Estava eu dias atrás numa praia, quando vi uma criança brincando com os pais com uma bola de futebol americano. Achei curioso, primeiro porque chamo de bola o que nem bola exatamente é, posto que bola, segundo dicionários, é “objeto maciço ou oco, redondo em toda a volta; esfera”, e a referida “bola” tem a forma de um ovo pontudo. E depois, porque esportes antes estranhos ao universo do brasileiro começam a ganhar força entre nós. Além do citado futebol americano, o rúgbi e o beisebol também crescem, atraindo cada vez mais jovens para a sua prática. É tão notável a força desses esportes hoje que as seleções masculina e feminina de rúgbi já angariam torcedores fiéis nos quatro cantos do País, coisa impensável anos atrás.
Apesar de apaixonado por futebol, não vejo isso com maus olhos, absolutamente. Acho saudável a prática de qualquer esporte, seja ele bocha, críquete ou cuspe a distância. Tudo que diverte e exercita o corpo e a alma é por mim bem-visto. Mas não deixa de ser interessante notar a popularidade crescente desses esportes em nosso meio. Teria a ver com um certo descrédito do futebol hoje, com uma desilusão do torcedor com seus atletas milionários e pouco empenhados?
Indagações filosóficas à parte, essa visão da praia me fez lembrar de jogos e “esportes” da minha infância, alguns toscos e primitivos, mas profundamente divertidos, típicos de um tempo pré-games, em que a televisão ainda não era onipresente e a rua era um espaço possível, mesmo que já tivesse – pois sempre teve – seus perigos. Como um memorialista do inútil, um Pedro Nava com seu baú de ossos lúdicos, me peguei a relembrar jogos e patacoadas da infância, alguns dos quais ainda sobrevivem nas cidades e vilas mais remotas e nas atividades recreativas de algumas (raras) escolas.
Jogos como a queimada – ou queimado –, em que dois times separados por um risco no meio do “campo” tentavam atacar os adversários com boladas quase impossíveis de agarrar. Se o adversário agarrasse a bola ou se ela nem o tocasse, teria então o direito de arremessar a mesma na direção do oponente. Se a bola o acertasse, porém, ele passava a ser uma espécie de refém do outro time. Ganhava quem cravasse bolas em todo o time adversário, até não sobrar ninguém do outro lado. Outro jogo similar era o pique-bandeira ou rouba-bandeira ou bandeirinha, com dois times separados igualmente por um risco, cuja meta era roubar uma bandeira (que podia ser um galho de árvore ou lata ou coisa que o valha), feito que necessitava de ginga e ágeis dribles de corpo, uma vez que até chegar à tal bandeira o sujeito era implacavelmente perseguido e, se tocado, virava prisioneiro, ficando paralisado até que algum companheiro o libertasse.
Havia também alguns jogos menos, digamos, “esportivos”. Lembro de um jogo com tampinhas de refrigerante ou cerveja e carteiras de cigarro, jogo improvável nos dias politicamente corretos de hoje, em que o fumante foi quase alçado à condição de doente contagioso. Voltando ao jogo, as carteiras dobradas viravam dinheiro – cada marca da época tinha um determinado valor, correspondente ao valor do cigarro. E eram muitas – Arizona, Clássicos, Gaivota, Minister, Continental, Hollywood, Charm, Hilton, Pall Mall etc. etc. etc. Desenhava-se um quadro no chão com giz, e o jogador pontuava de acordo com as tacadas/petelecos na tampinha. Parece tolo descrito assim, mas era um jogo dinâmico e cheio de emoção.
Havia também o “chucho”, o jogo de “borrocas” com bolas de gude, o “quatro cantos”, o “galinha gorda” e o “estátua”. Mas esses ficam pra outra, pois agora meu filho me chama pra jogar o Fifa 12 no PS3.
Zeca Baleiro - REvista Isto É
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