No começo de 2010 a professora paulistana Alba Paulino, 43 anos, começou a estranhar o comportamento do filho, Enzo, então com 11 anos de idade. Matriculado na escola onde ela trabalhava, o colégio católico Nossa Senhora de Lourdes, na Água Rasa, zona leste de São Paulo, ela percebeu que o filho aparecia com cada vez mais frequência em seu escritório, localizado num prédio anexo ao do colégio. Queixava-se de dores de cabeça, enjoos e indisposições intestinais. Muitas vezes o garoto pedia para que o tio ou a avó o buscassem na escola e o levassem para casa. No sobrado da família, no mesmo bairro, Enzo não melhorava muito. Deixava as refeições pela metade e, aos poucos, as noites de sono tranquilo tornaram-se turbulentas. Na hora de dormir, Enzo chorava copiosamente. Quando finalmente adormecia, já era quase hora de acordar para voltar ao colégio. E era só falar de escola que o garoto desabava de novo. “Alguma coisa estava muito errada”, diz Alba.
Com o tempo, Enzo contou que vinha sendo agredido verbal e fisicamente, de forma cada vez mais frequente e grave, pelos colegas de escola desde os 8 anos de idade, quando optou por fazer balé em uma academia de dança no bairro do Tatuapé, também na zona leste. Ele era uma vítima clássica do bullying, nome dado ao fenômeno que engloba xingamentos, ofensas, constrangimentos, humilhações ou agressões físicas praticadas por um grupo contra alguém. No caso de Enzo havia um agravante. Nos últimos três anos em que ele esteve no Nossa Senhora de Lourdes, ele diz ter buscado ajuda de professoras e até cobrado ação por parte da coordenação da escola para que os ataques parassem. A resposta que recebia de quem devia tê-lo protegido era sempre a mesma: “São brincadeiras normais de menino e, se você não é gay, não tem por que se preocupar.” Os ataques não só continuaram como pioraram.
“A zoação acontecia já de manhã, antes de as aulas começarem”, lembra ele, que diz ter sido chamado inúmeras vezes de “gay”, “viado”, “bicha” e “boiola”, aos berros, no portão do colégio. Durante o dia, Enzo relata que recebia empurrões, tapas nas costas, era arremessado contra carteiras e frequentemente tinha o material escolar jogado no chão. Certa vez, ele conta, um de seus agressores derramou uma lata de refrigerante em sua mochila. Em outubro de 2010, três garotos passaram a bloquear o acesso de Enzo ao banheiro masculino. “Aqui você não entra, use o de mulher”, ele ouviu. Em dias assim, o garoto passava o turno escolar sem ir ao banheiro.
Com o tempo, Enzo contou que vinha sendo agredido verbal e fisicamente, de forma cada vez mais frequente e grave, pelos colegas de escola desde os 8 anos de idade, quando optou por fazer balé em uma academia de dança no bairro do Tatuapé, também na zona leste. Ele era uma vítima clássica do bullying, nome dado ao fenômeno que engloba xingamentos, ofensas, constrangimentos, humilhações ou agressões físicas praticadas por um grupo contra alguém. No caso de Enzo havia um agravante. Nos últimos três anos em que ele esteve no Nossa Senhora de Lourdes, ele diz ter buscado ajuda de professoras e até cobrado ação por parte da coordenação da escola para que os ataques parassem. A resposta que recebia de quem devia tê-lo protegido era sempre a mesma: “São brincadeiras normais de menino e, se você não é gay, não tem por que se preocupar.” Os ataques não só continuaram como pioraram.
“A zoação acontecia já de manhã, antes de as aulas começarem”, lembra ele, que diz ter sido chamado inúmeras vezes de “gay”, “viado”, “bicha” e “boiola”, aos berros, no portão do colégio. Durante o dia, Enzo relata que recebia empurrões, tapas nas costas, era arremessado contra carteiras e frequentemente tinha o material escolar jogado no chão. Certa vez, ele conta, um de seus agressores derramou uma lata de refrigerante em sua mochila. Em outubro de 2010, três garotos passaram a bloquear o acesso de Enzo ao banheiro masculino. “Aqui você não entra, use o de mulher”, ele ouviu. Em dias assim, o garoto passava o turno escolar sem ir ao banheiro.
Foi a gota d’água para a família. Vendo Enzo abandonado por boa parte dos poucos amigos que fez na infância – ele estava no colégio desde os 2 anos –, com a autoestima em frangalhos, sem apoio da escola e a ponto de repetir o sétimo ano, eles resolveram intervir. Era final de 2010. “Sabia que eram grandes as chances de eu ser mandada embora caso eu pressionasse a direção do colégio ou resolvesse tirar meu filho de lá”, diz Alba. “Mas ele estava indo para o colégio para apanhar.”
Hoje, a decisão de Alba, de finalmente confrontar a escola, pode parecer óbvia, talvez até tardia para quem está de fora. Para ela não foi. Ela não só trabalhou no colégio por 14 anos como professora, mas também foi aluna do Nossa Senhora de Lourdes desde a infância. Confiava na instituição e também dependia dela. Divorciada, ela se desdobrava para dar conta das despesas que tinha com o único filho e a casa. Um irmão se dispôs a ajudá-la caso ela de fato perdesse o emprego. Isso não aconteceu na primeira vez em que conversou com a coordenadora-geral, Lourdes Panini. Mas Alba diz que perdeu o chão quando ouviu dela uma frase que classificou como surreal. “Se seu filho quer ser bailarino, ele tem que se acostumar a ser chamado de gay”, teria declarado Lourdes à mãe, depois de Alba arrolar tudo o que seu filho estava passando. “Eu fiquei muda e só chorei”, diz. Dez dias depois, ela tirou o filho do colégio e, como imaginava, foi demitida na sequência. Hoje corre na Justiça paulistana um processo cível por danos morais contra a mantenedora do colégio Nossa Senhora de Lourdes no valor de 100 salários mínimos.
