Com desempenho acadêmico superior ao da maioria das escolas públicas brasileiras, instituições administradas pelo Exército unem professores capacitados, boa infraestrutura e disciplina, mas só para uma elite
Paula Rocha e Wilson Aquino
Sexta-feira, dia de formatura geral no Colégio Militar do Rio de Janeiro. Aproveitando a presença dos cerca de dois mil alunos e alunas devidamente alinhados como soldados na praça Thomaz Coelho, o subcomandante do colégio, coronel Muniz, toma o microfone e fala grosso: “A brincadeira de Nescau está proibida.” O militar faz referência a um tradicional e violento trote aplicado pelos alunos veteranos sobre os novatos – um grupo se aproxima da vítima cantando uma divertida música infantil e, de repente, cai de tapas e murros sobre a cabeça e costas do alvo. A bronca geral do subcomandante tem como objetivo restabelecer a disciplina, um dos principais pilares das escolas militares brasileiras.
Com uma filosofia de ensino baseada na doutrina do Exército brasileiro, o Colégio Militar do Rio foi o décimo melhor colocado do Estado, entre as escolas do sexto ao nono anos, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2011, do Ministério da Educação. A escola obteve média de 6,4, abaixo da meta estipulada para o colégio, de 6,6, porém bem acima da média nacional, que bateu em 4,1. Dentre as 30 escolas de sexto a nono ano com as melhores notas no Ideb 2011, dez são colégios militares. Essas instituições são uma elite do ensino público no País – elas não cobram mensalidade, mas uma taxa simbólica de quem pode pagar – destinada preferencialmente aos filhos de servidores do Exército. A realidade desses colégios em nada lembra as escolas sem estrutura e com professores mal remunerados a que a maioria dos estudantes brasileiros está submetida. “O bom desempenho é resultado da união de planejamento pedagógico, boa estrutura de apoio ao processo de ensino e aprendizagem, corpo docente capacitado e disciplina”, acredita o coronel Mansur, diretor do Colégio Militar de Salvador. Em sexto lugar na classificação nacional do Ideb, a instituição baiana possui 821 alunos, 98% filhos de militares.
Do ponto de vista estrutural, esses colégios estão, de fato, bem acima das demais escolas da rede de ensino público do País. Em comum, as 12 instituições militares possuem instalações variadas e em ótimo estado de conservação, que incluem ginásios, piscinas semiolímpicas, quadras de tênis, laboratórios de química, física, biologia e informática, além de outros espaços de convivência. Toda essa infraestrutura permite que os alunos permaneçam na escola fora do horário regular, realizando atividades extracurriculares, outro diferencial. “Nós estimulamos a participação dos alunos em atividades que vão além da sala de aula”, diz o coronel Heimo, diretor do Colégio Militar de Brasília, que recebeu nota 6,7 no Ideb 2011, a melhor classificação entre as escolas públicas do Distrito Federal. “Nossos alunos podem optar por realizar atividades como equitação, coral, dança, teatro e até robótica.” Atualmente, três mil estudantes estão matriculados no Colégio Militar de Brasília. Destes, apenas 550 são filhos de civis.
Outro fator considerado decisivo para o bom desempenho acadêmico dos alunos é a capacitação do corpo docente. No Colégio Militar de Salvador, por exemplo, 15% dos professores são doutores, enquanto 25% possuem mestrado. “E mais de 90% têm ao menos um tipo de especialização”, diz o coronel Mansur. “Além disso, trabalhamos em regime de dedicação exclusiva, e a carga horária dentro da sala de aula não é tão grande, o que nos possibilita preparar melhor o conteúdo que será apresentado”, diz a capitã Risalva Bernardino, professora de literatura e língua portuguesa do Colégio Militar de Brasília. A remuneração dos professores também é atrativa. Os docentes militares têm vencimentos correspondentes aos respectivos postos. Já os civis recebem de acordo com a progressão funcional e os títulos que possuem. Os salários variam entre R$ 4 mil e R$ 5 mil, valores que podem ser equiparados à remuneração de professores dos institutos federais e de alguns colégios particulares. É bem acima da média salarial dos docentes de ensino fundamental da rede pública, de R$ 1,8 mil.
