domingo, 1 de junho de 2014

Te Contei, não ? - Um diário e os segredos de um crime passional


Encontro. Anna Sharp com Luís Henrique, que lhe devolveu o diário
Encontro. Anna Sharp com Luís Henrique, que lhe devolveu o diário Foto: Arquivo pessoal
Fernanda Pontes - O Globo


RIO — Há uma semana, a terapeuta Anna Sharp recebeu das mãos de um desconhecido um caderno escrito pela sua avó Anna Emília Ribeiro de Assis com o título revelador: “O caso do homicídio de Euclides da Cunha por Dilermando de Assis — Exposição e narrativa dos fatos feitos por escrito, do próprio punho da mulher da vítima”. No diário de 45 páginas, que a família acreditava ter sido queimado para apagar as lembranças do acontecimento, mas reapareceu, como informou a jornalista Lu Lacerda, a avó escreve pela primeira vez sobre o triângulo amoroso que resultou na tragédia amorosa mais conhecida do país. Ela era mulher de Euclides da Cunha, autor de “Os sertões,” que a flagrou com o militar Dilermando de Assis. Os dois se enfrentaram e o amante matou o escritor a tiros.
A tragédia não acabaria ali, na casa de Dilermando, em Piedade, onde Anna de Assis ia encontrá-lo furtivamente. Sete anos depois, Euclides da Cunha Filho tenta se vingar pela morte do pai e também é morto pelo militar. O diário começa com uma confissão de culpa: “Julgo que nesse templo só deve penetrar a verdade, e em altas vozes, embora seja para alguns áspera ou melindrosa. Eu tenho que dizer o que sei sobre essa fatal tragédia, que arrastou tantas vítimas, e não que agradar a uns, prejudicando a outros. Não venho ofender nem acusar, venho cumprir com um sagrado dever e dar desencargo à minha consciência e tranquilidade ao meu espírito, dizendo que de nós três: Euclides, Dilermando e eu, três criminosos, o mais responsável sou eu”.
Outra surpresa para a neta foi o grande escritor Euclides da Cunha ser retratado como um homem grosseiro. Após núpcias marcadas por frustrações, a avó diz: “No dia do casamento, supliquei-lhe meu regresso para casa de meus pais (...). Ele insultava-me como um alucinado”. Anna Sharp conta que há relatos de brigas em que Euclides teria cuspido na avó e rasgado seus vestidos. Já sobre Dilermando, Ana de Assis dizia que a gentileza, e não a beleza, era o que a impressionava.
— Fiquei surpresa ao ler que o Euclides já estaria ciente do romance, pois aceitava que Anna chegasse de madrugada e dormisse fora. Ela estava sempre na companhia de Dilermando — conta a terapeuta. — Ela diz que chegou a pedir o divórcio, mas Euclides negou, ameaçando retirar os filhos dela.
Os detalhes desse triângulo amoroso, que inspirou a minissérie “Desejo” da TV Globo, chegaram até Anna Sharp, dias atrás, quando ela foi procurada por um desconhecido que descobriu se tratar de Luís Henrique de Oliveira, descendente de Gregório Garcia Seabra Júnior, advogado de Dilermando. Neta de Anna de Assis e do militar, ela conta que sempre foi ligada à avó (“eu nasci pelas mãos dela e tenho esse nome em sua homenagem”) e, há cinco anos, tentava escrever o romance “Vozes do passado” sobre a saga familiar.
— Minha irmã e eu conversamos e fiquei me perguntando se não deveria deixar os mortos descansarem em paz. Cheguei a rezar e pedir um sinal se deveria ou não continuar o livro — conta a terapeuta, que mora na Serra da Bocaina.
Agora, ela relê os manuscritos que a motivaram a retomar o próprio livro.


Leia mais: http://extra.globo.com/noticias/rio/um-diario-os-segredos-de-um-crime-passional-12563066.html#ixzz33Oq6RlJ6

Nenhum comentário:

Postar um comentário