domingo, 30 de março de 2014

Te Contei, não ? - Outro 'Vinícius' preso sem provas

Tal qual o ator Vinícius Romão, um morador da Pavuna ficou na cadeia mesmo sem cometer crime

Te Contei,não ? - 'Vaquinhas' estão à solta


Em época de contribuições para condenados no mensalão, sites buscam outros focos

Artigo de Opinião - Facebook e sala de aula - Marcus Tavares

A rede social acaba se transformando numa ágora coletiva de trocas de opinião, pela qual passamos a nos conhecer melhor

Entrevista - Lilian Thuran - ' Chega de Racismo'

CLAUDIO NOGUEIRa

Na luta. Thuram, campeão mundial de 1998 pela França, mantém fundação contra o racismo e preconceitos
Foto: Ivo Gonzalez
Na luta. Thuram, campeão mundial de 1998 pela França, mantém fundação contra o racismo e preconceitos Ivo Gonzalez

Crônicas do Dia - O que se faz sem pensar = Roberto Damatta

Seria mentira dizer que eu fui um adepto de “piqueniques”, esse francesismo para “pic-nic” — ritual de comer com amigos a céu aberto que nasceu quando surgiu a dualidade entre o campo e a cidade. Sua aparição do Oxford English Dictionary data de 1746.
Fiz uns dois piqueniques em Juiz de Fora, e tenho a memória viva de um outro piquenique num jardim de Petrópolis. Lembro-me das cobertas de lã a nos separar da grama, da cesta com sanduíches, dos sucos de frutas e do meu desconforto em comer sem a velha e indispensável mesa.

Artigo de Opinião - Indiferença diante da morte - Luciano Rinaldi

Em primeira página, noticia O GLOBO de 8 de março o assassinato de dois policiais militares no exercício de suas funções, após troca de tiros com criminosos. E que, nos últimos dois anos, o número de mortes chega a dez. No editorial “Em defesa dos policiais e das UPPs”, merece registro a pertinente referência acerca da passividade da população diante do fato.

Crônicas do Dia - A cor da mente


Cristovam Buarque

Te Contei, não ? - A Inconfidência sem fantasia

A Inconfidência sem fantasia



Livro de Pedro Doria sobre a Conjuração Mineira mostra que os fatos podem ser mais cativantes que a mitologia em torno do tema

Por Bolívar Torres

Ao longo dos séculos, a Inconfidência Mineira passou por percepções históricas conflitantes. Foi abafada pela coroa portuguesa logo após seu fracasso, em 1789; romantizada pelos republicanos, que encontraram na figura de Tiradentes o grande herói da pátria; e, finalmente, desconstruída pelos historiadores modernos, que divergem sobre a real importância do movimento.

Quando decidiu se debruçar sobre a revolta que quase mudou o país, o jornalista Pedro Doria, editor-executivo do GLOBO, tinha consciência de que precisaria lidar com lacunas, contradições e distorções. Mas ele não fazia ideia de que os fatos documentados podiam ser ainda mais cativantes do que a mitologia que envolve o movimento. Em seu livro “1789”, já disponível em formato digital pela Nova Fronteira e com lançamento físico previsto para os próximos dias, ele reconstrói a trajetória dos conspiradores que sonharam com uma revolução liberal no Brasil, mas sem abrir mão do rigor histórico. Nos documentos oficiais, como os inquéritos dos “Autos da devassa”, encontrou material suficiente para uma trama repleta de peripécias.

— O historiador busca descobertas e novas interpretações. Já o meu trabalho aqui é diferente: quero contar uma história da forma mais agradável possível — explica o jornalista, também autor de “1565 – Enquanto o Brasil nascia” (Nova Fronteira). — Acho que o país hoje já tem a maturidade para entender as coisas como elas são. Vivemos numa sociedade que não precisa mais transformar seus heróis em mito. Um país que não precisa de heróis perfeitos.

Uma Inconfidência sem floreios romanescos está à mostra em “1789”. A história por si só já traz doses de ação, aventura, sexo, romance e espionagem, com uma miríade de personagens fortes. Tiradentes é figura central, mas não a principal. O alferes dos Dragões de Minas se desenha como um Tiradentes possível: não é o mais culto dos rebeldes, mas está longe do inocente útil pintado por alguns revisionistas. Tinha mais dinheiro do que muitos de seus parceiros de Inconfidência, mas também não era rico. O congelamento social em que se encontrava, porém, pode ter sido uma das motivações para sua intensa participação no movimento. O livro traz ainda o primeiro retrato presumido do alferes, feito a partir das descrições de quem o conheceu: com um bigode militar substituindo a barba bíblica imaginada pelos republicanos.

Revolução liberal

Na trama, Tiradentes divide o protagonismo com outros idealizadores da revolta, como os poetas Inácio José de Alvarenga Peixoto, Tomás Antonio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa, o cônego Luis Vieira da Silva, os padres José da Silva e Oliveira Rolim e Carlos Correia de Toledo, entre outros entusiastas das ideias iluministas do período. Leitores de Voltaire e Montesquieu, eram personalidades eloquentes e cultas, mas também contraditórias: afinal, exibiam diversos vícios do regime que tentavam combater. Mesmo assim, formavam “uma turma sofisticadíssima”, segundo o autor.

