terça-feira, 2 de junho de 2015

Crônica do Dia - Ética tardia - Flávia Oliveira

Reputação de patrocinadores da Fifa está em xeque. É difícil crer que quem bancou o campeonato não conhecia as regras do jogo


Bastou o FBI bater à porta, e a festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu. Com a devida licença ao poeta Carlos Drummond de Andrade pela apropriação dos três versos de “José”, a cena representa a reação de patrocinadores históricos do futebol mundial ao escândalo que já levou à prisão sete dirigentes da poderosa Dona Fifa, e cujo desfecho segue imprevisível. O problema é que os copos, marcados por impressões digitais, continuam sobre a mesa. E a nuvem de desconfiança que paira sobre a gestão do esporte mais popular do planeta põe na sombra também a reputação de grandes corporações. Difícil convencer a torcida de que quem bancou o campeonato, décadas a fio, não conhecia as regras do jogo. Ética tardia é artifício velho para lidar com um mundo novo.

O dia seguinte à captura dos cartolas foi pleno de comunicados de patrocinadores sobre o episódio. A Visa emitiu a nota mais dura, na qual ameaçou suspender o contrato com a Fifa, previsto para durar até a Copa do Qatar (2022). A companhia cobrou da entidade medidas imediatas para “reconstrução de uma cultura com fortes práticas éticas”. Coca-Cola, Hyundai, McDonald’s e Budweiser, outras parceiras, também tornaram pública a preocupação com o envolvimento de dirigentes do futebol com a Justiça dos EUA.

Não foi ato isolado. Escândalos anteriores no mundo do esporte foram tratados da mesma forma. Nike, Anheuser-Busch (cervejaria) e Trek (fabricante de bicicletas) romperam com Lance Armstrong, quando foi comprovada a participação do ciclista sete vezes campeão da Tour de France numa conspiração por doping. Aqui, o Banco do Brasil, em dezembro de 2014, suspendeu acordo com a Confederação Brasileira de Vôlei, após relatório da CGU comprovar irregularidades na gestão do dinheiro público. A parceria foi retomada um mês depois, sob a exigência de novas práticas. Este mês, o banco admitiu ao “Estado de S. Paulo” que os repasses foram interrompidos em fevereiro passado por descumprimento de algumas medidas.

As ocorrências não se restringem ao esporte. Grandes marcas mundiais já entraram em apuros, por causa de fornecedores flagrados em crimes ambientais e exploração de mão de obra. Dois anos atrás, 377 trabalhadores perderam a vida num desabamento em Bangladesh. No prédio de três andares funcionava uma fábrica de tecidos, que empregava três mil pessoas em condições precárias e fornecia para redes europeias, como a espanhola Mango e a britânica Primark.

Os danos acontecem, porque as corporações preferem remediar a prevenir. Exigem austeridade quando malfeitos são descobertos. Deixam de usar o poder de persuasão do capital investido para impor, na origem, princípios éticos. Assim, comprometem a própria imagem. “A reputação envolve confiança, admiração e respeito a uma organização, seja governo, setor privado ou sociedade civil. A boa avaliação atrai apoio e vantagem competitiva. Por outro lado, quem perde reputação, perde valor”, diz Ana Luisa de Castro Almeida, presidente do Reputation Institute Brasil.

Ao se aproximar de outras empresas, marcas ou projetos, uma organização partilha os louros do sucesso, mas não se descola das derrotas. “As empresas não costumam gerenciar os riscos relacionados à reputação”, opina Dario Menezes, professor da área na ESPM e na Fundação Dom Cabral. Se fizessem isso, poderiam romper acordos ao menor sinal de irregularidade ou, melhor ainda, exigir transparência na gestão antes de formalizar a parceria. Seria um golaço.



Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/sociedade/etica-tardia-16312936#ixzz3bxJHzOsi

Um comentário:

  1. Nessa historia para mim não há inocentes, não tem como haver. Os próprios patrocinadores da FIFA são corruptos, cometem crimes usando a própria empresa, não tem como alguém não estar envolvido. Se quem manda na FIFA é corrupto quem pode ajudar a empresa a sair dessa?
    Os presidentes e grande partes dos patrocinadores da FIFA estão envolvidos nisso. Se trata basicamente de lavagem de dinheiro. Uma das ações que eles têm para lucrar muito é por exemplo triplicar o preço de construção de um estádio de 30 milhões para 90 milhões (não sei realmente quanto custaria um estádio), lucrando 60 milhões.
    Mas o principal problema não é roubar o dinheiro.
    É você sujar o nome de um esporte tão grande mundialmente e tão amado no Brasil. O futebol tem grande importância em nosso país, é uma parte essencial em nossa cultura. É também uma forma de aprendizagem, de fazer novas amizades, de ter espírito esportivo já que é um esporte coletivo, e se um perder todos perdem. Esse esporte em quase todo brasileiro começa de uma forma muito inocente, me diga um exemplo de garoto que ao cinco anos nunca teve uma bola de futebol.
    Manchar o nome do futebol é como envenenar nossas raízes, tornar vergonhoso uma parte de nós.

    Davi Vieira 802

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