por Luis Fernando Veríssimo
Eu
estava vendo o ditador norte-coreano Kim Jong-un na TV e pensei no Jango
Goulart. Não que houvesse qualquer semelhança física ou política entre os dois,
mas tanto Kim como Jango nos fazem especular sobre essa coisa misteriosa chamada
carisma — que Jango não tinha e o pequeno e rechonchudo Kim tem muito menos.
Claro, Kim herdou a ditadura do seu pai, que herdou do seu avô. Não precisava
de carisma para chegar onde chegou, bastava o nome. Mas Jango fez uma carreira
política importante que culminou na Presidência da República, apesar da
evidência de não ter muito gosto pela política ou pelo poder, e nenhum carisma.
Também teve um pai político — Getúlio Vargas — mas conquistou sua liderança no
embate e no voto, mesmo com zero de carisma.
Até hoje se especula se a História do Brasil teria sido diferente se a
personalidade do Jango fosse diferente, e ele tivesse vontade suficiente para
chefiar uma resistência ao golpe de 64. Muito se falou, no rescaldo do golpe,
num inexistente “esquema do Jango” que deteria os golpistas. Hoje se sabe que o
“esquema” pode até ter existido, o que faltou foi a decisão do Jango de inspirar
uma reação, com o risco de deflagrar uma guerra civil. Foi o momento em que um
pouco de carisma teria mudado tudo.
Richard Nixon, ex-presidente dos Estados Unidos.
Outro caso notório de um político que foi longe sem carisma é o de Richard
Nixon, que chegou à presidência dos Estados Unidos, e à reeleição, apesar do seu
ar soturno e da sua absoluta falta de atrativos pessoais. Nixon fez a sua
carreira como caçador de comunistas durante a Guerra Fria, e ganhou o apelido de
“Tricky Dick” e uma reputação que justificava o apelido de pouco confiável.
Mesmo assim só não completou dois mandatos na presidência porque foi
derrubado pelo escândalo de Watergate. Faltava a Nixon o que sobrava, por
exemplo, em John Kennedy. Houve um famoso debate eleitoral entre os dois em que,
na opinião de todos, Kennedy arrasou com Nixon.
Revendo-se a gravação do debate, depois, chegou-se à conclusão de que Nixon,
na verdade, vencera. O que convencera as pessoas da vitória de Kennedy fora sua
aura de juventude e capacidade de liderança, além da cara limpa em contraste com
a cara sombria do adversário. Ganhou o debate o carisma do Kennedy, não o
Kennedy.
O que é, afinal, carisma? O “Aurélio” diz que é a atribuição a alguém de
qualidades específicas de liderança, derivada de sanção divina, mágica ou
diabólica. Em suma, um mistério. Você nem sempre sabe quem tem, mas sabe
imediatamente quem não tem.
Luis Fernando Veríssimo é escritor.
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