Doria costura a trajetória dos personagens numa rede complexa, composta por intelectuais, contrabandistas, criminosos e poetas. Nela, misturavam-se interesses econômicos e pessoais, estratégias pragmáticas e românticas. As ligações perigosas se estendiam até as embaixadas de Washington e Paris, nos encontros secretos no sul da França entre o inconfidente José Joaquim Maia e o diplomata Benjamin Franklin, uma das cabeças por trás da Revolução Americana.

Segundo Doria, a Inconfidência poderia ter provocado a primeira revolução liberal da América do Sul, e apenas a terceira do período, junto com a Americana (1776) e a Francesa (1789). Seria uma revolução conquistada nos campos de batalha, com pais fundadores, que teriam que administrar seus próprios conflitos, além de debater uma constituição e enfrentar questões como escravidão e representatividade política.

Um cenário muito diferente do 7 de setembro de 1822, quando o Brasil foi “presenteado” com uma independência proclamada por um futuro rei. Não se sabe muito bem quais eram as ideias dos inconfidentes, mas o jornalista tem certeza de que uma vitória dos rebeldes teria mudado completamente a cara do país.

— Provavelmente seria algo atrapalhado, assim como aconteceu nos Estados Unidos, que só foi se tornar uma verdadeira potência depois da Primeira Guerra — lembra ele. — Porém o mais importante é que seria uma revolução nossa. Teríamos lutado numa guerra para conquistá-la, fundando uma república jovem no momento em que se inventava o que é ser uma república. Não sei que solução eles encontrariam, mas teríamos o marco fundador de uma democracia liberal, no sentido de que uma nação deve ser responsável pelo seu próprio governo. Isso era um conceito muito radical, e estaria incrustado na história da nossa independência. Não temos na nossa independência este valor forjado a fogo. E acho que é isso que nós perdemos na Inconfidência.

De acordo com Doria, a Inconfidência fascina “pelo sonho do Brasil que poderia ter sido”. Por isso se tornou símbolo do que consideramos nossas melhores características.

— Não é à toa que sempre revisitamos a Inconfidência nos momentos de transição do país — observa.


O Globo

sábado, 29 de março de 2014

Vale a pena assistir - As gerações românticas no Brasil


Vale a pena assistir - Romantismo


Te Contei,não ? - Segunda Geração de Poesias do Romantismo

Segunda Geração Romântica: mal-do-século
Inspirados nas obras dos poetas Lord Byron, Goethe, Chateaubriand e Alfred de Musset, os autores dessa geração também são conhecidos como "byronianos". As principais características da geração são: o individualismo, egocentrismo, negativismo, dúvida, desilusão, tédio e sentimentos relacionados à fuga da realidade, que caracterizam o chamado ultra-romantismo. São temas recorrentes nas obra dos autores da segunda geração: a idealização da infância, a representação das mulheres virgens sonhadas e a exaltação da morte. Seus principais poetas são Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Junqueira Freire e Fagundes Varela.

Quem foi...
Lord Byron (1788 - 1824)
George Gordon Byron foi um poeta romântico inglês que influenciou toda uma geração de escritores com sua poesia ultrarromântica. A ele estão associados termos como o spleen, que significa tédio, mau humor e melancolia, geralmente causados por amores não correspondidos ou pela descrença na vida em razão da aproximação da morte, temáticas comuns na poesia ultrarromântica.
De família aristocrática (porém, com dívidas), passava a vida a escrever poesia e a gastar dinheiro, vivendo no ócio. Suas principais obras são Horas de Lazer (1870), A Peregrinação de Childe Harrold(1812-1818) e Don Juan (1819-1824).

Álvares de Azevedo (1831 - 1852)
Álvares de Azevedo nasceu em São Paulo em 1831 e faleceu, vítima da tuberculose, em 1852.

Poeta romântico por excelência, Álvares de Azevedo nasceu em São Paulo e estudou na Faculdade de Direito, porém, não chegou a concluir o curso. Faleceu jovem, aos 21 anos, vítima da tuberculose e da infecção resultante de um acidente de cavalo. A partir de então, desenvolveu verdadeira fixação com a própria morte, escrevendo a respeito da passagem do tempo, do sentido da vida e do amor - esse último, jamais realizado.
Seu livro de poesias, Lira dos Vinte Anos (publicada postumamente em 1853), carrega consigo a melancolia de um poeta empenhado em expressar seus sentimentos mais profundos. O conjunto de poesias também evidencia um poeta sensível, imaginativo e harmonioso.
Pode-se dizer que sua obra possui características góticas, pois retratam paisagens sombrias, donzelas em perigo, personagens misteriosas, envoltas em vultos e véus entre outros.
Saiba mais:

Tuberculose: doença grave que pode atingir todos os órgãos do corpo, especialmente os pulmões, pois o bacilo causador (Koch) se desenvolve nas regiões do corpo em que há bastante oxigênio. Em estágios mais avançados, o doente passa a tossir com pus e sangue (a chamada hemoptise). Os principais sintomas são: tosse crônica, febre, suor noturno, dores na região torácica e perda de peso. No Brasil, muitos escritores do período romântico sofriam de tuberculose muitos chegando, inclusive, a falecer em decorrência da doença. Logo, aquela geração de poetas ficou conhecida como a "geração do mal-do-século", isto é, da tuberculose.

