O biólogo Felipe Bandoni de Oliveira, 33 anos, integra um grupo raríssimo. Ele está entre o 0,08% dos professores do ensino fundamental brasileiro que enverniza o currículo com um título de doutor. Nascido no interior de São Paulo, Felipe especializou-se em genética, dedicando-se à investigação sobre a evolução do crânio dos macacos – pesquisa que o fez ficar imerso nos museus de história natural da Europa durante um ano. Voltou ao Brasil sabendo exatamente o que queria: retornar à sala de aula como professor de ciências, carreira que iniciou aos 23 anos inspirado na trajetória dos pais, um físico e uma psicóloga também docentes. Hoje à frente de classes noturnas no Colégio Santa Cruz, em São Paulo, ele lida com a complexidade de apresentar conceitos científicos a jovens e adultos de baixa renda nos anos finais do ensino fundamental. Não nivela a turma por baixo. Ao contrário: Felipe decidiu ensinar ali astronomia. Falou de Galileu, quebrou crenças levando à escola artigos de publicações respeitadas, projetou no teto da sala um céu estrelado em que se vê o movimento dos astros e proporcionou aos alunos uma experiência única: observar a Lua com um telescópio. “Atingi o meu objetivo de despertar o gosto pela ciência”, festeja.
Por esse trabalho, na semana passada ele recebeu o prêmio Educador Nota 10, concedido pela Fundação Victor Civita a dez professores do ensino básico e a um diretor de escola. Felipe foi o destaque do grupo. Suas lições reforçam a ideia de que não é preciso nada de muito mirabolante para dar uma boa aula, só o básico: que o professor domine o assunto e consiga traduzi-lo com o mesmo entusiasmo que espera ver em seus alunos. Fazer isso numa turma que volta a estudar na idade adulta, com tantas lacunas acumuladas, reforça seu mérito. No Brasil, há 5 milhões de jovens e adultos matriculados na escola. Seu retorno à sala de aula é bem-vindo num país onde quase um terço da população acima de 15 anos não consegue depreender o significado de um texto simples. Entre os jovens, metade não conclui o ensino médio. “Com mais estudo e treinamento profissionalizante, eles podem ajudar a resolver o apagão de mão de obra brasileiro”, diz o especialista Bruno Novelli, da ONG AlfaSol. O exemplo do biólogo Felipe Bandoni aponta o caminho.
Revista Veja
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