O novo relatório sobre mudanças climáticas da ONU mostra que o planeta está ficando cada vez mais quente. Saiba as consequências disso para o Brasil
Ana Carolina Nunes (acarol@istoe.com.br)
O novo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da
ONU, mais conhecido por sua sigla em inglês – IPCC –, traz notícias pouco
animadoras sobre o futuro do planeta. O documento, divulgado na segunda-feira 31
em Yokohama, no Japão, não só confirma que o aquecimento global está impactando
cada vez mais a vida dos seres humanos na Terra como também faz previsões
alarmantes sobre o futuro. Para os cientistas que redigiram a versão final do 5º
Relatório de Avaliação do IPCC, o aumento da temperatura global irá produzir
fome, ondas migratórias e conflitos por todo o mundo nas décadas seguintes, se
nada for feito para reduzir as emissões de carbono, o principal causador do
aquecimento. “Ninguém neste planeta ficará imune aos impactos das mudanças
climáticas”, afirmou Rajendra Pachauri, presidente do IPCC.
DESERTO
O
Nordeste do País é uma das regiões afetadas pelo aquecimento global
Apesar de os impactos serem globais, eles não serão homogêneos, ao menos na
opinião dos pesquisadores que produziram o documento. A tendência é de que as
regiões mais pobres do planeta sejam as mais afetadas, em especial as áreas
tropicais de baixa latitude. No Brasil isso significa que o Nordeste e a
Amazônia, áreas que concentram uma parcela significativa das populações mais
pobres do País, sejam os mais impactados. No mundo, a expectativa é de que
países do centro da África e de parte do Sudeste Asiático sejam os mais afetados
pelos reflexos do aquecimento, por conta de secas mais prolongadas ou em razão
de estações de chuvas mais concentradas. “Na mudança climática, aqueles que
criam o problema nem sempre são os que sentem os seus impactos”, diz José
Marengo, cientista do Instituto Nacional de Estudos Espaciais (Inpe) e
representante do Brasil na elaboração do relatório.
Marengo refere-se ao fato de as regiões mais afetadas pelo aquecimento não
serem as que mais produzem CO2, como no Nordeste brasileiro, por exemplo. Mesmo
com o processo de interiorização da economia brasileira, a região ainda é
essencialmente rural e com um número elevado de pequenos agricultores e
pecuaristas que produzem primordialmente para consumo próprio e vendem o
excedente. A produção de CO2 no Nordeste é infinitamente inferior àquela
registrada em regiões industriais da China ou em grandes cidades dos Estados
Unidos, por exemplo, que não sofrerão os impactos na mesma intensidade.
POLUIÇÃO
Redução
na emissão de gases de efeito estufa é a única
maneira eficaz de mitigar os
impactos do aquecimento global
No Nordeste brasileiro o temor é de que a crise hídrica, que afeta a região
há séculos, seja ainda mais acentuada. Hoje o sertão nordestino vive uma das
piores secas de sua história e a ampliação do quadro de falta de chuvas poderia
tornar a área que abriga mais de 15 milhões de pessoas em condições muito
difíceis de ser habitada. O temor é de que o semi-deserto do sertão se
transforme em um grande deserto. “Esse é um problema com vários componentes, não
só a chuva, vale destacar”, diz Marenco. “A má utilização do solo e a
consequente redução na capacidade de produção de alimentos para pessoas e
animais podem vir a gerar uma nova migração em massa.”
Distante alguns milhares de quilômetros, a Amazônia é outro ecossistema
brasileiro extremamente sensível às variações climáticas. Mesmo com a cheia
recorde do rio Madeira, que isola o Acre e transformou parte do centro antigo de
Porto Velho no leito do rio, a tendência, dizem os cientistas, é de que o ciclo
de chuvas na região seja afetado pelo desmatamento que devasta a floresta.
Poucas regiões do planeta registram uma correlação tão clara e tão imediata
entre o clima e a vegetação quanto a Amazônia. E se faltar chuva no Norte do
País a tendência é de que haja também falta de chuva nas regiões Sul e Sudeste,
que dependem diretamente da umidade produzida na Região Amazônica para regular
os períodos de chuva.
CHEIAS
Chuvas cada vez mais fortes e concentradas são um dos efeitos
apontados
pelos cientistas no novo relatório do IPCC divulgado no
Japão
O relatório do IPCC ressalta a certeza cada vez maior nas mudanças climáticas
e na participação do homem nesse processo, mas não tem como definir, ao menos
agora, com precisão como e quando os efeitos mais severos serão sentidos. Ele
faz previsões para diferentes cenários, porém indica que as consequências são
mais graves quanto maiores os níveis de emissão de gases-estufa. Por isso o
documento reforça a urgência das ações de adaptação e mitigação.
O problema das ações de adaptação é que elas têm uma receita bastante local e
impactam de forma diferente cada comunidade: depende do quanto essa localidade é
vulnerável e de suas condições geográficas, econômicas, sociais e políticas.
“Gestão de risco é o termo-chave quando se fala em adaptação”, diz Carolina
Dubeux, economista do Coppe/UFRJ, que também integra a equipe de elaboração do
relatório.
O IPCC mostra diversos valores para o custo de adaptação das
sociedades ao novo cenário climático, que podem atingir US$ 100 bilhões ao ano.
“Ainda há incertezas muito grandes em relação a esses custos, vai depender do
cenário, do clima e de uma série de avaliações, até porque a mudança climática é
um fenômeno dinâmico”, explica Carolina.
DESMATAMENTO
Na
Amazônia, o clima está diretamente ligado ao meio
ambiente e menos árvores
significam menos chuvas
Fotos: Raul Spinassé/Ag. A
Tarde/Folhapress, PAULO PINTO, Marcio James/Secom; Corbis
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