Romance gótico: subgênero originado na Inglaterra ao final do século XVIII. As principais características desse romance dizem respeito à atmosfera de terror, aos enredos assustadores e aos personagens. Neles, é comum encontrar cenários medievais, donzelas, cavaleiros, vilões e personagens do meio religioso e mistérios envolvendo as linhagens das famílias aristocráticas.

A frustração presente em sua obra é amenizada apenas através da lembrança da mãe e da irmã. Além disso, a perspectiva da morte, apesar de assustadora, traz conforto por saber que cessará a dor física causada pela doença e pelos sofrimentos amorosos do poeta. Veja no poema abaixo:
Se eu morresse amanhã!


Se eu morresse amanhã,viria ao menos
Fechar meus olhos minha triste irmã;
Minha mãe de saudades morreria
Se eu morresse amanhã!

Quanta glória pressinto em meu futuro!

Que aurora de porvir e que amanhã!
Eu pendera chorando essas coroas
Se eu morresse amanhã!

Que sol! que céu azul! que dove n'alma
Acorda a natureza mais loucã!
Não me batera tanto amor no peito,
Se eu morresse amanhã!

Mas essa dor da vida que devora

A ânsia de glória, o dolorido afã...
A dor no peito emudecera ao menos
Se eu morresse amanhã!

Além de poeta, Álvares de Azevedo produziu a peça de teatro Macário (1852), escrita após haver sonhado com o diabo. A peça conta a história de um personagem que, em uma viagem de estudos, faz amizade com um desconhecido e desobre ser ninguém mais, ninguém menos que o próprio satã. Não há menções sobre o nome da cidade em que eles se encontram, porém, há referências diretas à cidade de São Paulo. Assim, o poeta aproveita para fazer uma crítica à devassidão na qual a cidade estava imersa.
Azevedo também escreveu um romance chamado Noite na Taverna (publicada postumamente em 1855), uma narrativa composta por cinco histórias paralelas sobre cinco homens que relatam, em um bar, histórias de terror vivenciadas pelos mesmos. São eles: Solfieri, Bertram, Gennaro, Claudius Hermann e Johann. Os nomes são claramente europeus e fazem referência aos romances românticos produzidos naquele continente (especialmente os italianos e os alemães), bem como sua temática macabra, inspirada nos romances góticos.

Te Contei, não ? - Ultrarromantismo

O Romantismo tem origem na Alemanha do século XVIII, quando Goethe publica Os Sofrimentos do Jovem Werther, obra que anuncia os temas centrais do movimento romântico na Europa, como o sentimentalismo, a idealização da mulher e do amor e a evasão da realidade.  
Porém, aquele que se torna o mais marcante da primeira geração romântica brasileira é a evasão da realidade, mecanismo que permitiu aos nossos escritores descobrir o passado histórico do país e sua paisagem natural. Como foi explicado em Romantismo – Primeira Geração (link), o surgimento do movimento romântico em terras brasileiras coincide com o momento em que o país torna-se independente de Portugal, levando artistas e intelectuais do período à construção de uma identidade autenticamente nacional. O índio valoroso e a natureza abundante surgem como símbolos de brasilidade.
Veremos de que forma a segunda geração dará continuidade ao projeto romântico brasileiro.

MAL-DO-SÉCULO (ULTRARROMANTISMO)

Entre as características gerais do Romantismo, aquela que mais se faz presente na segunda geração do movimento no Brasil é a evasão da realidade. Só que essa evasão não acontece no tempo ou no espaço, como na primeira geração. Agora, a fuga da realidade ganha contornos trágicos. Os heróis românticos encontram na morte uma solução para seus problemas existenciais, podendo chegar, inclusive, ao suicídio. Isso acontece porque, de acordo com o pensamento romântico, o indivíduo vive em constante conflito com a sociedade, tornando-se uma espécie de “desajustado”. Essa sensação de constante desajuste tem como consequência alguns comportamentos tipicamente românticos: 
O Anjo da Morte (1851)  (Foto: Pintura: Horace Vernet/Reprodução)O Anjo da Morte (1851) (Foto: Pintura: Horace Vernet/Reprodução)
- pessimismo 
- dor existencial 
- sofrimento 
- isolamento 

Essas atitudes caracterizam aquilo que ficou conhecido como “mal-do-século”. Assim sendo, por levar o subjetivismo romântico às últimas consequências, a segunda fase do Romantismo no Brasil também é conhecida como geração ultrarromântica. A tela abaixo representa a atração que os artistas românticos têm pela morte também na pintura.

ÁLVARES DE AZEVEDO - LIRISMO DA DESCRENÇA

O principal representante do ultrarromantismo no Brasil é o poeta paulistano, com passagem pelo Rio de Janeiro, Álvares de Azevedo. Assim como os outros poetas de sua geração, coloca em segundo plano o nacionalismo da primeira geração e passa a explorar a subjetividade, o mundo interior, o que se passa nas profundezas do indivíduo, revelando uma visão trágica da existência. Suas obras mais famosas são o livro de poemas Lira dos vinte anos, a peça Macário e os contos de Noite na taverna. 
Soneto
(...)
Morro, morro por ti! na minha aurora  
A dor do coração, a dor mais forte,  
A dor de um desengano me devora...    

