sábado, 24 de setembro de 2011

Te contei, não ???!!!! - Nota insuficiente para o Enem


A divulgação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), na semana passada, causou rebuliço entre educadores, pais e alunos. O ranking das escolas mostrou o Colégio São Bento (do Rio de Janeiro) em primeiro lugar, pela quinta vez, seguido pelo Instituto Dom Barreto (de Teresina, no Piauí) e pelo Colégio Vértice (de São Paulo). Como acontece todo ano, pais e alunos correram para descobrir como anda a qualidade de sua escola. As particulares bem classificadas comemoraram (e aproveitaram para justificar suas caras mensalidades). As não tão bem colocadas fizeram promessas. A maioria, tanto públicas quanto privadas, ainda está devendo. O Enem revelou que a educação brasileira está de recuperação. A média nacional dos alunos ficou em 511 pontos. A meta do governo é alcançar até o ano 2028 os 600 pontos, equivalentes à média dos países desenvolvidos em 2003 no exame internacional (o Pisa).
Assim como as escolas que ele avalia, o Enem ainda tem um desempenho insuficiente. Ele foi criado pelo Ministério da Educação (MEC) em 1998 com a única ambição de avaliar o desempenho dos alunos que concluíram o ensino médio e, assim, medir o esforço dos governos federal, estaduais e municipais para alcançar uma qualidade mínima. De lá para cá, o exame ganhou uma sobrecarga de tarefas. Foi adaptado, em 2009, para funcionar como um vestibular único no país inteiro. Também vem sendo usado para ranquear as escolas e comparar o desempenho de cada uma. Não cumpre satisfatoriamente nenhuma dessas missões. Como melhorá-lo?

1. Avaliação do ensino

Provas como o Enem e o Sistema de Avaliação do Ensino Básico (Saeb) existem para verificar se os alunos aprendem conteúdos e habilidades obrigatórias. O exame é fundamental para avaliar direito a última etapa do ensino básico. São 8 milhões de jovens que entram no ensino médio todo ano. Cerca de 90% deles saem sem aprender o que deveriam. A partir dos resultados, um diretor de rede pública pode definir com mais clareza onde vai investir seu orçamento. As avaliações, adotadas há cerca de uma década, são consideradas um dos maiores avanços na educação do país. Mas como avaliar sem distorções um sistema de ensino do tamanho do brasileiro e tão desigual? "O Enem falha na hora de levar em conta as diferenças regionais e socioeconômicas das escolas", afirma Francisco Soares, da Universidade Federal de Minas Gerais. No ano passado, participaram voluntariamente do Enem 3,2 milhões de alunos e 26 mil escolas. A média nacional ficou 10 acima do ano anterior. Segundo alguns especialistas, no entanto, essa média pode estar artificialmente alta, já que as melhores escolas têm uma proporção maior de alunos que participam do Enem. Nas piores escolas, os alunos mais fracos tendem a ficar fora da prova e ficam sub-representados no resultado nacional (leia o gráfico abaixo). Países que examinam o ensino médio, como Coreia do Sul e Estados Unidos, contornaram as distorções instituindo uma prova obrigatória e usando outros critérios para qualificar o aprendizado. Há avaliações de quadros de professores, condições socioeconômicas dos alunos e das escolas e até da opinião dos pais.

2. Vestibular unificado

Substituir todos os vestibulares do país por uma única prova talvez seja a missão mais ousada do Enem. Exames do tipo existem em outros países, como Estados Unidos, França e Alemanha. A passagem para a universidade é crítica para qualquer país que se pretende desenvolvido, e o Brasil possui apenas 3% de todos os seus estudantes no ensino superior. Com uma única nota, um aluno pode tentar entrar em várias universidades, sem a maratona massacrante de vestibulares. Isso facilita o acesso a universidades distantes. E mantém a seleção dos melhores alunos. Em dois anos, o Enem ganhou a adesão de todas as universidades federais e de dezenas de outras públicas e particulares, que decidem como usam a nota do Enem em seus processos seletivos. Mas duas exceções desvalorizam o Enem. A Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade de Campinas (Unicamp), as maiores e melhores universidades do país, estão fora. Elas dizem não conseguir usar as notas do Enem por incompatibilidade das datas de provas e divulgação dos resultados. Isso tem uma consequência direta na taxa de participação dos alunos no exame nacional. Desestimula alunos paulistas a fazer o Enem, o que afeta o desempenho das escolas do Estado.

Além disso, a logística de aplicação das provas, em apenas dois dias, em todo o país, é complicada e vulnerável. Em 2009, algumas questões vazaram antes da prova. Em 2010, escaparam dados pessoais de 12 milhões de alunos. Aplicar a prova mais de uma vez por ano, com menos alunos por vez, poderia ajudar, além de facilitar o uso das notas pela USP e pela Unicamp. "O Enem caminha para ser a primeira fase desses vestibulares", diz Maurício Kleinke, coordenador no vestibular da Unicamp. O governo planeja aplicar a prova duas vezes por ano.

3. Ranking de escolas

Quando divulgou as notas individuais das escolas, em 2006, o MEC acabou, sem ter esse objetivo, criando o ranking de melhores escolas. Atendeu a uma demanda histórica de pais e alunos, que nunca tiveram uma comparação objetiva entre as escolas. Mas gerou horror na maioria dos educadores, que afirmam que, para classificar uma escola como boa ou ruim, é preciso levar em conta inúmeros outros critérios, além de uma avaliação padronizada. Mesmo os pais não estão satisfeitos. "É impossível avaliar a escola ideal para meus filhos levando em conta apenas uma nota", diz a paulistana Andrea Barbosa, mãe de Matheus, de 17 anos, aluno do 3o ano do ensino médio e candidato a uma vaga na engenharia civil da USP. "Ainda mais com todo o marketing que as escolas fazem usando o Enem."

Para melhorar, a divulgação do ranking vem sendo aperfeiçoada para evitar comparações grotescas. Neste ano, o MEC dividiu a lista por níveis de participação de alunos de cada escola na prova. A taxa de participação é um dos fatores que mais distorcem as notas. O colégio onde Matheus estuda, o Augusto Laranja, é um exemplo. No ranking de São Paulo, ele ficou em 88o lugar na lista geral, sem divisões. Já entre as escolas que tiveram a mesma taxa de participação, ele sobe para 22o. Se o exame ficar obrigatório, essa distorção diminui. Ainda assim, não dá para esquecer que a nota do Enem mostra apenas uma parte do que uma escola tem a obrigação de oferecer aos alunos.

O MEC diz que está decidido a manter o exame, "mesmo com todos os entraves a ser superados", e que está confiante de que "o Enem auxilia a organização racional do currículo escolar e orienta o trabalho dos professores". Vale lembrar que o modelo mais famoso de vestibular nacional, o americano SAT, que existe desde 1926, levou duas décadas para ser elaborado e é administrado por uma fundação independente subsidiada pelas universidades públicas e privadas.

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