segunda-feira, 20 de julho de 2015

Te Contei, não ? - Maria Bethânia exposta


RIO — Talvez sejam os 50 anos de carreira mais fartamente celebrados da história da música popular brasileira. O que Maria Bethânia ainda não sabe é que, depois de estrear a turnê “Abraçar e agradecer”, ser homenageada pelo Prêmio da Música Brasileira e ter seu nome anunciado como enredo da Mangueira no próximo Carnaval, ainda há muito mais. Começa nesta quinta para convidados (e sexta para o público) uma imensa exposição sobre seu imaginário, reunindo trabalhos inéditos de 160 artistas plásticos, músicos, escritores, fotógrafos, amigos e fãs, além de itens de acervo pessoal da família Teles Velloso. O material vai ocupar quase todo o espaço do Paço Imperial, no Centro do Rio, até 13 de setembro, com entrada gratuita, e uma programação paralela que inclui filmes e saraus, sempre aos domingos, às 16h, com apresentações de nomes como Egberto Gismonti, Moreno Veloso, Pedro Sá e Jorge Mautner.


Intitulada “Maria de todos nós”, a exibição é uma surpresa, conduzida discretamente há cerca de dois anos por Bia Lessa, que assina a direção, e Ana Basbaum, amiga e produtora executiva de Bethânia há anos, que idealizou tudo. A cantora só vai conhecer a mostra hoje à noite.

— Acho que ela vai pirar quando vir o próprio camarim, logo na entrada — tenta adivinhar a diretora Bia Lessa, sobre uma das instalações mais impactantes, justamente a que abre a mostra: uma estrutura portátil de ferro e cortinas que a cantora carrega em todos os shows, jamais vista pelo público. — É o camarim que ela usa, há anos. Reproduzimos o interior de maneira exatamente igual: o espelho no mesmo lugar, o frasco de Rinosoro na mesinha, as flores, o banquinho onde a irmã, Nicinha (que morreu em 2011) sempre ficava sentada. Ao lado, um vídeo com imagens de Bethânia rezando dentro do camarim. É muito emocionante, o ponto de partida da exposição.

ENTALHES FEITOS PELA ARTISTA

Em todo o percurso, a proposta foi fugir do formato tradicional, linear, recheado de memorabilia.

— Quisemos usar as emoções que a Bethânia provoca nas pessoas e os elementos do seu imaginário. Não houve curadoria, os trabalhos foram agregados muito espontaneamente, os amigos foram se juntando, oferecendo, e tudo sem que ela soubesse — conta Bia.

Há obras inéditas, feitas para a exibição, como uma poltrona que lembra a casa de um joão-de-barro, dos Irmãos Campana; 50 pinturas de carcarás diferentes, de Roberto Tavares; ou a tela de Fani Bracher, em que a artista bordou frases como “Bethânia era artista para tudo, até para saci-pererê” (muito falada por Dona Canô). Há presentes que artistas plásticos já tinham dado a ela, como uma tela de Carlos Bracher e uma onça talhada de José Alcântara. E um sem-número de peças que dialogam com o universo de referências de Bethânia, como os orixás em ferro de Tatti Moreno e o trabalho delicado da artista da Feira de São Cristóvão Vitória Vieira, que constrói pequenos cenários dentro de malas de retirantes.

Entre os objetos pessoais, o espectador verá, pela primeira vez, os entalhes em madeira feitos pela própria Bethânia; os cadernos com suas anotações sobre shows e poesias; e as imagens feitas por Maria Sampaio, fotógrafa oficial da família Teles Velloso, com Bethânia preparando oferendas, lendo, além de uma imagem rara de Dona Canô de cabelos soltos.

22 MIL SAQUINHOS D’ÁGUA

As 1.402 peças da mostra, já apelidada pelas organizadoras de “Ocupação Bethânia”, estão organizadas de acordo com temas da artista, como a religiosidade, os elementos da natureza, a poesia, a arte popular ou Santo Amaro. São 13 ambientes distintos, cada um explorando uma nuance desse universo poético, desde o camarim, batizado por Bia Lessa de “ponto zero”. No primeiro ambiente, todo revestido de feno, o que lhe dá um cheiro forte de natureza, estão textos que poetas e músicos já escreveram para ela, como Ferreira Gullar, Nélida Piñon e Zélia Duncan. Obras do acervo do Museu do Inconsciente completam o espaço — 16 telas de internos do Instituto Municipal Nise da Silveira feitas num evento semanal criado por eles intitulado “Sextas bethânicas”.

— O trabalho da Nise da Silveira tem uma relação muito forte com o universo da Bethânia desde o cenário do show “Rosa dos ventos”, de 1971, com projeções de obras de arte feitas por internos — lembra Ana Basbaum, antes de percorrer os outros 12 espaços.

No fim da exibição, uma sala com o teto coberto por 22 mil saquinhos d’água, elemento fundamental na obra da artista, e que perpassa toda a mostra. Enchê-los foi a empreitada mais difícil — em ano de crise, salientam Ana e Bia, tiveram de cortar todos os custos para que o patrocinador bancasse a mostra sem apoio estatal. E veio a ideia: convocar fã-clubes da artista para, madrugada adentro, ajudar. Feito. Sob a instalação, que evoca um mar portátil, estão ainda 100 casinhas de madeira do artista carioca Getúlio, que recriam uma Santo Amaro possível em meio à Praça XV.

— É lindo que seja aqui, no centro do Rio. Haverá tapetes com poesias espalhadas pelo Paço Imperial. Um jeito de integrar os passantes da cidade que Bethânia escolheu para morar — diz Bia.

SERVIÇO

“Maria de todos nós”

Onde: Paço Imperial — Praça XV 48, Centro (2533-4359)

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Quando: De ter. a dom. das 12h às 18h (de amanhã a 13/9).

Quanto: Grátis.

Classificação: Livre.



Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/montada-em-segredo-exposicao-sobre-bethania-invade-paco-imperial-com-1402-obras-16626749#ixzz3gRUImX7V

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