Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.
Mensagem de veto Altera a Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o A Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B:
"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Art. stica e de Literatura e História Brasileiras.
§ 3o (VETADO)"
"Art. 79-A. (VETADO)"
"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’."
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182o da Independência e 115o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
OS GRANDES MITOS AFRO - AMERICANOSOs escravos que vieram da África mantinham formas imateriais de resistir à opressão, das quais surgiram o Candomblé e a Umbanda.
Por PATRÍCIA RICARDO DE SOUZA, doutora em Sociologia pela Universidade de Sao Paulo
É comum usarmos a palavra mito para expressar algo oposto à verdade, irreal ou inexistente. Isso acontece na sociedade ocidental por causa da forte influência da tradição judaico-cristã, em que o mito aparece relacionado a tudo que nao pode existir na realidade - somente o que estava nos livros bíbliocos era considerado verdadeiro. Mitos, muito pelo contrário, é verdade profunda, é expressão cultural das mais importantes e complexas e, como tal, é real. O que nao implica dizer que todos os deuses de fato existem ou que as histórias mitológicas realmente aconteceram. As crenças são reais para aqueles que partilham delas.
Por PATRÍCIA RICARDO DE SOUZA, doutora em Sociologia pela Universidade de Sao Paulo
É comum usarmos a palavra mito para expressar algo oposto à verdade, irreal ou inexistente. Isso acontece na sociedade ocidental por causa da forte influência da tradição judaico-cristã, em que o mito aparece relacionado a tudo que nao pode existir na realidade - somente o que estava nos livros bíbliocos era considerado verdadeiro. Mitos, muito pelo contrário, é verdade profunda, é expressão cultural das mais importantes e complexas e, como tal, é real. O que nao implica dizer que todos os deuses de fato existem ou que as histórias mitológicas realmente aconteceram. As crenças são reais para aqueles que partilham delas.
Algumas mitologias são muito conhecidas, como a grega e romana. Outras são menos conhecidas, até pela dificuldade em se ter contato com elas, como é o caso das complexas mitologias dos povos indígenas da América do Sul. Sabemos que o processo de escravização dos africanos foi extremamente violento e letal para grande parte da população trazida à América. Entretanto, junto à violência caminhou igualmente a resistência, em suas mais diversas maneiras e estratégias. A memória e a criatividade foram sempre as parceiras daqueles que viveram o cativeiro. Nesse sentido, a mitologia, como patrimônio cultural, foi das poucas coisas que os escravizados puderam carregar consigo na dura diáspora para a América.
Nesse baú de coisas imateriais trazidas pelos povos africanos estáo os mitos que ainda sobrevivem entre nós. A grande maioria deles se refere aos deuses cultuados nas religiôes afro - americanas. Não se pode perder de vista que essas religiôes, embora tenham logrado preservar elementos verdadeiramente africanos, tiveram origem no Brasil e, portanto, são também frutos do doloroso processo da escravidão.
Essa aproximação com a mitologia afro-americana é importante porque diz respeito às nossas origens, desvenda sentidos profundos de práticas populares, aponta para "dentro", aprofunda a própria identidade.
Religião e resistência africana
São diversas as religiões afro-americanas, e todas elas no Brasil têm em comum o fato de sofrerem preconceito desde sempre. A raiz disso é a mesma do preconceito racial, uma vez que as religiões étnicas surgiram como uma expressão vigorosa da resistência no Brasil e em outros lugares da América, como em Cuba e no Haiti.
Vai longe o tempo em que essas eram religiões exclusivamente de negros. Desde a década de 1960, a expansão dessas rumo ao Sudeste do País promoveu a inclusão de brancos e orientais, e a partir daí essas se configuram como religiões universais. Hoje o Brasil é um país em que a liberdade de culto é um direito constitucional, o que não garante que essas religiões não sejam perseguidas, se não mais pelo próprio Estado, por outras instâncias e mesmo outras religiões.
Umbanda x Candomblé
São duas as maiores religiões afro-brasileiras. A Umbanda é tida como uma religião brasileira por excelência, porque surgiu no Brasil e hoje está em outros países. O Candomblé é uma religião de matriz africana, mas igualmente brasileira, pois com suas especificidades se configurou aqui. Ambas têm em comum o culto aos ori~xás, divindades da natureza. Na Umbanda, o culto a essas divindades não é o mais importante; já no Candomblé, é central. É a esses deuses que a mitologia trazida pelos escravos também criada e recriada aqui se refere.
No Candomblé, os mitos ocupam papel fundamental. São eles que formam e informam o rito, que contam como são os deuses e, por consequência, como são os humanos, já que nessa religião se acredita que todos descendem dos deuses, herdando deles suas características. Os iorubá - povo africano que deu origem ao Candomblé - acreditam que tudo o que se passa nessa vida é uma repetição de coisas que aconteceram aos seus ancestrais, e que, ao olhar o passado por meio dos mitos, é possível saber o que está se repetindo agora e encontrar as soluções para os problemas atuais.
Obviamente, os fiéis do Candomblé têm outra concepção do tempo, mas mesmo assim se pode buscar os mitos para saber como lidar com as questões que os afligem e saber mais sobre os tão queridos Orixás ( deuses ).
Nos terriros, encarregados de conhecer, conservar e transmitir a mitologia são os mais velhos. Toda a transmissão da mitologia afro - americana originalmente era exclusivamente feita pela tradição oral. Nos terreiros de Candomblé os mitos são contados, recontados e assim aprendidos e passados adiante. Entretanto, há muito esses mitos têm sidos pesquisados, catalogados e registrados e, assim podem ser acessados por meio da leitura. Há uma ampla literatura por meio da qual quem quiser pode travar contato com essa expressiva mitologia que nos convida e desafia a ampliar horizontes.
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