sábado, 2 de junho de 2012

Resenha - A alegre sabedoria popular de um clássico do teatro brasileiro



O “Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna, é um dos dois únicos “clássicos” do teatro brasileiro (o outro é o “Vestido de noiva”, de Nelson Rodrigues), e o que mais montagens tem recebido desde sua memorável estreia, há pouco mais de 50 anos. Sua qualidade dramatúrgica e sua extraordinária brasilidade são fontes de permanente tentação para quem faz teatro, e seu diálogo com o público é garantido em todo o território nacional. Suassuna mescla as formas medievais do auto e da moralidade com a riqueza do folclore nordestino, com sua irônica e risonha sabedoria popular, criando um texto que diverte ao mesmo tempo em que chama a atenção para a imoralidade da corrupção.


Exagero na linha circense

Esta aparece tanto nos que têm o gozo de alguma parcela de poder (que pode ser a do pequeno patrão, como o padeiro, ou de considerável alcance, como as do padre e do bispo), comparada com o comportamento dos que o desamparo obriga a pequenos golpes a fim de poder sobreviver. João Grilo é parente do bravo soldado Schweik, como de Figaro; e se a Compadecida não consegue mandá-lo para o céu, dá-lhe ao menos uma nova oportunidade.

Há mais de 20 anos mantendo atividades regulares, com certa especialização em Suassuna, a Cia. Limite 151 está agora na Sala 1 do Teatro Fashion Mall, com uma montagem que busca ser fiel à concepção do autor, que fala da tradição do “drama” no circo. A cenografia de José Dias é simples e eficiente, com cortina, três pequenos segmentos de arquibancada e quatro lindos estandartes que evocam o local da ação, formando uma moldura justa para os coloridos figurinos de Samuel Abrantes. A música de Wagner Campos é discreta, e a luz de Aurelio de Simoni, eficiente como sempre. A direção de Sidney Cruz é razoável, mantendo a linha circense um pouco forte demais em certos momentos em que, principalmente na segunda metade da peça, é necessário um maior comprometimento com a verdade de cada um.

Um elenco de 12 atores, hoje em dia, é um ato de coragem, e, com melhor ou pior rendimento, o grupo se mantém, de modo geral, ligado à intenção do autor. Glaucia Rodrigues, naturalmente, destaca-se nas espertices de João Grilo, mas além do Chicó de Marco Pigossi, também Edmundo Lippi, Renato Peres, Bruno Ganem, Janaína Prado, Samuel de Assis, Lucci Ferreira, Luiz Machado, Jacqueline Brandão, André Frazzi e Arnaldo Marques procuram servir Suassuna. Com base em um texto excepcional, o espetáculo resulta alegre e agradável.

Barbara Heliodora / Jornal O Globo

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