O governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, foi
visitar José Dirceu na prisão. Era uma visita clandestina, que acabou
descoberta. Agnelo confirmou o encontro com o chefe da ex-quadrilha do mensalão
(o STF determinou que o bando seja tratado doravante como coautoria, o que fica
mesmo mais elegante). Agnelo explicou que participava de uma inauguração ali
perto, e aproveitou para fazer uma inspeção na Papuda. Aí, esbarrou com
Dirceu.
Foi, portanto, um encontro casual, como outro qualquer. Se Agnelo estivesse
vagando pela Marquês de Sapucaí, poderia ter esbarrado na Sabrina Sato. Como o
rolezinho era no presídio da Papuda, esbarrou com José Dirceu. Cada macaco no
seu galho. A única coisa estranha nessa história é a reação do Brasil a ela.
A oposição reclamou, disse que a visita não programada afronta o sistema
penitenciário e as sanções por ele firmadas. A oposição é uma mãe. O que
incomodou os adversários do PT foi o “privilégio” de Dirceu, ao receber Agnelo
na cadeia. Com uma oposição dessas, dá para entender por que o PT vai para 16
anos no poder.
O governador do Distrito Federal visita clandestinamente na cadeia um
criminoso, que por acaso é do seu partido, que por acaso foi condenado por
corrupção não num desvio pessoal, mas no exercício da política partidária,
exatamente aquilo que o liga a seu visitante. Um governador filiado ao PT foi
visitar um ex-ministro também filiado ao PT, preso por roubar o contribuinte.
Sobre o que eles conversaram? Agnelo foi dar um pito em José Dirceu, dizendo-lhe
que nunca mais repita isso? E que, enquanto ele não se regenerar e cumprir toda
a pena, não é mais seu amigo?
Seria interessante saber. Porque, se não
foi isso, se não houve reprimenda, nem conflito, o que houve? Solidariedade?
Não, não é possível: um governador não pode ir à cadeia apoiar um político
condenado por corrupção. Seria um escândalo. Se também não foi isso, o que
aconteceu no tal encontro casual? Falaram sobre Neymar e Bruna? Cauã e Grazi?
Sobre o último esquete do Porta dos Fundos?
Depois, esse Brasil abobado e carnavalesco não sabe por que os companheiros
representantes do povo pintam e bordam. Agnelo, o dublê de governador e cortesão
de mensaleiro, deveria ser interrogado – pelo Congresso Nacional, pelo
Ministério Público ou pelo raio que o parta. Deve explicações pormenorizadas
sobre o seu encontro obscuro, em pleno exercício do mandato, com o parceiro
condenado. Se nada explicar, autorizará a suposição de que Dirceu continua seu
chefe político e que a ex-quadrilha é bem maior do que aquela julgada pelo
STF.
Um indivíduo citado pelo bando de Carlinhos Cachoeira como o “01 de
Brasília”, que permaneceu no cargo de governador imune aos graves indícios,
graças à implosão da CPI do Cachoeira e à alergia dos brasileiros a
investigações longas, deveria ser no mínimo receoso. Mas essa turma já não tem
receio de nada, porque depois de toda a pilhagem volta a se encher de votos, na
mais perfeita lavagem de reputação proporcionada pela maravilhosa democracia
brasileira. Fora um camicase, como Roberto Jefferson, ou um franco-atirador,
como Joaquim Barbosa, o terreno está sempre limpo – lavou, está novo.
O Supremo diz que os mensaleiros não formaram uma quadrilha, o governador
visita o chefe na cadeia, e o Brasil chupa o dedo. Tudo certo. Se os
companheiros formassem uma quadrilha, não bastaria operar dentro do mesmo
partido, com o mesmo despachante, com os mesmos prepostos estatais (um deles
está na Itália, esperando uma visita casual do companheiro Agnelo). Não bastaria
montarem juntos um mesmo esquema de sucção de dinheiro público para o caixa
partidário, com o mesmo tesoureiro coordenando tudo, as mesmas salas e as mesmas
secretárias. Só configuraria formação de quadrilha se todos eles usassem aquela
mesma máscara dos Irmãos Metralha – e isso, o ministro Luiz Roberto Barroso
deixou claro, com todo o seu lirismo, não aconteceu.
Enquanto Agnelo esclarecia que esbarrou por acaso com Dirceu no xadrez, a
ex-ministra Gleisi Hoffmann esclarecia que quem salvou o Plano Real foi o PT.
Viva a verdade bolivariana, que o Brasil consagrou.
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