Uma das áreas em que as pessoas mais se demitem do direito de pensar é a política
Rio - Está em cartaz, em alguns cinemas do Brasil, o filme ‘Hannah Arendt’.
Nascida em 1906, era uma filósofa alemã, judia, que se refugiou do nazismo nos
EUA. O filme a retrata no julgamento de Adolf Eichmann, em 1961, sobre o qual
Hannah escreveu cinco ensaios, reunidos no livro ‘Eichmann em Jerusalém — um
relato sobre a banalidade do mal’. Sua ótica sobre o réu nazista chocou muitos
leitores, em especial da comunidade judaica.
Hannah escreveu que esperava encontrar um homem monstruoso, responsável por
crimes monstruosos: o embarque de vítimas do nazismo em trens rumo à morte nos
campos de concentração, onde foram dizimados seis milhões de pessoas. No
entanto, ela se deparou com um ser humano medíocre, mero burocrata da máquina
genocida comandada por Hitler. A grande culpa de Eichmann, segundo ela, foi
demitir-se do direito de pensar.
Hannah pôs o dedo na ferida. Muitos de nós julgamos que são pessoas sem
coração, frias, os corruptos que embolsam recursos públicos, os carcereiros que
torturam presos, os policiais que espancam. É o que mostram filmes cujos
personagens são ‘do mal’.
Mas o mal é também cometido por pessoas que, no exercício de suas funções, se
demitem do direito de pensar, como fez Eichmann. São incapazes de juízo crítico
frente a seus superiores.
Uma das áreas em que as pessoas mais se demitem do direito de pensar é a
política. Em nome da ambição pelo poder, muitos abdicam do pensamento crítico,
fazem vista grossa à corrupção. Quem cala consente.
Dois exemplos da grandiosidade do bem temos, hoje, em Edward Snowden, jovem
que ousou denunciar a máquina de espionagem do governo dos EUA, capaz de violar
a privacidade de qualquer usuário da internet, e no soldado Bradley Manning, que
divulgou para o WikiLeaks 700 mil documentos sigilosos sobre a atuação criminosa
da Casa Branca nas guerras do Iraque e do Afeganistão.
Frei Betto é escritor, autor de ‘Calendário do Poder’
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