domingo, 21 de setembro de 2014

Crônica do Dia - A força do Mito

Paulo Guedes, O Globo

O novo mito Marina Silva é mais forte do que pensava o establishment. Suas intenções de voto resistem ao desesperado bombardeio dos candidatos ameaçados pelas urnas por sua complacência com as práticas da “velha política”.


A frágil seringueira que venceu as terríveis doenças de uma infância pobre e desmarcou na véspera um embarque no voo da morte tornou-se o veículo da indignação com a roubalheira na política e marcha predestinada rumo à Presidência da República. Este é o enredo em configuração.

“Os partidos perderam o vínculo com a sociedade. Não consigo imaginar que as pessoas possam confiar em um partido que coloca por 12 anos um diretor para assaltar os cofres da Petrobras. Querem que os partidos continuem fazendo do mesmo jeito? Prefiro acreditar que podemos começar um novo caminho”, diz a mensageira da “nova política” em sabatina promovida por O GLOBO.

“Em todos os partidos tem gente corrupta. Nós não empurramos a corrupção para debaixo do tapete. Nem engavetamos processos como era feito”, responde Dilma Rousseff também na sabatina.

Os militares no Antigo Regime e a social-democracia hegemônica desde a redemocratização empurraram os gastos públicos de menos de 20% para quase 40% do Produto Interno Bruto brasileiro. A corrupção sistêmica tem aqui suas raízes profundas.

Envergonhou os militares, devastou a “direita” fisiológica e desmoralizou a social-democracia, atingindo sucessivamente os grandes partidos de “esquerda” — PMDB, PSDB e PT —, que se revezam no poder há sete mandatos presidenciais, com uma breve interrupção de um “direitista” emparedado pelo impeachment. A perda de governabilidade por Collor teria sido por “corrupção de direita” ou por “corrupção não compartilhada”?

Não sabemos exatamente como será a “nova política”. Mas conhecemos o suficiente das práticas degeneradas da “velha política” para rejeitá-las. Sustentação parlamentar não pode ser sinônimo da compra de votos pelo Executivo no Congresso.

A falta de aprofundamento dessa questão nos debates eleitorais deixou para Marina o simbolismo das mudanças e, para os demais, a pecha de complacentes com o status quo. A reforma política não é apenas uma exigência moral. É também uma necessidade para tornar funcional nossa democracia representativa.

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