sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Crônica do Dia - Brasil em primeiro - Tania Zagury

Somos o país que mais perde tempo para combater indisciplina de alunos


Éverdade, ficamos em primeiro, mas não na Copa! Estou me referindo ao estudo que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico divulgou no qual ocupamos o primeiro em bagunça na sala de aula. Somos o país cujos professores mais perdem tempo para combater a indisciplina (20% do tempo, mais 12,2% em tarefas como fazer a chamada, e somente 67% em atividades pedagógicas).

Diante do quadro, sobram especulações. Segundo alguns, falta ao docente domínio de classe; outros apontam a tecnologia como solução; há os que afirmam que as aulas são desmotivadoras e a bagunça, mera consequência. Preocupam-me afirmativas que culpam o professor — e param aí. Porque o problema é mais complexo e se agrava ano a ano. Professor apanhar de aluno ou ser xingado já é corriqueiro. E, sim, alguns docentes erram — afinal ninguém é perfeito.

Não nego que todas as hipóteses acima estejam corretas. Não atacam, porém, a raiz do problema. Estudo que empreendi em 2006, com cerca de dois mil docentes, mostrou que, de norte a sul do país, professores consideram a indisciplina e a falta de respeito dos alunos o seu mais grave problema. E sinto dizer: boa parte disso se origina na família e, claro, pode se agravar se a escola não for de qualidade. Verdade é que boa parte dos pais deixou de lado o que tão bem fazia: a socialização primária, que nada mais é do que ensinar limites, respeito a colegas e autoridades — enfim as bases da boa educação. O que faz muita diferença. E era o que permitia aos docentes iniciar a aula tão logo entrassem em sala. Hoje demanda meses para que alcancem a situação de aprendizagem — um conjunto de condições que têm que estar presentes no ambiente para propiciar concentração e foco, essenciais no processo de aprender.

Turmas muito indisciplinadas tornam impossível até mesmo escutar o que o professor diz, quanto mais se concentrar! Aprender assim é loteria. Claro, o professor tem ação preponderante no processo. Mas, na sala de aula que se rege pelo descompromisso, cadeiras e bolinhas voam! Além disso, há toda uma situação dita “politicamente correta” que inibe que se faça qualquer sanção a alunos recalcitrantes. A situação beira o insolúvel. Contribui bastante para o caos a postura de alguns pais que ameaçam trocar de escola quando contrariados ou “denunciar à imprensa” quem puniu o seu anjinho... Tudo isso levou os alunos à percepção de que podem fazer tudo que quiserem que nada lhes acontecerá. E podem mesmo, em muitos casos.

A escola tornou-se refém dos que insistem em torpedear a própria aprendizagem — e acabam prejudicando a todos. Então, antes de comprar tablets, é preciso garantir espaço mínimo de autoridade pedagógica ao gestor e sua equipe, sem o que é impossível propiciar qualidade. Claro, o professor pode e deve dar aulas modernas e usar meios que ajudem a motivar. Mas é importante saber que, se seis em cada 30 alunos não querem fazer nada a não ser pular e cutucar colegas, e se o professor não tem meios para impedi-los, acabam tornando impossível aos demais até mesmo... ligar o tablet! E aí, aprender o quê? E ensinar como?

Tania Zagury é filósofa e educadora




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