Por que, em vez de reduzir a maioridade penal, não se aumenta a oferta de Educação de qualidade?
O DIA
Rio - 'O problema do menor é o maior’, alertava o filósofo Carlito Maia. Somos todos frutos da (des)educação que recebemos. Vivi dois anos entre presos comuns. Conheci suas trágicas histórias de vida. Também seríamos perigosos bandidos se tivéssemos sido criados em uma ‘família’ cujo pai, desempregado e bêbado, surrava mulher e filhos e, para se sustentar, os impedia de ir à escola e os induzia a furtar.
Reduzir a maioridade penal é lavar as mãos diante do descaso para com as nossas crianças e adolescentes. É não reconhecer que elas ingressam no crime porque a sociedade não lhes assegura direitos fundamentais, como Educação de qualidade.
O Brasil tem, hoje, quase quatro milhões de crianças e adolescentes, de 4 a 17 anos, fora da escola. As creches são raras e caras. Por que, em vez de reduzir a maioridade penal, não se aumenta a oferta de Educação de qualidade gratuita e em tempo integral? Educação é direito do cidadão e dever do Estado. Em países com plena escolaridade, a criminalidade precoce é residual. E quando existe não se culpabiliza a criança, e sim a sociedade, que é responsável por educá-la e oferecer-lhe um futuro promissor.
Em 2006, o Brasil se comprometeu, na Organização Internacional do Trabalho, a erradicar, até o fim de 2015, as 89 “piores formas de trabalho infantil”. A meta não será cumprida, já admitiu o governo.
O trabalho infantil fere a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, quem o utiliza não incorre em nenhum crime. Exploração do trabalho infantil não existe no Código Penal Brasileiro.
Projeto para mudar a anomalia tramita no Congresso. Há parlamentares que defendem, abertamente, ser preferível uma criança “trabalhando que roubando”. Ou seja, o adulto empregador pode, impunemente, explorar mão de obra infantil. Mas se a criança furtar, dá-lhe cadeia e penalidade severa.
Enquanto adultos tentam se eximir de suas responsabilidades e propõem reduzir a maioridade penal, sem enfrentar as causas da criminalidade infantil e da miséria, em Itaguaí crianças de 9 a 13 anos chegam a ganhar R$ 1 mil por semana do narcotráfico para servir de olheiros e monitorar o acesso aos pontos de venda de droga.
Não basta “pacificar”, com repressão policial, áreas dominadas por traficantes. É preciso introduzir ali escolas, praças de esportes, salas de arte, cursos profissionalizantes, aulas de teatro, música e dança. Enfim, Educação.
Frei Betto é autor de ‘Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira’ (Rocco)
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