Somos todos macacos
Num primeiro momento, não tive muita certeza se tinha gostado ou não da campanha lançada por Neymar e que tomou conta da internet no último domingo. “Somos todos macacos” foi a resposta do jogador mais famoso do Brasil às atitudes racistas que ele mesmo e muitos outros atletas têm sofrido em estádios pelo mundo afora. A campanha de agora foi motivada pela banana atirada em Daniel Alves quando ele se preparava para bater um escanteio no jogo entre Villareal e Barcelona.
Comecei a desconfiar da campanha logo que a foto de Neymar, segurando uma banana descascada, ao lado de seu filho, Davi Lucca, segurando um bananão de pelúcia, chegou ao meu computador. Foi tudo rápido demais, a foto era bonita demais, espontaneidade zero. Parecia coisa de agência de publicidade. E era. Neymar e a agência aguardavam apenas o momento oportuno de lançar a campanha. O inesperado comportamento de Daniel Alves comendo a banana que lhe foi jogada acionou Neymar & Cia.
A atitude de Daniel Alves é a novidade dessa história. Jogadores agredidos por atos de racismo costumam ter dois tipos de comportamento. O primeiro é uma fingida indiferença seguida de um desabafo choroso. O segundo é o revide agressivo. Daniel Alves inaugurou um terceiro tipo: o bom humor. Diante da banana jogada, ele pegou a fruta, descascou e comeu. O comportamento de Daniel Alves ganha mais força quando se percebe, pelas declarações que deu após o jogo, que ele não tinha intenção de iniciar movimento algum. Só queria rir dos racistas. “Tem que ser assim. Não vamos mudar”, disse ele, sem esperança de qualquer transformação nas frequentes atitudes preconceituosas por parte do público do futebol. “ Há 11 anos convivo com a mesma coisa na Espanha. Temos que rir desses retardados.”
Impliquei mais um pouquinho com a campanha do Neymar quando vi que até a presidente Dilma aproveitou para tirar uma casquinha (alguém ainda sabe o que significa tirar uma casquinha?). É ótimo que Dilma exponha seu pensamento antirracista. O problema é o estilo. O primeiro tuite de Dilma sobre o assunto é claro: “Neymar lançou a campanha Somos Todos Macacos para mostrar que temos todos a mesma origem”. É mesmo, Pedro Bó? Se a Dilma não nos explicasse, como iríamos aderir? A presidente já havia pisado na bola em tuite anterior: “Diante de uma atitude que infelizmente tem se tornado comum nos estádios, Daniel Alves teve atitude.” Deixa eu ver se entendi: Daniel Alves teve atitude diante de uma atitude? Ah... o estilo da Dilma é sempre surpreendente.
Só perdi toda a minha resistência à campanha do Neymar quando vi ontem a primeira página aqui do GLOBO. Todas aquelas fotos das celebridades que aderiram à campanha antirracista expondo-se de forma, às vezes, ridícula ao lado de uma banana diziam que o assunto é mais sério do que uma simples pose gaiata na internet pode indicar. A sugestão levemente erótica da banana de Luciano Huck e Angélica, a banana nanica de Luan Santana, a banana explícita de Fred... são muitas os tipos de banana e muitas as formas de preconceito. Qualquer manifestação que diminua o impacto de atitudes racistas deve ser incentivada. Conte comigo, Neymar. Somos todos macacos.
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Para quem quiser acompanhar a polêmica da banana com boa música, não faltam exemplos no cancioneiro popular brasileiro. Se bem que a primeira vez em que ouvi banana numa canção foi na voz de Harry Belafonte. Lá por 1956 ou 1957 _ eu sei que faz tempo, mas eu era praticamente um bebê _, era só ligar o rádio que, fatalmente, estava tocando “Banana boat song”, o que a gente considerava um calipso. Na verdade, a música é jamaicana e parece que é ou era cantada pelos colhedores de bananas locais. Mas estava no disco de calipso do Belafonte, então... “Come, Mister Tally Man, tally me banana”, cantava o Belafonte, e a gente repetia em forma de paródia: “Eu não sou macaco, mas eu gosto de banana”. Só depois eu descobri que a banana era praticamente uma obsessão de Braguinha que a cantou em grandes sucessos, como “Yes, nós temos banana” (“banana, menina, tem vitamina”) e “Chiquita Bacana” (aquela que se vestia “com uma casca de banana nanica”), e em canções mais obscuras, como “Sem banana macaco se arranja”. Como as outras, essa é uma parceria com Alberto Ribeiro feita para o filme “Banana da terra”, de 1939. Foi cantada por Carlos Galhardo, mas totalmente eclipsada por uma canção de Dorival Caymmi lançada no mesmo filme, “O que é que a baiana tem?”, na voz de Carmen Miranda.
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Enquanto isso, Lula diz que o julgamento do mensalão foi 80% político. Tudo bem, Lula. Mas os 20% restantes de julgamento jurídico são suficientes para deixar todo mundo na cadeia por um bom tempo
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