sábado, 11 de janeiro de 2014

Personalidades - Carlos e José Gramático

Apesar do sobrenome, irmãos cariocas são ouro em matemática

  • Carlos e José Gramático causaram reviravolta na árvore da família vencendo competições de cálculo
 
Ludmilla de Lima
 

José e Carlos Gramático, campeões de olimpíadas de matemática Foto: Ana Branco
José e Carlos Gramático, campeões de olimpíadas de matemática Ana Branco
RIO — Carlos, de 11 anos, e José, de 13 anos, sempre estudaram em escolas públicas. De família de jornalistas, os dois, no ano passado, surpreenderam os pais e professores ao ficarem entre os melhores em olimpíadas que envolvem questões de lógica e raciocínio. Os primeiros representantes da família Gramático provavelmente eram copistas do norte da Itália. O sobrenome remonta, como contam seus descendentes, ao século XV. Passado tanto tempo, dois pequenos cariocas integrantes da árvore genealógica dos gramáticos, detalhadamente explicada numa cartolina pendurada na sala do apartamento, dão um nó na história que deu origem à família. Carlos Gramático Terceiro, de 11 anos, e José Gramático Segundo, de 13 anos, estão mais para Matemático: os irmãos, que moram em Botafogo e sempre estudaram em escolas públicas, conseguiram o feito de serem, no mesmo ano, medalhistas de ouro em competições de matemática. Para orgulho de professores e dos pais, os jornalistas Sérgio e Angeli Gramático, Carlos ficou entre os primeiros nas Olimpíadas de Matemática do Estado do Rio de Janeiro (Omerj), enquanto José foi um dos melhores na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep).
Embora os dois sejam excelentes alunos em todas as disciplinas, os resultados pegaram de surpresa os pais:
— Estou que nem a música: babando! — suspira Angeli, que tem 55 anos.
Aluno da Escola Municipal Minas Gerais, na Urca, Carlos, que já tinha levado a medalha de prata da Omerj em 2012, foi um dos estudantes a receber em novembro o ouro, em solenidade na sede do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), no Jardim Botânico. A família dos dois agora se prepara para mais uma solenidade, quando José receberá das mãos da presidente Dilma Rousseff, em cerimônia no Theatro Municipal, seu prêmio. O evento ainda depende da agenda da presidente, mas é esperado para maio.
José é um menino tímido, que hoje se revela no palco. Ele prefere as aulas de artes cênicas do Colégio de Aplicação da UFRJ (CAp-UFRJ), onde estuda, à matemática e faz um curso de teatro na UniRio, onde já encenou uma peça inspirada em contos de Luís Fernando Veríssimo. Com um sorriso envergonhado que revela o aparelho nos dentes, ele conta que foi contrariado fazer a prova da segunda fase da olimpíada: no dia, mesmo sendo sábado, José tinha aula no CAp-UFRJ. O menino, ao contrário de muitos da sua idade, detesta faltar às aulas, o que revela muito de sua personalidade.
— Essa foi minha única falta do ano — ainda lamenta José, Segundinho para os íntimos, que mantém um hábito bem curioso em sala de aula, como recorda um professor: todos os dias, ele monitora, com uma listinha em mãos, a presença dos colegas de turma.
Disciplinado por conta própria, José passou agora para o 8º ano, com um boletim recheado de notas 9 e 10.
— O José é um menino caladão, não é de falar muito. Mas é muito observador. Ele participa da aula com o olhar. Mas essa timidez tem um pouco de orgulho — conta o professor de matemática do menino, Fellipe Coelho, acrescentando que José, mesmo tímido, interage com o restante da classe e tem sua turminha. — Ele é diferente porque é bom aluno em todas as matérias. Ele se expressa muito bem, tem uma escrita muito boa. Em matemática, ele é mais amadurecido do que o resto da turma.
Empurrãozinho da mãe
