É essência da democracia a convivência de forças políticas que se opõem, cada uma representando a parcela da sociedade que com ela se identifica, e no caso de mandatos no Legislativo e cargos no Executivo preenchidos pelo voto direto da população.
É a partir desta premissa básica, e sendo nosso país um Estado laico — desde 1890 —, que vem causando grande preocupação às entidades de defesa dos direitos humanos e das minorias a insidiosa contaminação da política pela religião, cada vez mais utilizada por determinadas lideranças partidárias e seus seguidores na tentativa de insuflar a opinião pública.
Para isso, alguns desses parlamentares vêm se valendo da disseminação, notadamente pela internet, de uma intensa campanha de ódio. Com vídeos editados e ataques agressivos, buscam demonizar, pela via da difamação e dos termos mais chulos, os ativistas e parlamentares que se recusam a reconhecer uma comissão que deixou de fazer jus ao seu nome e esvaziou-se e perdeu sentido desde que foi posto para presidi- la o deputado Marco Feliciano.
Como defensor das liberdades democráticas,
não podemos quedar inerte ante o seu desvirtuamento, a forma repugnante, espúria, com que vêm sendo extravasados conceitos e preconceitos homofóbicos e racistas camuflados de supostos preceitos religiosos ou presumidos valores familiares.
Tribunas estão sendo transformadas em púlpitos do fundamentalismo. E, de maneira estranha à atividade parlamentar, a tecnologia é usada na campanha viral de ataques à honra de pessoas que lutam contra a hipocrisia e a repressão dos que fecham os olhos à diversidade humana. Procura-se, por todos os meios, e covardemente, reforçar antigos estigmas sociais.
Há os que pretendem tratar homossexualidade como doença — convicção de inspiração nazista — e quem queira confundir os cidadãos levando-os a acreditar na necessidade de punir quem discrimine heterossexuais. Alguém já ouviu falar em tal discriminação? Pura provocação.
Vemos a infeliz combinação da influência religiosa com e para fins políticos e da política com e para objetivos que têm mais a ver com a disputa mundana de poder do que com algum propósito espiritual. Em qualquer dos casos, tratasse de uma excrescência a ser combatida.
Devemos denunciar os que tentam manobrar
politicamente a massa de fiéis e nos insurgimos contra a exploração da religiosidade para benefícios eleitorais.
Wadih Damous é presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB e da Comissão da Verdade no Rio
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