Rio - Na máquina de costura de casa, Tia Dodô confecciona a própria fantasia. A duas semanas do Carnaval, a eterna porta-bandeira da Portela parece não sentir o peso da idade, tamanha é sua paixão pelo maior espetáculo da Terra. Aos 92 anos, Dodô desfilará pela 77ª vez à frente da Ala das Damas. Um grande amor que começou aos 15 anos, quando a menina Maria das Dores, moradora da Providência, berço do samba, estreou com o pé-direito e ajudou a Azul e Branca de Madureira a conquistar o primeiro dos 21 campeonatos.
“Menor não podia desfilar. O jeito foi dizer que eu tinha 18 anos”, lembra. Tia Dodô é testemunha de brincadeira que começou há 80 anos e se tornou um negócio de R$ 1,2 bilhão. No princípio, as agremiações tinham menos de 100 componentes, conduzidas por bambas como Ismael Silva, Cartola, Paulo da Portela. As rodas de samba eram caso de polícia.
“Os sambistas eram tratados como marginais. Se andassem com pandeiros, eram presos”, conta Hiram Araújo, diretor do Centro Cultural da Liga das Escolas de Samba (Liesa).
As escolas não eram famosas como os ranchos, corsos e Grandes Sociedades da época (Fenianos e Democráticos), cujos carros alegóricos puxados por cavalos serviriam de inspiração, mas começaram a ganhar destaque no primeiro torneio de escolas de samba patrocinado pelo jornal Mundo Esportivo, do jornalista Mário Filho, que dá nome ao Maracanã.
Em 7 de fevereiro de 1932, às 20h30, o público lotou a Praça Onze, a pequena África, para assistir à apresentação de quatro escolas. Cada uma poderia apresentar dois sambas — um refrão e uma parte improvisada. A Mangueira foi a campeã; Vai Como Pode, futura Portela, e a Linha do Estácio, conquistaram o vice-campeonato. O 3º lugar ficou com a Unidos da Tijuca. Ironicamente, a pioneira "Deixa Falar"(primeira escola de samba a ser fundada) enrolou a bandeira sem nunca disputar o título. Nos dois anos seguintes, a Verde e Rosa levaria o tri.
Até a década de 40, a Verde e Rosa se revezou com a Portela em títulos. Depois disso, a escola de Madureira despontou como a maior vencedora e a única a ganhar, até hoje, sete vezes seguidas (1941 a 1947).
Não havia cobrança de ingressos. Os jurados ficavam em pequenos palanques e o público subia em caixotes para ver as cabrochas com suas latas d’água na cabeça e ouvir o coro afinado das pastoras. O importante era que os grupos desfilassem em torno da Praça Onze e em frente às casas das tias baianas, principalmente a Tia Ciata, respeitadas como as mães do samba.
Em 1935, o prefeito do Rio, Pedro Ernesto, legalizou as escolas e oficializou os desfiles. Os enredos deveriam ser patrióticos sobre a História do Brasil: elas recebiam 40 contos de réis de verba pública. Nasceu daí a expressão ‘samba do crioulo doido’, numa referência às gafes nas letras e aos compositores, que em geral eram negros e — na maioria das vezes — analfabetos.
Homens eram as baianas
Eram os homens, e não as mulheres, que saíam fantasiados de baianas no início dos desfiles. Eles vinham nas laterais da escola, com navalhas presas às pernas, para protegerem a dupla de mestre-sala e porta-bandeira. As baianas em linha, como eram chamados, tinham a função de defender o porta-estandarte de grupos rivais de outras agremiações, que tentavam tomar o maior símbolo da escola.
Os grupos eram muito violentos quando se encontravam. A grande humilhação era roubar o estandarte da outra escola”, diz o cirurgião portelense e historiador Hiram Araújo.
Antes deles, a missão era exercida por garotos que rodeavam a porta-bandeira munidos de machados. Mais tarde, eles foram substituídos por cordas. As baianas ganharam alas representadas exclusivamente por mulheres em homenagem à mais famosa das baianas, a Tia Ciata, dona da casa onde o samba nasceu.
Parto na Avenida
Durante desfile do Salgueiro em 1950, a pastora Finoca entrou em trabalho de parto. Sentou no meio-fio e pediu ajuda a um repórter. A passista Adelaidinha nasceu antes da chegada da ambulância.
Durante desfile do Salgueiro em 1950, a pastora Finoca entrou em trabalho de parto. Sentou no meio-fio e pediu ajuda a um repórter. A passista Adelaidinha nasceu antes da chegada da ambulância.
Morte no Samba
O compositor Zé Matinatas, da escola de samba Depois eu Digo, foi morto a facadas em 1944, quando desfilava no Estádio do Vasco. O crime teria sido passional e ocorreu no gramado.
O compositor Zé Matinatas, da escola de samba Depois eu Digo, foi morto a facadas em 1944, quando desfilava no Estádio do Vasco. O crime teria sido passional e ocorreu no gramado.
Campeãs
Portela e Império Serrano, de Madureira, dominaram o Carnaval de 1941 a 1959, conquistando 17 dos 18 campeonatos. Nesse período, Mangueira ganhou apenas em 1954.
Portela e Império Serrano, de Madureira, dominaram o Carnaval de 1941 a 1959, conquistando 17 dos 18 campeonatos. Nesse período, Mangueira ganhou apenas em 1954.
Jornal O DIA
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