Em conversa com ISTOÉ, Lourdes Panini negou veementemente todas as afirmações de Alba e Enzo. “Nunca tivemos bullying ou agressões no nosso colégio e jamais disse que, por ter escolhido a profissão de bailarino, Enzo teria que se acostumar a ser chamado de gay”, afirma. A diretora diz que o colégio, por ser católico, tem especial atenção com a questão do bullying e presa imensamente o respeito entre os colegas. “Não o suficiente”, alega Alba, que teve cinco longas conversas com a coordenadoria pedagógica da instituição onde Enzo está matriculado atualmente para ter certeza de que lá não haveria bullying. A nova escola também acompanhou o garoto durante crises de ansiedade e uma breve disfunção alimentar, identificada por um médico de confiança da família. “Tinha medo de ir pro colégio novo e aquilo tudo que eu passei se repetir”, diz o garoto.
Hoje, Enzo estuda, tem bom desempenho escolar, amigos e aprimora, sem medo, seu talento para a dança. São quatro horas de ensaios todos os dias. “Até o final do ano devo apresentar uma variação”, diz ele, corado e sorridente. Variação é um movimento solo do balé clássico que exige treino, dedicação e perícia. Para a mãe, vê-lo equilibrado e feliz depois de tudo é um alento. “Casos como esse, onde o bullying parece ter respaldo de instâncias superiores podem ter consequências gravíssimas”, diz Cecília Zylberstajn, psicóloga especializada em atendimento de adolescentes e adultos. “A criança fica confusa porque o adulto, que teoricamente pode ser confiável e visto como um porto seguro, perde essas qualidades.” Enzo foi salvo a tempo.
Hoje, a decisão de Alba, de finalmente confrontar a escola, pode parecer óbvia, talvez até tardia para quem está de fora. Para ela não foi. Ela não só trabalhou no colégio por 14 anos como professora, mas também foi aluna do Nossa Senhora de Lourdes desde a infância. Confiava na instituição e também dependia dela. Divorciada, ela se desdobrava para dar conta das despesas que tinha com o único filho e a casa. Um irmão se dispôs a ajudá-la caso ela de fato perdesse o emprego. Isso não aconteceu na primeira vez em que conversou com a coordenadora-geral, Lourdes Panini. Mas Alba diz que perdeu o chão quando ouviu dela uma frase que classificou como surreal. “Se seu filho quer ser bailarino, ele tem que se acostumar a ser chamado de gay”, teria declarado Lourdes à mãe, depois de Alba arrolar tudo o que seu filho estava passando. “Eu fiquei muda e só chorei”, diz. Dez dias depois, ela tirou o filho do colégio e, como imaginava, foi demitida na sequência. Hoje corre na Justiça paulistana um processo cível por danos morais contra a mantenedora do colégio Nossa Senhora de Lourdes no valor de 100 salários mínimos.
Em conversa com ISTOÉ, Lourdes Panini negou veementemente todas as afirmações de Alba e Enzo. “Nunca tivemos bullying ou agressões no nosso colégio e jamais disse que, por ter escolhido a profissão de bailarino, Enzo teria que se acostumar a ser chamado de gay”, afirma. A diretora diz que o colégio, por ser católico, tem especial atenção com a questão do bullying e presa imensamente o respeito entre os colegas. “Não o suficiente”, alega Alba, que teve cinco longas conversas com a coordenadoria pedagógica da instituição onde Enzo está matriculado atualmente para ter certeza de que lá não haveria bullying. A nova escola também acompanhou o garoto durante crises de ansiedade e uma breve disfunção alimentar, identificada por um médico de confiança da família. “Tinha medo de ir pro colégio novo e aquilo tudo que eu passei se repetir”, diz o garoto.
Hoje, Enzo estuda, tem bom desempenho escolar, amigos e aprimora, sem medo, seu talento para a dança. São quatro horas de ensaios todos os dias. “Até o final do ano devo apresentar uma variação”, diz ele, corado e sorridente. Variação é um movimento solo do balé clássico que exige treino, dedicação e perícia. Para a mãe, vê-lo equilibrado e feliz depois de tudo é um alento. “Casos como esse, onde o bullying parece ter respaldo de instâncias superiores podem ter consequências gravíssimas”, diz Cecília Zylberstajn, psicóloga especializada em atendimento de adolescentes e adultos. “A criança fica confusa porque o adulto, que teoricamente pode ser confiável e visto como um porto seguro, perde essas qualidades.” Enzo foi salvo a tempo.
Revista Isto É
Infelizmente as escolas deixam passar realmente essa enorme falha... Negam, discursam lindamente ações que habitam lamentavelmente o mundo teórico... Na real, as pessoas não querem gastar tempo conversando, orientando, envolvendo as famílias e combatendo esse fenômeno outorgado por vários segmentos sociais. Foi preciso que as vítimas pirassem literalmente e o alerta foi ligado, porém o preço tem sido muito alto. A televisão divulga modelos de bullying nos desenhos e séries. Todo mundo odeia o Chris, Manual de sobrevivência escolar do Ned são apenas dois exemplos, e diga-se de passagem, com boa audiência. É super engraçado ver o Chris se ferrar. Só deixa de ter graça quando se trata da família de cada um.
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