Napoleão Gonçalves e suas manias.
Napoleão Gonçalves era um sapo que vivia achando. Se perguntavam uma opinião, ele pensava um pouco, depois dizia “eu acho isso”, “eu acho aquilo”, não gostava de não achar nada. E com aquela mania de viver achando, umas das coisas que ele achou é que ele achava que para ser feliz a gente precisa trabalhar nas coisas que a gente gosta.
Teve um ano que ofereceram um monte de dinheiro para ele anunciar pasta de dente na televisão. Ele não gostavade anunciar e nem gostava daquela pasta de dente: não topou o trabalho. Mas a mulher de Napoleão Gonçalves
– que se chamava Mimi-das-perucas, e que vivia no cabeleireiro penteando as perucas e comprando roupa e comprando perfume e querendo comprar o dia inteiro e sempre infeliz e sempre dizendo que a vizinha dela tinha mais coisas que ela e sempre querendo mais dinheiro para comprar mais – tanto falou, tanto reclamou, tanto brigou com Napoleão Gonçalves, que ele acabou na televisão anunciando pasta de dente e se sentindo infeliz à beça.
Mimi gastou o dinheiro todo no cabeleireiro.
Outro ano ofereceram um ordenado um bocado alto para Napoleão ser gerente de uma fábrica de camundongos enlatados. Ele disse que não gostava de comida em lata e não foi. Mas mimi-das-perucas chorou, brigou, disse que queria mais perucas, disse que era uma infeliz por que só tinha dez pares de sapatos e a vizinha tinha quinze, criou tanto casa que Napoleão Gonçalves acabou indo. E enquanto ele dava duro o dia inteirinho na fábrica, Mimi comprava, comprava, só parava de comprar para ir ao cabeleireiro. Até que um dia Mimi-das-Perucas ficou tanto tempo embaixo daquele secador que os cabeleireiros usam, que secou a peruca, a cabeça, Mimi toda secou, morreu.
Como não tinha ninguém com quem deixar os sete filhos pequenos, Napoleão Gonçalves começou a trabalhar em casa: como gostava muito de trabalhar com madeira, resolveu ser marceneiro; e como era louco por teatro comprou uns livros para estudar de noite. Ganhava pouco dinheiro, mas vivia feliz que só vendo, e curtindo cada dia até não poder mais. Adorava os garotos; vivia batendo papo com eles e brincando horas a fio de começar a achar: o que é que vocês acham disso? O que é que vocês acham daquilo? E uma das coisas que os garotos logo acharam é que eles achavam que o pai era o máximo.
(Lygia Bojunga Nunes, ANGÉLICA, págs. 74-75, 7°edição, livraria AGIR editora, Rio de Janeiro, 1982.)
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