Sem que última esperança me conforte,  
Eu - que outrora vivia! - eu sinto agora  
Morte no coração, nos olhos morte! 

Observe que, nesses versos, a frustração amorosa provocada por uma mulher sempre idealizada e inacessível, leva o eu lírico a desejar a morte. Na poesia da segunda fase, parece que o eu lírico sente prazer em sofrer.

Outros autores
Junqueira Freire: aos 18 anos decidiu-se pela vida religiosa, ingressando no Mosteiro de São Bento. Sua obra tem como tema central a morte como libertação da matéria.
Fagundes Varela: poeta marcado pela perda prematura de seu filho e pelo aloolismo, sua obra explora temas nacionalistas e ultrarromânticos, mas também sociais, como a questão no negro, inaugurando uma tendência que será aprofundada na próxima fase do Romantismo no Brasil.

NO ENEM

(Enem -2010)
Soneto 
Já da morte o palor me cobre o rosto, 
Nos lábios meus o alento desfalece,
Surda agonia o coração fenece,
E devora meu ser mortal desgosto!
Do leito embalde no macio encosto
Tento o sono reter!… já esmorece
O corpo exausto que o repouso esquece…
Eis o estado em que a mágoa me tem posto! 

O adeus, o teu adeus, minha saudade,
Fazem que insano do viver me prive
E tenha os olhos meus na escuridade.

Dá-me a esperança com que o ser mantive!
Volve ao amante os olhos por piedade,
Olhos por quem viveu quem já não vive!
(AZEVEDO, A. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2000)

O núcleo temático do soneto citado é típico da segunda geração romântica, porém configura um lirismo que o projeta para além desse momento específico. O fundamento desse lirismo é
A) a angústia alimentada pela constatação da irreversibilidade da morte. 
B) a melancolia que frustra a possibilidade de reação diante da perda.
C) o descontrole das emoções provocado pela autopiedade.
D) o desejo de morrer como alívio para a desilusão amorosa.
E) o gosto pela escuridão como solução para o sofrimento.

Gabarito: B
Elaine Brito Souza

Artigo de Opinião - O direito ao esporte - Siro Darlan

No intervalo de apenas dois anos, o Brasil  sediará os maiores eventos esportivos do planeta: a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos. O direito ao esporte está previsto no artigo 227 da Constituição federal. No entanto, o legislador foi econômico ao traçar as regras disciplinadoras desse importante direito de crianças e adolescentes. É inegável que o direito ao esporte seguro e inclusivo para crianças e adolescentes pode contribuir para o desenvolvimento integral e seguro de meninos e meninasbrasileiros
A prática do esporte garantido a todas as camadas da população pode ser uma importante ferramenta para, em conjunto com os demais direitos, oferecer mais qualidade de vida e inclusão social a milhares de crianças e adolescentes excluídos da cidadania. O esporte seguro e inclusivo oferece condições essenciais para o desenvolvimento e contribui para promover uma transformação social. Foi através da prática de esportes nas ruas de Nova York que a prefeitura dessa grande cidade começou a combater a exclusão social de jovens. 
No Brasil, a despeito do desafio de realizar os dois maiores eventos esportivos do planeta, pouca coisa tem sido feita para ajudar a retirar as crianças das ruas através de práticasesportivas, e muito pouca atenção tem sido dada pelos responsáveis da garantia desse direito aos jovens atletas. 
Desde 2012 os pais de uma jovem atleta de doze anos vêm lutando junto ao Ministério Público, a quem compete zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais, assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis” (art. 201, VIII ECA) para que possam transferir sua filha, atleta de voleibol de um clube para o outro, uma vez que a Federação de Voleibol cobra uma taxa abusiva de R$ 3 mil para autorizar a transferência. 
Ora, ainda que o interesse fosse apenas individual, o que não é porque atinge a todos os atletas com igual pretensão, o fato é que os atletas interessados em se transferirem de um clube para outro ficam impedidos por uma norma administrativa de exercer um direito constitucionalmente assegurado da prática esportiva. Ainda que individual fosse, também o Ministério Público está obrigado a ações judiciais ou não em defesa dos interesses individuais, difusos ou coletivos de interesse da infância e da juventude. Contudo, está evidente a abusividade de tal cobrança, que impede o exercício de um direito. 
Imperioso que sejam garantidos todos os direitos fundamentais de crianças e adolescentes, mas o  esporte é o direito da moda, já que seremos a capital mundial de todos os esportes durante os próximos dois anos.
*Siro Darlan Oliveira, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, é membro da Associação Juízes para a democracia. - sdarlan@tjrj.jus.br 

Te Contei, não ? - Emprego dos "porquês"


Crônica do Dia - A maldição da linguagem racial - Demétrio Magnoli

DEMÉTRIO MAGNOLI
Publicado:
Carolus Linnaeus (Lineu), o pai fundador da taxonomia biológica, sugeriu uma divisão da espécie humana em quatro raças: europeanus (brancos),asiaticus (amarelos), americanus (vermelhos) e africanus (negros). Naturalmente, explicou Linnaeus, a raça europeia era formada por indivíduos inteligentes, inventivos e gentis, enquanto os asiáticos experimentavam inatas dificuldades de concentração, os nativos americanos deixavam-se dominar pela teimosia e pela irritação e os africanos dobravam-se à lassidão e à preguiça. Isso foi em meados do século XVIII, na antevéspera do surgimento do “racismo científico”. Como admitir que uma linguagem paralela seja utilizada por Ricardo Noblat, um jornalista culto e respeitado, na segunda década do século XXI?

