Romanos e gregos brincavam de rodar pião na antiguidade; chineses e japoneses adoravam a brincadeira
Rio - Outro dia bati um papo com um garoto de nove anos, filho de um amigo,
com fama de gênio da computação. O menino, ao mesmo tempo, conversava, ouvia
música em um fone de ouvido e batia recorde em um jogo eletrônico. Intrigado com
a performance, perguntei se ele sabia rodar pião de madeira. O moleque balançou
a espantosa cabeleira à Buffalo Bill, deu um muxoxo e me olhou como se eu fosse
um dinossauro. É claro que ele sequer concebia colocar um piãozinho em
rotação.
Tentei explicar ao garoto que rodar pião é coisa antiga. Arqueólogos
encontraram, às margens do rio Eufrates, na Ásia, piões de argila datados de
aproximadamente 4.000 anos antes de Cristo. Romanos e gregos brincavam de rodar
pião na antiguidade; chineses e japoneses adoravam a brincadeira e foram os
introdutores dela nas bandas do Ocidente. Os portugueses introduziram o jogo
entre nós, desde os tempos das caravelas.
Outra invenção velha pra dedéu, a pipa (os chineses empinaram os primeiros
papagaios há 3.000 anos), anda mal das pernas entre a meninada, sobretudo aquela
de classe média, criada entre paredes de apartamentos que mais parecem
esconderijos da Segunda Guerra Mundial. Mande um garoto viciado em computador
debicar uma pandorga com linha 10 de algodão e ele vai achar que você é mais
antigo que múmia de faraó.
Até o jogo de botão sofre com isso. Quando eu era moleque, fazia-se botão de
tudo quanto é objeto: osso, tampa de relógio, plástico, galalite, vidrilha, coco
e outros babados. Tive um amigo que surrupiou os botões do paletó do avô em
pleno velório, ao perceber que o velho seria enterrado com botões excelentes
para virar atacantes pequenos e habilidosos.
O botão perdeu prestígio. A onda agora são os jogos eletrônicos que
reproduzem partidas de futebol. Os garotos fazem tabelinha virtual em terceira
dimensão. Seduzidos pela parafernália desses trecos, abandonam as coisas mais
simples, que exigem mais talento e têm maior poder de sociabilização.
Incluo
neste time das brincadeiras mais sumidas que o pássaro Dodô o pique-bandeira, o
passa anel, a carniça, o lenço atrás, a cabra-cega, o garrafão, a bola de gude,
o telefone feito com lata de leite condensado, o passaraio e muitas mais.
Só me resta constatar que a minha concepção de infância já foi para a roça e
perdeu a carroça. Em breve inventarão um aplicativo para se rodar pião pelo
celular. Já é mais fácil, afinal, achar um pinguim no verão de Bangu que um
adolescente que tenha dado o primeiro beijo em uma brincadeira de pera, uva,
maçã ou salada mista.
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