sábado, 23 de maio de 2015

Te Contei, não ? - De meninos soldados a capoeiristas da paz no Congo

Carioca Flávio Saudade usa a capoeira para ressocializar crianças traumatizadas pela sangrenta guerra do país africano

ATHOS MOURA



Rio - Usar a capoeira para transformar crianças traumatizadas pela guerra em cidadãos confiantes é o sonho do carioca Flávio Saudade. Ele trabalha no Congo, país castigado por sangrentos conflitos civis, onde meninos são capturados para atuar nos campos de batalha. A missão de Flávio é ajudar os poucos garotos que conseguem escapar dessa tragédia. Ele usa a atividade como remédio de reintegração social. 

“Posso dizer que a capoeira é uma coisa mágica, que enfeitiça a criança", diz o capoerista brasileiro.

Batizado de Capoeira Pela Paz, o projeto nasceu na Embaixada do Brasil no Congo e foi pelo idealizado pelo embaixador brasileiro no Congo, Paulo Uchôa. Praticante do esporte, o diplomata conseguiu recursos com a princesa Carolina, de Mônaco, que queria financiar projetos no país. “A capoeira tem a capacidade de promover valores que, em uma situação de tensão como a do Congo, são importantes para as crianças”, explica o diplomata.

O projeto ganhou apoio da Unicef. Com a estimativa de durar até agosto de 2016, Uchôa negocia para que ele dure mais anos. Desde agosto de 2014, através do esporte 750 jovens foram ressocializados. Há estimativas não oficiais de que cerca de 4 mil crianças estejam na situação de soldado. Os que tem sorte fogem ou são resgatados por tropas da ONU.

Julien tem 16 anos e é atendido pelo projeto. Em entrevista ao DIA , contou que vivia na cidade de Walikale. Em março de 2014, a sua escola foi invadida por homens armados e junto com 30 crianças foi sequestrado. Durante um ano foi soldado e aprendeu coisas que nunca quis. Em abril de 2015, ele conseguiu escapar. “A capoeira permite que antigos inimigos vivam em paz. Ela está curando os nossos traumas", contou. “A capoeira me ajudou a mudar. Ela promove a paz. Fui ensinado a pensar apenas em matar”. 

Pelo direito de ser criança 

No Congo, as crianças são retiradas de casa a força, e muitas vezes assistem os pais serem mortos e suas tribos serem queimadas. Os meninos se tornam soldados e as meninas escravas sexuais. Curá-los e reintegrá-los são desafios.

Para tocar a parte prática do projeto, o embaixador Paulo Uchôa convidou o capoeirista Flávio Saudade para prestar consultoria técnica. O esportista já havia usado a capoeira como remédio contra a guerra no Haiti, outro país sacrificado por anos de miséria e guerra civil.

Flávio chegou ao Haiti em 2008, graças a o apoio da ONG Viva Rio.Natural de São Gonçalo, Saudade, de 38 anos, diz que o esporte pode ser transformador por trazer a essência da infância de volta para as crianças. “A capoeira garante a esses meninos o direito de brincar, de ser criança”.

O Viva Rio atua no Haiti desde 2004, e este ano lançou o portal Haiti Aqui, para ajudar os imigrantes haitianos que vivem no Brasil. Segundo a ONG, desde o terremoto que aconteceu em 2010, o número de cidadãos do Haiti que vem tentar a sorte no Brasil aumentou de quatro mil para 50 mil. O site fornece informações detalhadas para a obtenção de documentos como identidade, CPF e carteira de trabalho.

Jornal O Dia


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