Crônica do Dia - Volta ao lar - Cora Rónai

O Brasil não está preparado nem para receber brasileiros, quem dirá turistas. Eu também tenho pena de quem vem para a Copa


quarta-feira, 26 de março de 2014

Prefiro não comentar !!!!!


Literatura Africana - A galinha pertence à terra,. a águia pertence ao céu

A GALINHA PERTENCE À TERRA, A ÁGUIA PERTENCE AO CÉU
(Uma história africana)

Crônicas do Dia - O Racismo no futebol - Waldih Damous

Por trás de um discurso que negava a existência de preconceito racial, o Brasil sempre conviveu com um racismo enrustido

Te Contei, não ? Arma é a Educação

Dilma Rousseff recebe jogador Tinga e árbitro Marcio Chagas, vítimas de racismo no futebol

O árbitro Marcio Chagas e o jogador Tinga conversam com Dilma e Aldo Rebelo: Copa do Mundo terá ações de combate ao preconceito (Foto: Paulino Menezes)A presidenta Dilma Rousseff mostrou solidariedade às vítimas de racismo e reiterou a disposição do governo federal em combater este tipo de crime e o preconceito de maneira geral, nesta quinta-feira (13.03), quando recebeu o volante Tinga e o árbitro gaúcho Marcio Chagas. Eles foram vítimas de manifestações racistas em partidas de futebol, recentemente. Após o encontro, o jogador do Cruzeiro afirmou que espera pela punição de quem cometer esse tipo de ato e que o preconceito só poderá ser combatido por meio da educação.

“Espero que tenha a punição, mas não acho que somente isso vai mudar as coisas, mas a educação. Eu acredito muito que uma das maneiras de combater o preconceito é a educação. O preconceito está ligado à falta dela. Quando falamos em educação, não é só a escolar. Falo da cultura dentro de casa, começar a fazer nossa parte. Temos o costume de esperar tudo dos professores, do governo, mas temos que começar fazendo nossa parte como ser humano, como família. Combater o preconceito leva tempo e tem que ser feito pela educação.”

O árbitro relatou que o episódio ocorrido na partida entre Esportivo e Veranópolis, no dia 6 de março, não foi o primeiro caso em que sofreu racismo, mas foi o mais agressivo. Quando chegou a seu carro, Marcio encontrou bananas espalhadas pelo veículo, que também foi depredado. Além disso, o árbitro disse ter sido ofendido verbalmente. “Após o fato, resolvi expor a situação, que não foi a primeira, mas foi muito dolorosa. Acho que deve haver punições exemplares para coibir esse tipo de crime porque é algo que fere o sentimento, como ser humano. Acredito que fiz a coisa certa, que foi denunciar”.

Para Tinga e Marcio, o encontro mostrou que a presidenta está empenhada e preocupada com o preconceito no país. “Eu acho muito importante vir aqui, não somente como árbitro, mas como cidadão. Também foi importante ver a preocupação da presidenta quanto ao racismo. Eu, agora, posso transmitir a todos que há essa preocupação do governo. O futebol é um agente importante no nosso país, as pessoas param para assistir aos jogos e nada melhor que boas ações no futebol, para plantar e depois colher os frutos de um convívio harmônico”, opinou o árbitro.

“Achei interessante o fato de ela estar preocupada com essa situação que acontece no país todo”, comentou o jogador Tinga, que foi alvo de atos racistas em partida realizada no Peru, pela Libertadores, quando o Cruzeiro enfrentou o Real Garcilaso, em 12 de fevereiro. Cada vez que o atleta brasileiro tocava na bola, a torcida adversária imitava sons de macacos.
Copa do Mundo
O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, também participou do encontro e destacou a importância de o tema da Copa do Mundo abranger questões universais como a promoção da paz e o combate ao preconceito. “Evidente que a preocupação da presidente é a de expressar solidariedade e a determinação do governo em enfrentar esse tipo de problema. A presidente já manifestou a intenção de fazer uma Copa pela paz e contra o preconceito, junto à ONU e à FIFA, criando mecanismos de expressão de repúdio, com frases, faixas e ações que definiremos. É um evento com muita visibilidade, e as mensagens, transmitidas por ídolos como são os atletas, causam muito impacto”, afirmou.

Aldo Rebelo lembrou também que a lei brasileira classifica o racismo como um crime que não prescreve e com pena inafiançável. Após receber Tinga e Marcio, a presidenta se reuniu com representantes do movimento negro. A ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros, afirmou que o encontro dá continuidade às iniciativas do governo para combater o racismo e que a mensagem contra o preconceito deve ser propagar para além da Copa do Mundo.

“A grande contribuição que o movimento negro trouxe para essa discussão é que a questão principal não é o racismo na Copa do Mundo. Que a questão principal é o racismo que existe nas sociedades, e portanto se manifesta no futebol. E todas as propostas apresentadas hoje para a presidenta Dilma apontaram nessa direção. De todo modo, o governo está empenhado numa campanha que será feita da Copa contra o racismo”, disse a ministra.

