sábado, 21 de fevereiro de 2015

Te Contei, não ? - O "ecohato" que previu a seca

Há anos, biólogo Mário Moscatelli alerta para o risco de uma crise no abastecimento de água


FRANCISCO ALVES FILHO


Rio - A insistência com que o biólogo Mário Moscatelli há 25 anos defende os manguezais, os rios e as lagoas fluminenses lhe rendeu algo mais que elogios. Para quem pouco se importa com as agressões à natureza, ele é o principal ‘ecochato’ do Rio. Moscatelli nem liga. “Os conservadores criticam qualquer um que defenda os seus direitos”, rebate o biólogo.


Se o ‘chato’ tivesse sido ouvido tempos atrás, talvez a tal crise hídrica não chegasse. Há 18 anos, quando começou a sobrevoar a bacia hidrográfica do estado, ele previu: “Se continuar assim, o abastecimento vai sofrer colapso.” Os governantes não ouviram. Deu no que deu.

Nessas duas décadas e meia, Moscatelli, 50 anos, gastou muito tempo se embrenhando em manguezais e sobrevoando os rios. Faz isso cotidianamente e com o coração apertado. “Desde o primeiro voo percebi que a situação era grave. As margens dos rios foram desmatadas, os leitos são depósitos de lixo e esgoto. Ao longo do tempo, apesar de todos os alertas, a situação se agravou bastante. Assistir, de um posto privilegiado, essa escalada da degradação é triste”, diz o biólogo.

Os problemas de abastecimento de água pelo qual o Rio passa hoje eram facilmente previsíveis, e avisos não faltaram. Durante a década de 1990, cientistas anunciaram que estava por vir uma época de extremos climáticos. “Para enfrentar as longas estiagens, a solução óbvia seria usar a água dos rios. Mas muitos deles já estão mortos e outros agonizando”, alerta Moscatelli.

À grande lista de “rios podres” ele agora acrescenta mais dois: o Guaxindiba, em São Gonçalo, e o Estrela. Isso aconteceu apesar dos seguidos informes do biólogo aos vários governantes municipais, estaduais e federais, de várias denúncias ao Ministério Público e múltiplas entrevistas à imprensa.

A boa notícia é que há tecnologia disponível para reverter o estrago feito nos rios, nas lagoas e no mar. O que falta, segundo ele, é um ingrediente há muito tempo escasso entre as autoridades com poder de decisão. “Tecnologia e dinheiro tem de sobra, mas não há vontade política”, diz Moscatelli.

O problema é que não há mais tempo a perder, já que chegamos à escassez bem antes do previsto. Os estudiosos imaginavam que seca como a atual aconteceria somente em 2050. 
Apesar da inércia do Poder Público, o biólogo acha que a insatisfação popular pode obrigar os governantes a, enfim, fazer o que deveriam ter feito há anos. A crise pode apressar essa mobilização. “Quando quer, o povo brasileiro se organiza, basta ver os desfiles de Carnaval. Falta direcionar essa energia na defesa do ambiente”, diz Moscatelli.

O secretário dialoga com o ativista

O secretário estadual do Ambiente, André Corrêa, conhece Mário Moscatelli há tempos. Tanto que o nomeou assessor em sua passagem anterior pela pasta, em 2.000. 
O biólogo deixou o cargo quando denunciou à Polícia Federal a diretoria da Cedae. “Meu amigo Moscatelli tem mais perfil para atiradeira do que vidraça, e eu sou mais vidraça. Mas a gente se entende”, brinca Corrêa.

O secretário reconhece a importância do trabalho do biólogo. “Moscatelli é a consciência crítica ambiental do Rio. Ele nos empurra para frente”. Apesar da amizade, o ativista não poupa o governo estadual.

Um dos motivos de crítica é o subaproveitamento da Estação de São Gonçalo. O secretário reconhece que o problema ilustra a concepção equivocada na primeira fase do Plano de Despoluição da Baía de Guanabara.

“Aconteceram licitações separadas para estações e troncos. Com isso, tivemos estações prontas, e o esgoto não chegava. Só no governo Cabral a estação passou a receber o esgoto”, explica o secretário.

Sobre a crítica à ineficiência do PDBG, orçado em US$ 1,8 bilhão, o secretário avalia que a verba é insuficiente. “Os planos que executamos indicam que, para universalizar o saneamento básico na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, são necessários 12 bilhões de reais”, avalia.

Este seria também o motivo da inoperância do Programa de Saneamento Ambiental dos Municípios.

Do abraço à Lagoa ao fanatismo por ‘Guerra nas estrelas’

Foi no ano de 2002 que Mário Moscatelli ganhou a fama de “ecochato”. Em protesto contra a mortandade de 400 toneladas de peixes da Lagoa Rodrigo de Freitas, por causa da poluição, o biólogo e outras personalidades, como Fernando Gabeira, organizaram um protesto. Resolveram convocar um “abraço à Lagoa”.

A mobilização entrou para o folclore da cidade, mas Moscatelli lembra: nada menos que 30 mil pessoas foram à Lagoa para protestar. Graças a isso, a Cedae se viu obrigada pelo Ministério Público a fazer um acordo para trocar canos e recuperar as elevatórias. Desde então, as mortandades de peixes ali se tornaram episódicas.

A trajetória de ativista ambiental começou em Angra dos Reis, quando trabalhou na secretaria municipal de Ambiente e resolveu cumprir a lei que proíbe ocupações irregulares. Ao tratar do problema, para conter o desmatamento no município, acabou esbarrando em interesses imobiliários. Passou a ser ameaçado e teve que sair do país. Quando voltou, passou a atuar no Rio.

Há 18 anos, Moscatelli mantém o projeto Olho Verde, no qual sobrevoa mensalmente de helicóptero os rios, as lagoas e o litoral do estado. Várias vezes por semana, ele visita áreas afetadas pela poluição e planta vegetação de manguezal.

As fotos e vídeos que resultam desse trabalho ilustram denúncias que acabam encaminhadas para jornais e TVs, Ministério Público e para as próprias autoridades. 
Moscatelli gasta nessa tarefa nove horas diárias. Se preocupa em não deixar de dar atenção à mulher e às duas filhas. “Minhas prioridades são: a família, a natureza e ‘Guerra nas Estrelas’”, diz.

A saga filmada pelo diretor americano George Lucas já foi vista pelo biólogo à exaustão. “Pelo menos umas 50 vezes”, admite ele. Sua mulher já sabe: colocar na TV o DVD com as peripécias de Luke Skywalker é a melhor forma de acalmar Moscatelli depois de um dia lutando pela natureza.

Um comentário:

  1. Eu concordo com o autor,a gente deve valorizar mais a nossa água preciosa é convencer os governantes e pessoas que não economizam a economizar,a gente também deve cuidar bem das árvores porque as árvores ajudam na chuva,a algums jeitos de fazer com que o mundo não fique seco,tipo,não desperdiçar a água em assuntos desnecessárias e dar pausas em banho para colocar o shampoo,o condicionador e o sabonete.Nunca bote a culpa em Deus e nem em São Pedro,eles ajudaram nossa vida,na nossa sobrevivência,e vocês ainda colocam culpa no São Pedro por não chover,a culpa é nossa,a gente causou todo esse disastre e caos,calor está bem mais forte do que mil anos atrás,nós,os humanos somos os verdadeiros monstros.

    Spyros Claudio Anapniotis
    702
    06/03/15

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