quarta-feira, 13 de junho de 2012

Te Contei, não ? - Golpe preciso no câncer




Os oncologistas de várias nacionalidades que estiveram reunidos no 48º Congresso da Associação Americana de Oncologia Clínica (Asco, sigla em inglês), realizado na semana passada em Chicago, nos Estados Unidos, voltaram para casa entusiasmados. O motivo foi a apresentação de estudos com resultados muito promissores com novos medicamentos para tratar o mais agressivo câncer de pele, o melanoma, e também o câncer de mama. Os experimentos realizados tiveram desempenho superior ao tratamento convencional com quimioterapia.

No caso do melanoma, testes com o uso de dois medicamentos combinados, trametinibe e dabrafenibe, desenvolvidos pela farmacêutica britânica Glaxo­SmithKline, conseguiram brecar a progressão do tumor por cerca de 11 meses. Primeiro, os dois remédios foram testados separadamente. O dabrafetinibe conseguiu neutralizar uma das proteínas que nutre o tumor, também chamada Braf, mas o câncer ainda assim conseguia crescer por uma outra via. Outras substâncias existentes já haviam conseguido o mesmo efeito, como o vemurafenibe. Em um outro experimento, porém, quando as drogas foram dadas em conjunto aos pacientes, os cientistas obtiveram os resultados que surpreenderam os médicos. A associação da dupla foi capaz de fechar também a segunda via usada pelo tumor para se expandir e contra a qual ainda não havia nenhuma forma de tratamento, segundo os resultados divulgados no 48º Asco. Desse modo, os remédios cortaram o fornecimento das proteínas que alimentam a progressão do tumor, levando suas células à morte.

“Embora sejam estudos iniciais, que precisam de confirmação, são de longe os resultados mais promissores que já tivemos em melanoma”, disse por telefone à ISTOÉ, de Chicago, Bernardo Garicochea, diretor de oncogenética do Hospital Sírio-Libanês. Essas descobertas representam um grande passo no tratamento do melanoma, que também avança em outros fronts. Há mais substâncias em teste consideradas promissoras que agem por mecanismos diferentes, como o ipilimumabe. Trata-se de um anticorpo que se liga às células do sistema imune para impedir que elas se inativem, como ocorre nesse tipo de doença, e voltem a defender o corpo. A outra droga é chamada de anti-PD1, e se liga de outras maneiras às células do sistema imune para também incitá-las a atacar o câncer.

Contra os tumores de mama, os especialistas criaram uma espécie de Cavalo de Troia. Nos laboratórios da Roche, os cientistas conseguiram unir o trastuzumabe (medicamento produzido a partir de clones de uma única célula viva), com o quimioterápico DM1 (emtansine), que também já existia, mas fora deixado de lado pelos médicos por causa dos seus intensos efeitos colaterais. O novo medicamento ganhou o nome de T-DM1. O trastuzumabe (o nome comercial é Herceptin) é usado por mulheres com tumores de mama caracterizados pela superexpressão da proteína HER-2, regida por um gene mutado que leva o mesmo nome. É o tipo mais agressivo de câncer de mama e acomete até 30% das pacientes. No organismo, o T-DM1 é atraído para as células que possuem a proteína HER-2. Por causa da semelhança entre eles, consegue penetrar no seu interior. Lá dentro, a ligação mantida com o quimioterápico se desfaz, deixando essa substância livre para destruir estruturas que levarão à morte da célula cancerosa.

O estudo envolveu 991 pacientes (cerca de 50 brasileiras) já tratadas anteriormente com o trastuzumabe. Metade do grupo recebeu T-DM1, e a outra metade o tratamento padrão com a substância lapatinibe e o quimioterápico capecitabina. “As pacientes que tomaram T-DM1 não apresentaram progressão da doença por um tempo 35% maior”, observa o oncologista Garicochea. A droga será agora submetida ainda este ano à aprovação das agências americana e europeia, que regulam medicamentos. Além disso, ofereceu menores efeitos colaterais como queda de cabelo, diarreia e ânsia de vômito. “É um mecanismo importante que agora precisa ser testado em mais pacientes”, afirma a médica Nise Yamaguchi, do Instituto Avanços em Medicina e pesquisadora da Universidade de São Paulo. Os resultados positivos desses estudos confirmam uma mudança importante de paradigma no tratamento do câncer. “O caminho é a terapia personalizada e que atua sobre mecanismos moleculares”, diz Paulo Hoff, diretor de oncologia do Hospital Sírio-Libanês e do Instituto do Câncer de São Paulo, hospital público de referência.

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