TEL AVIV, Israel — Os olhos se esforçam, a testa se enruga, mas as letrinhas do jornal continuam embaçadas. A luz não parece ser suficiente, mesmo acendendo as lâmpadas da sala. Você sente uma leve dor de cabeça e afasta a página do rosto, na esperança de conseguir mais foco. Não tem jeito. Trata-se de um caso certeiro de presbiopia ou, simplesmente, vista cansada, na linguagem popular. Mas, segundo uma pesquisa inovadora, em vez de tolerar o desconforto da condição, é possível superar ou pelo menos minimizar o problema por meio de exercícios visuais desenvolvidos especialmente para quem está cansado de gastar dinheiro e carregar constantemente na bolsa óculos de leitura ou bifocais.
A presbiopia, palavra que vem do grego “olho envelhecendo”, é a degeneração da visão de curto alcance que acontece naturalmente com a idade. O motivo é a perda da elasticidade na lente do olho, o cristalino, o que dificulta focar em objetos próximos. Esta lente precisa mudar de comprimento e de formato toda vez que o olho mira em algo diferente. E é esta flexibilidade que se perde com o tempo.
Segundo especialistas, a condição afeta nada menos do que 80% das pessoas com mais de 42 anos e 99% com mais de 51. Há quem sustente, no entanto, que a anomalia tem começado cada vez mais cedo. Muitos reclamam da vista cansada aos 35 anos. A vida moderna, com a multiplicação de gadgets, computadores, games, iPads e iPhones, pode estar na raiz do problema.
— O olho humano não é projetado para durar 80, 90 anos, principalmente se fica se esforçando para ler em telas de computador que, mesmo modernas, têm resolução ainda baixa demais — diz o professor Uri Polat, especialista em doenças visuais da Universidade de Tel Aviv. — Não há cura para essa deterioração, mas é possível treinar o cérebro para compensar esse problema.
Para provar sua teoria, Polat conduziu, entre 2010 e 2011, uma experiência nos laboratórios da Universidade da Califórnia, em Berkeley, que pode devolver as esperanças de uma visão mais certeira por mais tempo. Ele e o colega americano Dennis Levi reuniram 30 voluntários com idade média de 51 anos (entre 40 a 60 anos) que sofrem de vista cansada e as fez praticarem o que chamaram de “treinamento perceptivo”. Por três meses, os participantes do estudo realizaram exercícios visuais específicos pelo menos três vezes por semana, por 30 minutos em cada uma das sessões.
Os exercícios consistiam em olhar para a tela de um computador e perceber o momento em que apareciam os chamados “padrões Gabor”, pequenos desenhos quadrados, em preto e branco, considerados básicos para o sistema visual. Os participantes tinham que olhar fixamente para a tela e discernir o momento em que um desses padrões — que simulam a sensação de profundidade através do contraste entre o preto e o branco — aparecia. Com o tempo, os exercícios se tornavam mais complexos, com diversos padrões aparecendo simultaneamente, sempre por fracções de segundo. Segundo os pesquisadores, o esforço visual para a percepção dos desenhos estimula o córtex visual, a área do cérebro especializada no processamento de imagens. Com o tempo, o cérebro aprende a focar nos padrões com mais clareza e rapidez.
Ao final de três meses de trabalho, Polat comparou a visão dos participantes com a de sete jovens com visão perfeita e três adultos com presbiopia que não praticaram os exercícios. Os resultados, publicados na revista especializada “Scientific Reports”, foram surpreendentes: todos os 30 voluntários passaram a ler de perto perfeitamente, sem a ajuda de óculos bifocais, alguns deles na mesma rapidez dos jovens. Os três adultos que não se exercitaram, por sua vez, apresentaram piora na visão de curto alcance.
Segundo Polat, a melhora não aconteceu por causa de uma “cura” na performance do olho, mas sim da possibilidade que o cérebro tem de manter plasticidade suficiente para superar a deterioração biológica natural. Na verdade, é o cérebro que aprende a decodificar melhor a imagem que recebe, mesmo que borrada.
— A visão não acontece no olho, e, sim, no cérebro — explica Polat. — O olho captura a luz e a transmite para que ele a decodifique e processe as imagens. O que podemos fazer é ensinar o cérebro a compensar, contrabalançar, o enrijecimento do cristalino. Não há limite de idade para ensinar algo novo ao cérebro.
Ele salienta, no entanto, que idosos podem sofrer com outros problemas de visão com a idade, como catarata e glaucoma, que não podem ser melhorados dessa forma.
Para provar que seu método atua sobre o cérebro e não sobre a fisiologia do olho, Polat pediu a assistência do renomado optometrista americano Clifton Schor, que constatou que, ao fim da experiência, não houve nenhuma mudança física nos olhos dos participantes. A melhoria na sua capacidade de leitura se deveu apenas a um aumento no ritmo de processamento de imagens no cérebro, aliado a uma maior sensibilidade dos neurônios.
Polat está desenvolvendo um software para ajudar o público a exercitar o cérebro e superar a vista cansada. A previsão é que o primeiro produto, o aplicativo GlassesOff, criado para smartphones, seja lançado nos próximos meses. Com o auxílio do programa, pessoas com presbiopia poderão se exercitar três vezes por semana, onde quer que estejam. E poderão abandonar os óculos.
— As pessoas vão até ler mais rápido, numa média de 12 palavras a mais por minuto. Isso significa que quem se exercitar poderá terminar de ler um texto de duas mil palavras, sem óculos, nove minutos antes do que era capaz anteriormente — profetiza o CEO da empresa, Nimrod Madar.
Jornal O Globo
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