A principal diferença entre os colégios militares e as escolas civis, no entanto, é a questão da disciplina. As regras dentro dessas instituições são rígidas. Apesar de a aula começar às 7h, o aluno que atravessa o portão de entrada às 6h30 é considerado atrasado. Se o uniforme não estiver impecável (há funcionários designados exclusivamente para observar isso), pode não ter acesso à sala de aula. Fica de castigo no interior do colégio até o fim do turno. Há normas também sobre a aparência. O corte de cabelo masculino é feito com máquina 2, e refeito de 15 em 15 dias. Não é permitido barba, bigode ou cavanhaque, brinco, piercing nem óculos escuros. Guarda-chuva, somente na cor preta. Os cabelos femininos podem ficar soltos, contanto que não ultrapassem a altura da gola do uniforme. Se médio ou longo, deve ser preso. Mechas coloridas são proibidas. As unhas devem ser incolores ou pintadas apenas nas cores branca e rosa-clara. Ao cruzarem com um professor, diretor ou monitor, os alunos devem prestar continência. Namorar, beijar, andar abraçado ou de mãos dadas é considerado transgressão disciplinar e os pais são chamados.
A principal diferença entre os colégios militares e as escolas civis, no entanto, é a questão da disciplina. As regras dentro dessas instituições são rígidas. Apesar de a aula começar às 7h, o aluno que atravessa o portão de entrada às 6h30 é considerado atrasado. Se o uniforme não estiver impecável (há funcionários designados exclusivamente para observar isso), pode não ter acesso à sala de aula. Fica de castigo no interior do colégio até o fim do turno. Há normas também sobre a aparência. O corte de cabelo masculino é feito com máquina 2, e refeito de 15 em 15 dias. Não é permitido barba, bigode ou cavanhaque, brinco, piercing nem óculos escuros. Guarda-chuva, somente na cor preta. Os cabelos femininos podem ficar soltos, contanto que não ultrapassem a altura da gola do uniforme. Se médio ou longo, deve ser preso. Mechas coloridas são proibidas. As unhas devem ser incolores ou pintadas apenas nas cores branca e rosa-clara. Ao cruzarem com um professor, diretor ou monitor, os alunos devem prestar continência. Namorar, beijar, andar abraçado ou de mãos dadas é considerado transgressão disciplinar e os pais são chamados.
Com tantas normas, alguns alunos reclamam. “É muito rigor e sermão. Aqui é bem diferente dos outros colégios. Eu esperava que fosse mais fácil, só estando aqui dentro para ver”, desabafa um aluno do sexto ano do Colégio Militar do Rio de Janeiro, que não quis se identificar. Outros estudantes, porém, afirmam gostar dos valores aprendidos. “A disciplina é necessária para o aprendizado”, diz Cláudia Mattke Ferreira, 18 anos, aluna do terceiro ano do ensino médio do Colégio Militar de Salvador e filha de civis. Opinião compartilhada pela também estudante Hortência Oliveira Brito, 15 anos, aluna do primeiro ano do ensino médio do Colégio Militar de Brasília. “Tem esse aspecto de rigidez, sim, mas ao mesmo tempo o ensino tem muita qualidade.”
Na opinião do especialista Luiz Prazeres, consultor em processos de avaliação educacional e professor do Centro Pedagógico da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a disciplina dos colégios militares faz diferença, mas não é o único fator determinante para o sucesso dos estudantes egressos desse sistema de ensino. “Os alunos desses colégios representam uma elite intelectual. A prova para admissão nessas instituições é muito rigorosa, e acaba selecionando apenas os melhores”, diz Prazeres. “São escolas públicas, mas não inclusivas. São estabelecimentos de ensino fechados, acessíveis apenas a privilegiados”, completa.
Na opinião do especialista Luiz Prazeres, consultor em processos de avaliação educacional e professor do Centro Pedagógico da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a disciplina dos colégios militares faz diferença, mas não é o único fator determinante para o sucesso dos estudantes egressos desse sistema de ensino. “Os alunos desses colégios representam uma elite intelectual. A prova para admissão nessas instituições é muito rigorosa, e acaba selecionando apenas os melhores”, diz Prazeres. “São escolas públicas, mas não inclusivas. São estabelecimentos de ensino fechados, acessíveis apenas a privilegiados”, completa.
Fotos: Orestes Locatel e Adriano Machado/ag. istoé
Penso que a disciplina seja um ponto muito importante a ser resgatado pelas escolas. Toda instituição tem regras que devem ser respeitadas, mas a escola tornou-se permissiva demais e caiu em descrédito.
ResponderExcluirProfessores bem preparados e bem remunerados fazem muita diferença, além da dedicação exclusiva.
E a infraestrutura, as escolas públicas estão muito aquém das escolas militares, chega a ser vergonhoso.
Um padrão considerado necessário para o nível requerido é o teste de nível para ingresso. Só aí já se sabe que entram os que possuem potencial cognitivo. Certamente, as escolas públicas com todas as circunstâncias que estão expostas, dificilmente conseguem atingir os níveis das militares.
Marlene Morceli