E as autoridades? Fizeram aquela cara que sempre fazem, abatidos, chocados. Tudo da boca pra fora, como sempre
Rio - Foi bonita a festa. Toda gente de toda parte na rua. Um clima de
esperança, de alegria e de paz espalhados por rostos de toda cor, de toda raça,
de toda região do país e de todo o mundo. Foi no tempo certo também. Não poderia
durar mais para não quebrar o encanto. Como toda gente, me encantei com
Francisco. Todo mundo falou sobre a simplicidade dele. É verdade, gostei disto.
Mas me encantei com tudo: com o sorriso, com a calma, com os gestos, com o jeito
se ser e com as palavras. Como toda gente, fiquei chocada com a cena do
engarrafamento na Presidente Vargas. Quem não ficou?
Quem poderia imaginar que até o Papa passaria pelo mesmo engarrafamento que
eu e vocês, pobres mortais, passamos no nosso cotidiano? A gente quer sempre o
melhor pra visita, ainda mais tão ilustre. Mas o carinho e a alegria da moçada
podem até ter ajudado o Francisco a esquecer esta primeira má impressão. E, cá
pra nós, a gente que vive aqui sabe que ele escapou de poucas e boas. Ainda bem
que decretaram os feriados. Sei que os comerciantes ficaram furiosos com os
prejuízos, mas a confusão seria muito maior do que foi. Imagine só, com toda a
população da cidade vivendo normalmente seu dia a dia, com o papamóvel
circulando, os peregrinos se espalhando e os sustos da cidade acontecendo...
Seria um inferno! E se os bueiros tivessem explodido? Imagine se as
retroescavadeiras dessem o seu “melhor”, furando as tubulações?
Se os canos e adutoras tivessem explodido naquela semana? Isto sem falar nas
manifestações... nas centenas de obras... nos esgotos que insistem em se
espalhar pelas calçadas, no lixo que se acumula nas ruas dos quatro cantos da
cidade. Aliás, neste quesito, os peregrinos deram uma bela lição nos Sugismundos
locais: a cidade ficou limpa apesar do número inacreditável de visitantes. E,
por falar neles... estavam em toda parte e alguns milhares deles ficaram depois
que Francisco partiu. Será que, em número menor, conseguiram lugar nos ônibus,
no metrô e nos trens com alguma tranquilidade? Este capítulo também foi de matar
de vergonha. Será que as concessionárias de transporte coletivo exibiram sua
incompetência durante a Jornada para provar pra gente que não gostam de fazer
diferença entre os locais e os que vêm de fora? E as autoridades?
Ficaram indignadas, como sempre ficam. Fizeram aquela cara que sempre fazem,
abatidos, chocados. Tudo da boca pra fora, como sempre. Como se a solução não
fosse problema deles. Ninguém foi culpado, nem demitido. A vida continua. Os
problemas também. A propósito: cadê o Amarildo?
Leda Nagle / O Dia
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