Crônicas do dia - O futebol do país - Arthur Dapieve

O racismo boleiro é uma irrupção do racismo maior, enraizado e dissimulado na sociedade brasileira

Bem, agora que o carnaval acabou (acabou, né?) e o ano começou, podemos tratar do que realmente importa: futebol. Em meio a campeonatos estaduais moribundos disputados por equipes mortas-vivas, o pontapé inicial na temporada foi dado por duas manifestações de racismo ocorridas na semana passada: na quarta-feira, o árbitro gaúcho Márcio Chagas da Silva foi xingado por torcedores do Esportivo, em Bento Gonçalves; na quinta, o jogador Arouca, do Santos, sofreu o mesmo em Mogi Mirim.
Reações de apoio às vítimas e de repúdio aos imbecis logo vieram de muitas partes, inclusive da presidente Dilma Rousseff, mas todas elas continham em si alguma dose de surpresa, como se dissessem: “Racismo no Brasil?! É inacreditável... Racismo só há na casa dos outros!”. Difícil é crer que alguém de fato acredite nisso. Porque, como disse Tinga, do Cruzeiro, recente alvo do racismo no Peru: “No Brasil, a gente fala de igualdade, mas esconde o preconceito. A gente fica fingindo que todos são iguais.”
O racismo boleiro é uma irrupção do racismo maior, enraizado e dissimulado na sociedade brasileira. Nem poderia ser diferente quando se foi escravocrata, por assim dizer, até anteontem. O que poderia melhorar — e já houve progressos — é o grau de conscientização em torno do problema. Porque ele jamais desaparecerá, daqui ou da face da Terra. Haverá “racismo” onde quer que fenótipos diferentes convivam, o que apenas aumenta a necessidade de admiti-lo para que se possa reprimi-lo duramente.
Contudo, mesmo a surpresa com as manifestações de racismo no país cuja glória maior atende por Pelé se insere noutro conto da carochinha, ainda maior, de dimensões continentais. Os discursos dos governos, da publicidade e de grande parte da imprensa esportiva alimentam a ilusão de que o futebol vive num universo paralelo, autônomo em relação ao resto do país. Este pode ser violento, corrupto e racista, mas o futebol, ah, não, só ressalta virtudes que nos atribuímos: a alegria, a solidariedade, a criatividade.
(Isso subentende a ideia igualmente falsa de que italianos não são alegres, japoneses solidários ou alemães criativos, para ficarmos só nos contrassensos mais escandalosos. Seja como for, o marco zero do nacionalismo é assunto para outro dia.)
Violência física nas arquibancadas e nos gramados gera indignação igual ou maior do que as agressões verbais do racismo, seguida da repetição de promessas nunca cumpridas de punição rigorosa. Os criminosos de uma torcida organizada do Corinthians que mataram um adolescente boliviano no ano passado, por exemplo. O que foi feito deles ou de sua facção? Depois de chorarem de saudade das mamães e de empunharem a Bíblia diante das câmeras de TV, eles foram repatriados para logo em seguida se envolverem em briga com uma facção do Vasco e invadirem o centro de treinamento do Corinthians a fim de intimidar e agredir jogadores e funcionários. Eles são criminosos, mas não são “marginais”, isto é, não são pontos fora da curva. Estão inseridos no contexto de um país que é hiperviolento e onde se exalta a impunidade.
Detonadas pelos aumentos injustificados das tarifas de ônibus e engrossadas pela revolta contra os nebulosos gastos governamentais com a preparação para a Copa do Mundo, as manifestações de junho do ano passado foram, elas sim, algo ímpar. Nelas, o Brasil do dia a dia enfim se chocou contra o Brasil da fantasia. Num primeiro momento, o coordenador técnico da seleção, Carlos Alberto Parreira, repisou a lenga-lenga de que “futebol e política não se misturam”. Porém, em janeiro, inteligente que é, Parreira voltou atrás e criticou o Estado: “Copa é estádio, mas torcedor precisa de aeroporto, segurança, conforto, transporte.” Só faltou falar em educação para ecoar as ruas.
A suposta autonomia do futebol em relação à realidade se manifesta ainda na reafirmação — estatisticamente insustentável num país onde a corrupção é endêmica em todas as áreas — de que o futebol é um oásis de honestidade, ou seja, não há árbitros mal-intencionados, equipes fazendo corpo mole, portadores da “mala preta”, cartolas lavando dinheiro, resultados manipulados, estádios superfaturados. Nesse campo, mais uma vez, o futebol não é uma exceção às regras brasileiras e sim a confirmação delas, representante tanto do que temos de melhor quanto do que temos de pior.
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Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/o-futebol-do-pais-11872791#ixzz2x7AaIcVv 
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Te Contei,não ? - Faltam obras, falta água

TIAGO DANTAS 
O Eixão das Águas, em Fortaleza, cuustou R$ 1, 5 bilhão e levou 12 anos para ficar pronto Foto: Divulgação
O Eixão das Águas, em Fortaleza, cuustou R$ 1, 5 bilhão e levou 12 anos para ficar pronto Divulgação

Crônica do Dia - A verdade dói - Adriana Calcanhoto

A verdade dói

O país estava rachado, e os artistas estavam fazendo música, teatro e poesia brasileira com a alta qualidade que lhes é peculiar

