de Recursos Minerais, a Defesa Civil e o Inea. Vários prefeitos colocavam a publicação sob um jarro de flores e faziam obras em encostas e beira de rios, vedadas pelo MR. Nova lei obrigou que diretrizes do mapeamento fossem incorporadas ao uso do solo das cidades.
Em 2007, no segundo acidente das barragens da Cataguases, que contaminou as bacias dos rios Pomba, Muriaé e municípios do Noroeste Fluminense, acionamos, à frente da Secretaria do Ambiente, a Agência Nacional de Águas, o Ministério Público Federal e secretarias mineiras — que prometeram fiscalização e transparência. Admitiram que havia 40 barragens de risco, sem auditoria e plano da Defesa Civil, por pressão das mineradoras, por conta de custos. Até hoje, pescadores e agricultores do Noroeste fluminense não foram indenizados: um alerta para que a impunidade não se repita.
A proposta de Sebastião Salgado, que dedicou a vida ao reflorestamento das nascentes do Rio Doce, é a melhor. A volta à vida e atividades na região dependem da recuperação da Mata Atlântica e dos olhos d’água. Salgado propôs um fundo de recuperação, mas preocupa-se com quem irá geri-lo, para o recurso não ser desviado. No Ministério do Meio Ambiente, criamos, em 2009, o Fundo Amazônia — operado pelo BNDES e gerido por conselho com SBPC, sssociações de seringueiros, municípios. Não houve desvios, mas a execução foi lenta: foram aplicados só 30% de uma doação da Noruega, de US$ 1 bilhão. Há que ter probidade e agilidade, para que o fundo apoie já ações que enfrentem a tragédia, regenerem o deserto produzido pela inépcia e reconstituam condições de vida de populações desterradas e agredidas.
Carlos Minc é deputado estadual (PT-RJ)
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