sexta-feira, 20 de março de 2015

Te Contei, não ? - Édipo rei

Édipo Rei,
de Sófocles, compõem a primeira parte da trilogia sobre a família dos Labdácias (sendo Édipo em Colono a segunda parte. E Antígona, a terceira). A obra conta, na visão do autor, o mito que permeava a cultura grega por mais de oito mil anos. Tendo sido, segundo Aristóteles, a tragédia mais perfeita escrita até seu tempo e, devido a sua perfeição, deveria servir de modelo às demais. Fato é que Édipo Rei extrapolou os limites da arte, tendo servido de base para o famoso complexo de Édipo, conceituado por Freud. Para Michael Focault ao estudar acerca das práticas judiciárias da Grécia Antiga. E também, para Nietzsche basear seus estudos sobre a cultura grega. Por tantas releituras e interpretações, a obra é, provavelmente, a mais analisada (tanto sua forma, quanto seu conteúdo) dentro da cultura ocidental.


Édipo Rei conta a história de Édipo, filho do rei Laio, que é deixado para morrer por causa de uma maldição lançada ao rei. A maldição evocava a morte de Laio pelas mãos do próprio filho. Édipo sobrevive ao abandono e quando alcança a tenra idade, mata um homem em uma encruzilhada. Homem, o qual, sem ele saber, era seu pai. Édipo continua sua viagem para a capital e ao desvendar o enigma da esfinge, torna-se rei. Consequentemente, tem filhos com sua própria mãe. Anos depois o reino passa por dificuldades e ao mandar consultarem o Oráculo, Édipo precisa descobrir quem foi o assassino do rei, pois, só assim a terra voltaria a germinar, as mulheres voltariam a ter filhos e a paz voltaria ao reino.

A história adquiriu tamanha fama que todos os leitores conhecem a resposta para a pergunta “quem matou Laio?”. Todavia, um dos pontos mais importantes para se analisar na obra é: de qual maneira e com quais habilidades o autor cria a atmosfera que nos levará à resposta final: Édipo.

Toda tragédia grega trata de um evento grandioso, com homens grandiosos que terá proporções grandiosas. E para isso é necessário uma hamartía (desmesura, erro por exagero). Em Édipo Rei, a hamartía de Édipo é o amor pelo poder que resulta na sua mania de grandeza. Evidenciado logo no início pelo verso n° 61: “nenhum sofrente tem meu sofrimento:” e n°63/64 “meu peito aperta pela Pólis, por mim, por ti também”. Ou seja, ninguém sofre como Édipo sofre. E por sofrer demais, ele não é um simples humano, também não é um deus, porém, é definitivamente, neste momento, um além do humano (Sacerdote referindo-se à Édipo: “Melhor entre os melhores, lembra: sóter, assim te chamam, nosso salvador. (versos n° 47 e 48)).

E então, Édipo, ao ser informado que é necessário encontrar o assassino de Laio diz que entrará em combate por justiça e não agirá em nome de um remoto amigo “mas por mim mesmo eu mesmo afasto a mácula” (verso 138). Vemos, claramente, uma mensagem aos espectadores do teatro. Além da fixação no “eu”, o verso reproduz o som de “mmmm”, que no grego remonta a “moi”, traduzido como “eu”. A conclusão é de que forma e conteúdo andam de mãos dadas. Tanto a composição morfológica quanto a fônica expressam uma única ideia acerca de Édipo: eu. E esse “eu”, sabemos que é a resposta para a pergunta “Quem Matou Laio?”.

Édipo continua o seu pronunciamento sobre o assassino de Laio e a partir do verso 222 até o 243 ele declara aquilo que se considera ser a primeira Pena na história da humanidade. Trecho de tamanha importância que serviu de base maior para o trabalho de Michael Focault acerca das práticas judiciárias. Ainda no trecho, o autor repete cinco vezes a palavra “ninguém” entre os versos 238 e 240, para reforçar que nenhum humano deve se aproximar do assassino de Laio. Portanto, Édipo determina aqui o seu fardo. Fardo que fará dele alguém aquém do humano.

Todavia, como, no momento, Édipo ainda é alguém melhor do que um humano, o seu perecer não pode afetar somente ele. Afinal, a queda de um rei reflete em todo o seu reino.  E o autor, usando da voz de Tirésias, expressa a ideia categoricamente nos versos 427/428 “Ninguém conhecerá um desmoronamento pior do que o teu”. O uso da palavra desmoronamento, geralmente associado a imóveis não é por acaso. Pois, como dito, a queda de Édipo não afetará apenas o próprio, mas todo o reino. O autor usa da variação da palavra “desmoronamento” para construir outro sentido acerca dela.

Outros sentidos. Ambiguidade. Palavras que permeiam toda a obra de Édipo e quando Jocasta (sua esposa e mãe) diz, no verso 939 “Tem senso duplo o teu dizer”, podemos tirar a frase do contexto e coloca-la sobre todo o livro de Édipo. “tem senso duplo o teu dizer”. A começar pelo título, que possui no mínimo três significados “pés inchados”, “o duplo” e “o que sabe sobre os pés”. Usando a própria Jocasta vemos esse duplo sentido retratado a todo instante em Édipo, afinal, ela é mãe e esposa do personagem principal. Que por sua vez é irmão, pai e avô de seus filhos. Édipo também é rei de todas as maneiras viáveis: por direito hereditário, por ter assassinado o rei e por ter decifrado o enigma da esfinge. E finalmente, no júri que Édipo cria ele assume todas as posições, desde juiz até réu condenado.

E só então, depois de condenar-se e furar os próprios olhos, ter a mãe (e mulher) cometido suicídio, Édipo abandona, na cena final, a sua hamartía. Quando é proibido de levar suas filhas consigo, ele percebe que nada pode fazer e parte como um ser aquém do humano. Ao partir deixa uma mensagem clara ao público: o poder faz mal. Portanto, não tentem usufruir dele.  Em uma mensagem curta e direta daquilo que é conhecido por “caráter modalizador” (comum nas obras gregas).

Literatura Tortura 

Um comentário:

  1. Achei interessante o texto lido e fiquei surpreendido por saber que o teatro grego tinha uma mensagem ao final de suas histórias.
    A maldição de Édipo é uma história interessante, pois nos mostra que os gregos acreditavam fielmente em visões e maldições. O curioso é que a historia foi evoluindo, a maldição se cumpriu e os personagens demoraram a perceber o ocorrido. Quando a mãe (esposa) de Édipo percebe que a maldição se cumpriu, ela se mata e Édipo fura seus próprios olhos e se perde na floresta. No final, o teatro mostra que por abusar do poder Édipo sofre e é castigado.
    O drama foi a primeira linguagem teatral inventada, e Édipo rei é um bom exemplo deste gênero Literário.

    Nome: Theofilo R. Turma: 701

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