domingo, 8 de março de 2015

Crônica do Dia - A pátria que deseduca - Ruth de Aquino

A quem interessa um povo que não sabe raciocinar, não sabe ler, não sabe escrever, não sabe argumentar? A ninguém, apenas a ditadores. Por isso, até em benefício próprio, para marcar seu nome na História, a presidente Dilma Rousseff escolheu um slogan apropriado para seu segundo mandato: “Brasil, pátria educadora”. Ela ainda não sabia que o resultado do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) de 2014 mostraria o fracasso de seu primeiro mandato na Educação, quando teve três ministros na Pasta. Mais de meio milhão de jovens tirou nota zero na redação – cuja nota máxima era 1.000.


A palavra para definir a nota zero da redação, nessa escala, é “catástrofe”. De 2013 para 2014, o número de zeros na dissertação do Enem quase quintuplicou. Não relativizem o resultado. Uns dizem que o tema “ética na publicidade infantil” era difícil. Outros, que os corretores foram rigorosos demais. Ainda há os que não acham importante uma dissertação no Enem. O ministro da Educação, Cid Gomes, minimiza a queda nas notas de português e matemática: “O que é importante é a média. Na média, menos 1% está na margem de erro”. A média é um recurso medíocre para justificar o injustificável. Quando viu o resultado pior dos alunos de escolas estaduais, Cid Gomes admitiu: “Não dá para fugir, camuflar ou tentar dizer que o ensino público é bom. O ensino público brasileiro está muito aquém do desejável”.

O vexame não surpreende a quem vive da palavra escrita e oral. A língua portuguesa é achincalhada por nossos presidentes, ministros, governadores, senadores, deputados, executivos, empresários e, claro, pela população em geral. Ortografia, concordância e regência verbal erradas, vocabulário pobre e ausência de um pensamento coerente. Não é preciso ir à Europa para encontrar povos que se expressam direito em sua língua materna. Basta ir à Argentina. Com toda a crise de nossos hermanos e a decadência de suas universidades, ali está um povo articulado, que sabe ler e escrever, e tem um raciocínio com começo, meio e fim. Não há analfabetos funcionais concluindo o ensino médio.
O que aconteceu no Enem de 2014? Ao todo, 8,7 milhões de alunos da última série do ensino médio inscreveram-se no concurso. Mas só 6,2 milhões apareceram no exame. A nota máxima de cada prova é 1.000. Só 250 tiraram a nota máxima na redação e 529.374 alunos tiraram zero. Desses, 280.903 entregaram a prova em branco porque não faziam a menor ideia de nada. Dos outros zeros, 217.300 fugiram do tema (talvez inspirados em nossos políticos, que fazem o mesmo nos debates), 13 mil copiaram o texto motivador, 7.800 escreveram menos de sete linhas, 3.300 incluíram textos desconectados, 955 ofenderam os direitos humanos. A média em matemática também ficou abaixo da metade, 476,6 pontos. No meu tempo, abaixo de 5 significava reprovação. Mas “reprovação” virou tabu na pátria do PT, desde Lula, que nunca achou grande coisa saber português ou gostar de ler.

Em artigo para o jornal O Globo, a filósofa Tânia Zagury diz: “Só de ouvir falar em reforma na educação, eu me arrepio”. Após mais de 40 anos de trabalho na área, ela afirma que cada programa reativa o que foi banido, joga no lixo as cartilhas, abandona boas ideias, mas mantém algo sempre: a queda da qualidade no ensino. A última “revolução” foi a “progressão continuada”, o que, traduzindo em bom português, significa aprovação automática. Para “camuflar” a repetência no 1o ano e evitar evasão escolar. A repetência aumentou no 6o ano, quando acabava a aprovação automática. O que foi feito para resolver “o probrema”? Os professores são pressionados a não reprovar. “Teria sido lindo aprovar todo mundo se não tivesse sido à custa do saber”, diz Tânia. Todos se formam, ficam felizes, o governo de Dilma ainda mais porque exibe estatísticas infladas. E não se aprofunda nenhum conhecimento.

