segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Crônica do Dia - Amigos, amigos, Facebook à parte - Ruth de Aquino



"Fingir orgasmos... quem nunca?” O post-alfinetada é da publicitária Mara Rocha, de 23 anos, no Facebook. Tinha endereço certo: seu ex-marido, Carlos Cavalcanti, de 43 anos. O “círculo de amizades” dos dois pegou fogo. Carlos cobrou explicações de Mara. Ela foi além: “Não citei nomes, mas, se a carapuça serviu, fique à vontade”. E deu a estocada maldosa: “O infeliz, em vez de ficar tentando satisfazer seu ego, deveria é aprender a satisfazer uma mulher na cama”.
O “infeliz” processou Mara, alegando que sua honra foi ferida pelos comentários da ex-mulher no Facebook. O juiz Antonio Ribeiro Rocha, do 2º Juizado Cível de Vitória, aceitou a denúncia por difamação e calúnia. Condenou Mara a indenizar o ex-marido em dez salários mínimos, de acordo com a história divulgada no site jurídico www.jusbrasil.com.br e na coluna de Joaquim Ferreira dos Santos, do jornal O Globo. Mara não se calou. Incansável no Facebook, disse: “Ele (Carlos) é tão consciente de sua incapacidade que só me processou por injúria e difamação, porque calúnia ele sabe que não é”.

Os nomes dessa história são todos fictícios – e o processo também. “Mara” e “Carlos” são criações do professor de Geografia Fábio Flores, 39 anos, colaborador de um site de humor. Ele escreve uma coluna onde tudo é mentira, mas tem um fundo de verdade. Fábio me disse ter-se inspirado em casos constrangedores de lavação de roupa suja no Facebook para dar vida à ex-mulher insatisfeita e ao ex-marido vingativo, figurinhas batidas nas redes sociais. Dez salários mínimos seriam suficientes para lavar a honra de “Carlos” perante seus amigos virtuais?
Esse tipo de episódio começa a ficar frequente nas redes sociais. Facebook, Twitter e outras redes têm benefícios imensos para a livre expressão de anônimos. Mas começam a virar confessionário. Há de tudo.

Há os depoimentos compungidos de amigos ou parentes que revelam estar falidos, sozinhos ou doentes, quase implorando uma atenção. Há uma turma cada vez maior que publica fotos de filhos, cachorros, gatos e netos para uma legião de gente que não está nem aí. Há quem aceite qualquer “amigo” em nome de uma popularidade fictícia. Há os que correm para o Facebook no minuto seguinte de levar um “pé na bunda” para mudar o status de relacionamento – e se declarar disponível. Há os militantes religiosos, políticos e esportivos, sempre torcendo para seu deus, seu partido e seu time. Há, como sempre, os malas invasivos, para quem você mesmo abriu as portas de sua linha do tempo, de sua página e até de sua casa.

A reportagem de capa desta edição de ÉPOCA destrincha mitos e verdades sobre o Facebook: 54 milhões de brasileiros estão lá, e muitos admitem ser dependentes dessa relação. Ficariam infelizes se perdessem essa troca, superficial ou profunda. Muitos são tão viciados que, antes de tomar café da manhã, dão “bom-dia” no “Face”, dizem que tiveram insônia ou dormiram bem, revelam o que sonharam, o que estão comendo, o que farão à noite.
E há os destrambelhados que perdem o pudor nas redes, fazendo das tripas coração. Isso é humano. É mais típico do humano brasileiro que do humano sueco. Duro é ser coagido a tomar uma posição nos barracos sentimentais e políticos. Quem acompanha o Facebook já percebeu broncas públicas e até amizades desfeitas, porque um se excede e ofende o amigo comum. Quantas saias justas de amigos que não compartilham a mesma ideologia. Por essas e por outras, aumenta o movimento dos que abandonam o “Face” e se dizem aliviados.

Já fui repreendida por amigos e amigas de verdade, porque não curti, nem cutuquei, nem compartilhei algo que foi postado – como se eu tivesse obrigação de ter visto aquilo e estar plugada dia e noite. Não adianta dizer que raramente entro no Facebook e uso a rede para mensagens particulares, de um para um. É uma heresia confessar isso hoje. Como se aplicasse na testa um adesivo: sou antissocial e arrogante, não me importo com meus amigos. Quando, na verdade, sinto o oposto.

O ator George Clooney, solteirão charmoso que adora um armário, afirmou preferir um exame de próstata em público a ter um perfil no Facebook. Não vou a esse extremo... mas está claro que a vulgarização do uso das redes sociais afugenta cada vez mais gente. A falta de regras de privacidade é outro temor real. O Facebook coleta nome de usuário, senha, contatos e localização. Cada vez que você visita uma página na web com o botão “curtir”, a rede social é avisada. Qualquer um acessa seus dados a partir de visitas a seu perfil por pessoas de sua rede de contatos.

Digamos que é isso mesmo que você deseja. Que todos – até mesmo desconhecidos – conheçam seus hábitos, seus sonhos, suas frustrações, suas conquistas, suas indignações, seus problemas, sua família. Quanto mais gente, melhor. Esse mundo foi feito para você. É preciso, porém, estar consciente das consequências, divertidas e nefastas, da festança virtual com penetras.

Esta coluna foi atualizada às 19h15 de 25 de setembro.

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