Durante a ditadura os militares torturaram, física e psicologicamente, para desmoralizar suas vítimas. Sumiram com comunistas, com suspeitos de serem comunistas, montaram cenas falsas de suicídio para fotografar o cadáver que produziram. Ossadas amontoadas esperam até hoje suas identificações, e há documentos ainda secretos. Há documentos sobre a atual presidente, Dilma Rousseff, em um cofre. Sou a favor de que se libere tudo de uma vez, e logo. Primeiro porque o país tem o direito, e o dever, de conhecer sua história, por mais tenebrosos que sejam os capítulos. No mínimo para que nunca mais se repitam. Segundo, porque os documentos que estão liberados, revelando que os militares já monitoravam a vida dos cidadãos muito antes da internet e do Obama, estão literalmente mofando, carcomidos por fungos, em condições precárias no Arquivo Nacional, uma vergonha, considerando que a documentação foi considerada patrimônio da Humanidade, assim como os documentos do nazismo.
Torturaram garotas como a presidente Dilma, então com 19 anos, que foi cercada com armamento pesado, presa e torturada. Botaram estudantes, jornalistas, pelegos, socialistas e simpatizantes no pau-de-arara, para dar choques elétricos, cacetadas, telefones, socos e pontapés, entre outras barbaridades pelas quais foram anistiados.
A ficha da presidente ninguém pode ver, mas existem documentos de outro tipo que contam essa história de dentro dela, enquanto ela se dava, e contam-na até hoje, que são as canções, apesar da censura. Artistas tiveram suas canções decepadas por qualquer palavra que pudesse sugerir contrariedade com o regime, apesar de este não ser o único critério. A coisa era mais complexa. Ou mais simplória. Canções eram também censuradas por serem consideradas obscenas, por ofenderem a família, a ordem, os bons costumes ou a gramática. Ou seja, a censura agia no mesmo padrão da tortura, estupidamente, e por falta de cultura, por falso moralismo, por cinismo, por hipocrisia, censurava até o que não estava protestando. Geraldo Vandré disse sobre a canção que virou hino contra a ditadura, “Pra não dizer que não falei das flores”, mais conhecida como “Caminhando”: “Não fiz canção de protesto, eu fiz música brasileira.”
O país estava rachado, os militares de um lado e a esquerda, também rachada, de outro: engajados xenófobos contra alienados antenados. Os artistas estavam fazendo música, teatro e poesia brasileira com a alta qualidade que lhes é peculiar. Escrever uma canção é um ato político. Não escrever uma canção também é. Não há ato, aliás, que não seja político. O Brasil anda esquecido disso porque há tempos só faz politicagem, alianças pragmáticas em vez de programáticas e loteamento de cargos. Faz política para os políticos, foda-se a nação. Se não é assim, como explicar o estado do saneamento básico, da educação e da saúde em todo o território nacional?
Quando o Papa Francisco carrega ele mesmo sua pasta, está deliberadamente fazendo política, quando anda de ônibus ou abre a janela do carro para se deixar ser visto por seu rebanho, também. O próprio Vandré disse que passaria a compor só canções de amor. Uma canção não precisa ser de protesto para ser política, mas “Roda viva”, “Ponteio”, “Jorge Maravilha”, “Alegria, alegria,” “Samba de Orly”, “Tropicália”, “Miserere nobis”, “Cálice” e muitas, muitas outras, contam-nos essa passagem vergonhosa da História da Humanidade.
Não fosse a ditadura militar provavelmente não existiria o “Poema sujo”, escrito por Ferreira Gullar na escuridão do exílio, poema esse trazido para o Brasil gravado em fita rolo, escondido na mala diplomática do “vagabundo” poeta do Itamaraty, Vinicius de Moraes. É um lindo poema, mas uma família foi destroçada, um coração de pai foi esmigalhado em seu exílio.
Para sabermos a História (não para comemorá-la) precisamos enfrentar a verdade, por mais repugnante que seja. A indignidade com Rubens Paiva, na prisão, na tortura excessiva que provocou sua morte, na farsa armada no Alto da Boa Vista onde seu corpo foi enterrado e desenterrado depois, para ser enterrado nas areias da Praia do Recreio e então ser desenterrado novamente para que seus restos mortais fossem lançados ao mar, choca. O coronel responsável pelo desaparecimento, e que de nada se arrepende até hoje, explica: “Quando um companheiro morre, o guerrilheiro lamenta, mas acaba esquecendo. Não é como o desaparecimento, que gera uma expectativa eterna.” A esse tipo de conduta é que os milicos nomeavam “retidão de caráter”. É imprescindível que saibamos, mas estejamos preparados, a verdade vai doer bem mais do que choques elétricos na uretra.