Esse não é um destino inescapável. Slogans e discursos não bastam para educar crianças e jovens. Menos roubo e desvios na verba para escolas, uma gestão responsável e focada no ensino fundamental, base de tudo, a valorização do professor em salário e autoridade e maior participação da família. A receita é conhecida. O Brasil só não a adotará se houver a intenção oficial de tirar proveito de um povo sem instrução. Escolas não são fábricas. Dói imaginar que o objetivo seja formar cidadãos que não pensem, não leiam, não escrevam, não critiquem. Uma triste linha de montagem destinada a ser manipulada.






O resultado da falta de educação é, além do subemprego, essa multidão de menores carentes que depredam ônibus, assaltam e matam, rindo, sem dar valor ao patrimônio e à vida. Por enquanto, o Brasil é uma pátria que deseduca.

2 comentários:

  1. Concordo plenamente com a autora, um país sem instrução só serve para ditadores e políticos manipularem as pessoas. A dificuldade para pensar, reagir, conseguirem bons empregos, trouxe vários problemas para a nossa sociedade.
    Ela está certa, a educação do Brasil é péssima, um caos em minha opinião. Pois ela libera nas ruas, um monte de analfabetos funcionais. Isso é bem provado nos resultados das dissertações do Enem, pois a maioria errou, tirou zero, e falam que foi difícil o tema, que os profissionais que corrigiram os textos foram muito rígidos, e finalmente, que fazer a dissertação é perda de tempo. Este resultado, na verdade, é fruto da qualidade do estudo que tiveram.
    Eu acho incrível que Argentina, que é menor que o Brasil, que tem menos recursos, nos supere com sua educação. Ela pode até ser inferior economicamente, mas diferente do nosso país , ela não coloca nas ruas, após a faculdade, analfabetos funcionais. Não podemos viver apenas de futebol, que dispensa uma boa educação, mas precisamos tambem de médicos, construtores, engenheiros, etc, e todos eles precisam do estudo de boa qualidade.
    Sobre a aprovação automática, eu sou contra, pois isso não ajuda em nada, a pessoa só vai sair pior do que estava na escola, ela sai sem ter aprendido nada acreditando que sabe tudo. Se queremos um ensino melhor, temos que cobrar mais das autoridades governamentais, participar mais dos problemas das escolas, dar melhores condições de vida para os professores, e aprender a cobrar dos políticos que nós votamos.
    Enfim , a falta de estudo prejudica o futuro, e posso até criar um novo slogan: "Brasil, pátria que não educa ".

    Davi Amaral Pereira
    802
    14-03-15

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  2. Se você fosse um Imperador e tivesse um enorme Império para governar que tipo de povo você gostaria de ter como seus súditos? Aquele que não questiona, que não tem cultura e que nem consegue pensar e se expressar sozinho? Ou então aquele povo inteligente, que qualquer errinho que você fizesse te tiraria do trono? É obvio que a primeira opção. O povo burro sempre foi o mais fácil de dominar e isso não é só de hoje. Des dos séculos passados era essa a tática dos governantes. Então se sempre foi assim, por que logo no Brasil não seria?
    O problema é que não estamos sabemos botar limites nessa falta cultural e de inteligência que estamos tendo, o ENEM provou isso e não é só de hoje que sabemos como está catastrófica a situação da educação no Brasil. Um povo burro é um povo que não vai para frente. Um país que tem gente burra é um país que não vai para frente. Como dizia Albert Einstein- “Só existem duas coisas infinitas: o universo e a estupidez humana. E não estou seguro quanto à primeira”.
    Quanto menos investirmos na educação, mais pedras no caminho de um bom desenvolvimento do Brasil surgirão. Como queremos ter bons médicos sem educação e com muitas pessoas tirando 0 na prova do ENEM, como queremos inventores se não conseguimos nem resolver o problema de falta de professores.
    Temos que começar a se inspirar naqueles que saíram desse molde e tão protestando, mas não protestando por protestar, mas protestando por que eles têm algo a dizer. O Lula ou o PT podem não ter dado ênfase na educação, mas agora a guerra é nossa, temos que tomar o Brasil e tornar-nos conta por si próprios que nós também temos que mudar, por que se a gente muda, a educação muda e o Brasil também.
    Não descarte a educação por que ela é o motivo de estarmos aqui, já foi tirado de nós o direito de uma educação publica de qualidade, que não nos tire o resto de educação que sobrou.
    Eduarda Raposo-801

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