Segundinho — o nome diferente se deve a uma homenagem ao avô paterno — diz que a matemática é um momento da sua vida. Como qualquer garoto de 13 anos, ele não sabe ainda muito do futuro. O fato é que os pais demonstram mais empolgação do que ele com a sua automática integração no Programa de Iniciação Científica (PIC) do Impa, que organiza a Obmep. Pelo ouro na olimpíada, ele também receberá uma bolsa de cem reais do CNPq.
— Fiquei surpreso com o resultado. Fiquei três horas fazendo a prova . Na última questão, não estava nem com vontade de responder mais — lembra José, habilidoso em lógica e raciocínio e também no traço. — Já pensei em ser desenhista, arquiteto e até chefe de cozinha. Mas eu só sei fritar um ovo — ri o menino, que ainda vê com desconfiança a responsabilidade de ser um jovem cientista.
Já Carlos, por decisão do pai, herdou nome do bisavô e trisavô. Por isso, o Terceiro no sobrenome. Ele explica essa excentricidade do pai, Sérgio, de 70 anos, professor aposentado de jornalismo.
— É como a tradição dos imperadores — diz a criança, que foge do estereótipo de nerd.
Único ouro de sua escola nas olimpíadas do Rio (organizada por uma comissão de professores de matemática do ensino fundamental e universitário), Carlos, se pudesse escolher, seria jogador de futebol. Ele é da escolinha da Fluminense, onde joga como meia.
— Gosto de futebol e de fazer atividades ao ar livre, como andar de bicicleta, brincar com os amigos — conta Terceirinho, como é chamado por amigos.
Mas o menino, que terminou o 5º ano em 2013 com média geral de 9,7, espanta os professores é com a sua rapidez em resolver problemas matemáticos.
— Várias vezes lanço desafios para a turma, que brinca que o Carlos não pode participar, porque sempre ganha. O raciocínio lógico dele é muito rápido — ressalta a professora Camilla de Menezes Paiva, professora de matemática e ciências de Carlos no 5º ano. — Ele é um menino tímido, mas superinteressado em todos os assuntos.
Tudo indica que ele fará o 6º ano no Pedro II do Centro, cuja prova de matemática da seleção ele gabaritou. A classificação dos aprovados ainda não foi divulgada. Outra professora, Regina Jorge, do Instituto Rogério Steinberg (que oferece aulas de graça para alunos com altas habilidades), destaca a inteligência do garoto.
— Ele tem perfil de superdotação, principalmente em matemática. Ele me surpreendia na sala em relação à solução dos problemas. Eu colocava no quadro a minha solução e ele levantava o dedinho discretamente e dava outra que eu sequer tinha pensado — afirma Regina, professora de Carlos no instituto, onde ele se preparou para a prova do Pedro II.
Em casa, os dois têm um empurrãozinho da mãe. No começo de ano letivo, Angeli cria tabelas onde constam todas as informações do calendário escolar. As pranchetinhas ficam penduradas no quarto dos irmãos, que moram num apartamento de classe média em um condomínio de Botafogo. Os dois vão preenchendo as lacunas com notas e médias à medida que as tarefas e provas são feitas.
— Ela marca no calendário quais são as atividades daquele ano. As atividades acadêmicas têm que ser cumpridas, e a mãe cobra. Feito isso, eles têm a liberdade que querem. Mas são naturalmente estudiosos — conta o pai, que tem outros três filhos, todos mais velhos que Carlos e José e formados em jornalismo.
A mãe, que só tem os dois meninos, completa dizendo que ali ninguém precisa mandar os irmãos fazerem os deveres de casa nem irem para a escola.
— Às vezes, quando fico zangada com o José, digo: “Amanhã você não vai à escola”. E ele: “Ah não, mãe!” — conta Angeli, que dá a fórmula para o sucesso. — Acredito que é o afeto e também a disciplina. É saber dizer sim e também não. E na hora do não, não há discussão.
Professores garantem que eles são excelentes em português. Mas, na preferência, a matéria sai derrotada. Afinal, gramática ou matemática?
— Matemática! — sentenciam os irmãos Gramático.


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