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Te contei, não ? - Quando a Arte foi à luta

CRISTINA TARDÁGUILA (EMAIL)
MAURÍCIO MEIRELLES (EMAIL)
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50 anos do golpe Foto: Arte
50 anos do golpe Arte
RIO - Fernanda Montenegro foi ameaçada de morte pelo telefone. Do outro lado da linha, uma voz disse que ela levaria “um tiro certeiro na testa”. Dias mais tarde, uma bala estraçalhou a janela do quarto onde ela descansava. Na mesma época, José Celso Martinez Corrêa e seus companheiros do Teatro Oficina mandaram a bela italiana que trabalhava na bilheteria do grupo a Brasília para dormir com um censor e descolar a liberação da peça “O rei da vela”. Roberto Farias apresentava “Pra frente, Brasil” no Festival de Gramado quando soube que o filme havia sido censurado. Naquele dia, ele fazia 50 anos, mas a revolta se sobrepôs à alegria de ter levado o prêmio de melhor filme do festival. Tom Zé foi preso duas vezes e descobriu que, nas prisões políticas da ditadura militar, cada detento tinha que pagar 70 mil cruzeiros à polícia e dedurar um companheiro. Nas artes visuais, o regime não foi mais brando. Antonio Manuel fugiu de Salvador depois que a Bienal da Bahia foi fechada pelo Exército. Ele jamais recuperou o painel. Tempos depois, novamente foi proibido de exibir uma obra, numa exposição no Rio. “Foi como se me mutilassem”, diz.
Reunimos testemunhos desses e de outros artistas que tiveram suas vidas viradas do avesso pelo regime militar — cujo início completa cinco décadas no dia 31 —, além das visões dos colunistas Caetano Veloso e Adriana Calcanhotto. Os relatos deixam evidente também que, em contrapartida àqueles 21 anos sob ditadura, viveu-se um dos períodos mais férteis da produção cultural do país. Consolidaram-se, naquela época, nomes que seguem como referência nas artes nacionais.

Para pesquisadores da área, as duas décadas de ditadura podem ser divididas em três períodos distintos. O primeiro, entre 1964 e 1967. O segundo, de 1968 à Anistia, em 1979. E o terceiro nos anos 1980, na redemocratização do país. Os três reverberam até hoje na produção brasileira.A combinação de diferentes elementos contribuiu para tal fertilidade, dizem especialistas. A existência de um inimigo comum somou-se à expansão da TV e da indústria cultural no país, dando origem a um ambiente em que a criatividade ganhou fôlego para combater o moralismo hostil das fardas. Foi o tempo da linguagem cifrada, das críticas nas entrelinhas e da ironia dos cartuns.

— Na primeira fase, vemos um deslocamento da cultura da elite para a classe média — afirma Mônica Almeida Kornis, doutora em Ciências das Comunicações da Fundação Getulio Vargas. — Até 1968, do ponto de vista formal e artístico, havia uma busca por uma linguagem inovadora. Naquele ano, “O bandido da luz vermelha” (de Rogério Sganzerla) trouxe a frase que define bem o momento posterior: “Quando a gente não pode nada, a gente avacalha”. A censura era fortíssima. Mas a TV se nacionalizou, a indústria cultural explodiu, e a música se expandiu com força nos festivais. Nos anos 1980, houve a diversificação dos produtos, e a ideia de inimigo comum se perdeu um pouco.

— Era, no fundo, uma briga que começou na Grécia e, ao longo da História, foi para lá e para cá — explica Heloisa Buarque de Hollanda, pós-doutora em Sociologia da Cultura pela Universidade Columbia e coordenadora do Programa Avançado de Cultura Contemporânea (PACC/UFRJ). — Um personagem forte foi Glauber Rocha. Ele repetia: “Não vou falar, a minha estética é que tem que falar”.Na ditadura, o conflito entre a função política da arte e seu valor estético borbulhava. Alguns a defendiam como instrumento de luta, outros priorizavam o estudo da forma.

Em segundo plano
No extremo oposto estavam os membros dos Centros Populares de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE), que sonhavam criar uma “arte popular revolucionária”. Eles encenavam peças em portas de fábricas e sindicatos para conquistar trabalhadores para a luta política. Desmantelado em 1964, o grupo teve como último presidente o poeta Ferreira Gullar. Hoje, ele considera “ultrapassados” aqueles ideais:
— A preocupação em fazer a revolução era de tal ordem que a arte ficava em segundo plano. Aos poucos, fui mudando minha poesia. No começo era mais política do que poética. Vi que não era por aí. O que a gente estava fazendo era comício — diz ele. — Mas uma geração de artistas foi influenciada pelo CPC. O Chico (Buarque), por exemplo.
Entre 1960 e 1980, o Brasil viveu o boom da indústria cultural. Aparelhos de TV popularizaram-se entre a classe média e ajudaram a consolidar a “integração nacional”. A música foi beneficiada disso, sobretudo com os festivais da canção.
— Naquele momento, os setores mais dinâmicos eram protagonizados por uma classe média de oposição. Não necessariamente de esquerda ou revolucionária. Os quadros intelectuais dessa indústria eram recrutados entre universitários. Essa é uma contradição rica e interessante do período — aponta Marcos Napolitano, doutor em História Social pela Universidade de São Paulo.
Passados 50 anos, uma das principais consequências do golpe, na opinião de especialistas, foi a escassez dos espaços de debate na cultura, como eram o Cine Paissandu e a cantina do MAM.
— Antes do golpe, as pessoas se reuniam para falar de cultura e política. Esses lugares não eram apenas guetos. Havia gente de todo tipo. Eram espaços de cruzamentos e não só de contemplação. Isso acabou junto com a repressão — diz Mônica.
Para os especialistas, no entanto, diferentemente do que ocorre na Argentina e no Chile, a arte brasileira ainda não se apropriou daquele momento. O golpe segue um tema em aberto.



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