Massacre, ocorrido em 23 de julho de 1993, resultou na morte de 8 crianças e adolescentes moradores de rua. Quatro PMs chegaram a ser presos, mas cumpriram apenas parte da pena
23/07/2013
Vivian Virissimo,
do Rio de Janeiro (RJ)
Nesta terça-feira (22), o massacre que marcou as escadarias da Igreja da Candelária, no Rio de Janeiro (RJ), com o assassinato de 8 crianças e adolescentes moradores de rua, completa duas décadas. As mortes ocorreram durante uma ação policial, no dia 23 de julho de 1993, quando cerca de 70 crianças e adolescentes que dormiam nas proximidades do templo foram alvejadas por policiais civis e militares. Quatro PMs chegaram a ser presos, mas cumpriram apenas parte da pena.
Para lembrar o episódio, na sexta-feira (19), centenas de pessoas participaram de uma missa na igreja e fizeram uma passeata pela avenida Rio Branco até a Cinelândia. “Esquecer é uma forma de permitir que aconteça novamente. Lembrar é reagir”, disse Patrícia de Oliveira, irmã de Wagner dos Santos, um dos sobreviventes da chacina.
“A polícia age assim porque muitos deles sabem que poderão cometer crimes e não serão punidos”, conclui Patrícia, que também faz parte da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência. Até maio deste ano, por exemplo, foram registrados 101 homicídios decorrentes de intervenção policial no Rio de Janeiro, segundo dados do Instituto de Segurança Pública do estado.
Confira abaixo entrevista concedida ao Brasil de Fato por Patrícia de Oliveira, integrante da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência:
Brasil de Fato - O seu irmão Wagner dos Santos é um dos sobreviventes da Chacina da Candelária. O depoimento dele ajudou a indiciar os policiais que sofreram processo. Como é a vida dele?
Patrícia de Oliveira – Ele foi a pessoa que possibilitou a criação do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas (Provita). Na época, não existia nada que pudesse proteger testemunhas. Essa proteção ocorreu depois de atentado sofrido na Central do Brasil. Ele levou 4 tiros na Candelária e 4 depois na Central do Brasil. Agora ele mora fora do Brasil há 19 anos, tem vários problemas de saúde em decorrência desses tiros. A vida dele é bem complicada.
Na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), a Pastoral da Juventude vai discutir o extermínio da juventude pobre no Brasil. Como você vê essa situação?
Realmente tem acontecido esse extermínio da juventude, principalmente a juventude negra. As nossas autoridades deveriam ter colocado a Candelária no roteiro de visitas do papa, mas, infelizmente, eles querem passar longe desse assunto. Isso se explica porque mostrar a história da Candelária ao Papa é admitir que acontece esse tipo de coisa no Brasil. Sem dúvida, é mais fácil para eles dizerem que são apenas fatos isolados. No mês passado, moradores da Maré também foram assassinados após confronto com a polícia. Também temos o caso de Vigário Geral, Acari e Borel.
Na sua visão, o que leva a polícia carioca a agir dessa forma?
A polícia age assim porque muitos deles sabem que poderão cometer crimes e não serão punidos. Apenas meia dúzia vai para cadeia. Isso é dito, inclusive, pelos próprios comandantes. O povo é tratado pela polícia como se fosse inimigo, como se não fosse cidadão. Um exemplo claro disso são as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), onde os policiais fazem a distinção entre cidadãos e favelados.
Os policiais que participaram da chacina estão atualmente em liberdade. Como você avalia essa situação?
Eles cumpriram a pena estipulada e tiveram progressão de regime. Mas a impunidade não é referente somente aos policiais. A impunidade abrange o descaso do governo que não tem nenhuma política voltada à criança e ao adolescente em situação de rua. Outro descaso do governo é não deixar funcionar o Conselho da Criança e do Adolescente como deveria: é um órgão no qual falta funcionário e verba. (colaborou Simone Freire, da Redação)
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