domingo, 23 de fevereiro de 2014

Crônicas do Dia - Educação e consciência crítica - Frei Betto

Rio - O bloco socialista se desintegrou antes de completar um século. A União Soviética se esfacelou, e os países que a compunham adotaram o capitalismo como sistema econômico e sinônimo de democracia.

Tudo aquilo que o socialismo pretendia e que, em certa medida, alcançara — redução da desigualdade social, garantia do pleno emprego, Saúde e Educação gratuitos e de qualidade, controle da inflação, etc. — desapareceu para dar lugar a todas as características desumanas do neoliberalismo capitalista: a pessoa encarada não como cidadã, e sim como consumista; a exploração da força de trabalho e a apropriação privada da mais-valia; a especulação financeira; a degradação da condição humana através da prostituição, da criminalidade e do consumo de álcool e drogas.
É dever de todos que se consideram de esquerda se perguntar quais as causas do desaparecimento do socialismo na Europa. Foram várias, entre as quais destaco uma de caráter subjetivo, ideológico: o papel do educador na formação de seus alunos.
Nascemos todos autocentrados. “O amor é um produto cultural”, teria dito Lênin. Resulta do desdobramento de nosso ego, o que se obtém através de práticas que infundam valores altruístas, gestos solidários, ideais coletivos pelos quais a vida ganha sentido, e a morte deixa de ser encarada como fracasso ou derrota.
Este o papel do educador: não apenas transmitir conhecimentos, facilitar pedagogicamente o acesso ao patrimônio cultural da nação e da humanidade, mas também suscitar no educando o espírito crítico, a atitude ética, a busca do homem e da mulher novos em um mundo verdadeiramente humanizado.
Isso jamais será possível se não se propicia ao magistério um processo de formação permanente. Estamos todos sujeitos às influências nocivas que satisfazem o nosso ego e tendem a nos imobilizar quando se trata de correr riscos e abrir mão de prestígio, poder e dinheiro. Jamais haverá um sistema social no qual a ética se destaque como virtude inerente a todos que nele vivem e trabalham.
O mais importante é o trabalho pedagógico, tarefa na qual os professores desempenham papel preponderante por lidar com a formação da consciência das novas gerações. O papel número um do educador não é formar mão de obra especializada ou qualificada para o mercado de trabalho. É formar seres humanos felizes, dignos, dotados de consciência crítica, participantes ativos no desafio permanente de aprimorar a sociedade e o mundo em que vivemos. 

Frei Betto é autor de ‘Alfabetto: Autobiografia Escolar’ (Ática)

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