No Brasil, o preconceito à negritude deita raízes na mais longa história de escravidão das três Américas: 350 anos! Ainda que, hoje, nossas leis condenem a discriminação, sabem os negros que, aqui, eles são duplamente discriminados: por serem negros e pobres
21/11/2013
Por Frei Betto
Por ser data de comemoração de Zumbi dos Palmares (1655-1695), último líder heróico do mais importante quilombo brasileiro, 20 de novembro é dedicada à Consciência Negra. É também Dia da Inconsciência Branca. Foram as armas que deram aos colonizadores europeus o poder opressor sobre as nações da África negra. Em nome de Deus e de um projeto civilizatório, invadiram o continente africano e submeteram o seu povo ao jugo da escravidão.
Obrigado a aceitar o batismo cristão, a marca do sacramento era gravada nas peles negras a ferro e fogo. O propósito, livrá-los, após esta vida, das chamas eternas do Inferno, por culpa de suas crenças animistas e rituais eróticos. Destinava-os, porém, nesta Terra, ao suplício do trabalho árduo, das sevícias, das chibatas, das torturas e da morte atroz.
De tal arrogância se nutria a inconsciência branca que, ao qualificar de raça a mera diferença de coloração epidérmica, elevou-a à categoria de pretensa ciência. Buscou-se na Bíblia a caricatura de um deus maldito que, após o Dilúvio Universal, teria criado a descendência negra da Cam (Cão), um dos filhos de Noé.
No Brasil, o preconceito à negritude deita raízes na mais longa história de escravidão das três Américas: 350 anos! Ainda que, hoje, nossas leis condenem a discriminação, sabem os negros que, aqui, eles são duplamente discriminados: por serem negros e pobres. Ao escravo liberto se negou o acesso à terra, que ele tão bem sabia cultivar. Impediu-se ainda o acesso à carreira eclesiástica, aos quartéis (exceto como soldado e bucha de canhão na guerra do Brasil contra o Paraguai), às escolas particulares.
Na década de 1950, no Colégio Dom Silvério, em Belo Horizonte, ouvi irmão Caetano Maria, procedente de Angola, apregoar na sala de aula que negros eram inaptos à matemática e às ciências abstratas, vocacionados à música e aos trabalhos manuais...
A inconsciência branca viceja, ainda hoje, na promoção turística da mulata carnavalesca, ela sim liberada, por leis e censores, a exibir em público seu corpo nu.
É a inconsciência branca que protesta contra o direito de cotas para negros nas universidades; encara com suspeita o negro encontrado em espaços predominantemente ocupados por brancos; induz a polícia a expor garras ferozes ao revistar jovens negros.
O profetismo heróico de Zumbi, Mandela, Luther King e tantos outros, ainda não logrou descontaminar nossa cultura do ranço do preconceito e da discriminação. Quantos executivos negros ocupam cargos de direção em nossas empresas? Apenas 5,3%. Quantos garçons e chefs de cozinha? Quantos apresentadores de TV e animadores de auditório?
A violência com que médicos brasileiros, todos brancos, submeteram, em Fortaleza, “ao corredor polonês da xenofobia” – na expressão do ministro Padilha, da Saúde - o médico cubano Juan Delgado, um negro, a quem a presidente Dilma pediu desculpas em nome do povo brasileiro, bem comprova a inconsciência branca.
Esta inconsciência também adota o preconceito às avessas. Festejou-se a eleição de Obama, o primeiro negro na Casa Branca, como uma pá de piche (cal é branco...) na política terrorista do presidente Bush. Esqueceu-se que Obama, antes de ser negro, é estadunidense, convencido do direito (divino?) de supremacia dos EUA sobre as demais nações do mundo.
Por que haveria ele de pedir desculpas por espionar a presidente Dilma se não está disposto a abdicar dessa violação? Obama é tão guerreiro e cínico quanto Bush.
Com frequência vemos o preconceito às avessas expressar-se na negação da negritude, como se ela fosse um estigma, através de eufemismos como afrodescendente. Sou branco, embora traga nas veias sangue indígena e negro, e nunca me chamaram de iberodescendente ou eurodescendente.
A data de 20 de novembro deveria ser comemorada nas escolas com lições históricas sobre o preconceito e discriminação, e depoimentos de negros. De nossa população carcerária, hoje beirando 500 mil detentos, 74% são negros. Nos EUA, de cada 11 presos, apenas 1 é branco.
Só a Consciência Negra é capaz de combater a inconsciência branca e despertá-la, tornando hediondos todos os crimes de preconceito e discriminação.
Frei Betto é escritor, autor de “Aquário Negro” (Agir), entre outros livros.
Nós podemos perceber que desde a época da escravidão muita coisa mudou e outras continuaram a acontecer.
ResponderExcluirObservamos o preconceito no dia a dia, será que acabará?
Lógico que isso começou há muito tempo atrás quando os colonizadores obrigavam, de formas muito brutas e cruéis, os africanos a fazerem o que eles determinavam, mas o que eu não entendo é porque fizeram tão mau ao próximo se sua religião dizia que era errado?
Eles queriam “salvar” os negros das chamas do inferno, mas por que nunca perceberam e pararam de efetuar o que era incorreto? Tentar fazer com que a pessoa mude é uma coisa, mas temos o livre arbítrio de escolher o que será melhor para nós, e isso foi o que sempre faltou no mundo.
Como o texto diz, o dia da consciência negra é também um dia da inconsciência branca porque tudo isso aconteceu pela falta de conhecimento em seus atos, sempre procedendo sem pensar no que faziam e quanta maldade e injustiça estavam acontecendo.
Os negros foram obrigados a aceitar um novo sacramento e a entrar em um mundo cheio de coisas que não estavam acostumados a fazer... Foram obrigados a deixar seu próprio lar, família e destruir o lugar onde viviam.
São 350 anos de escravidão e já está na hora de mudar.A mudança começa com a nova geração, muitos com conhecimento de que o preconceito é errado e a cor da pele é apenas um detalhe.
Giulia, 701
ATIVO
O racismo é uma palavra que devia ser extinta do vocabulário e da mente das pessoas...
ResponderExcluir"Certo dia passando pela rua, ouvi uma criança dizer para sua mãe, que estava com medo da pessoa que vinha em sua direção. A mãe perguntou: Tem duas pessoas vindo em nossa direção, um rapaz de cor branca e outro rapaz de cor negra, de qual você está com medo meu filho?
E ele responde: do rapaz negro..
Resumo da história: até uma criança ainda inocente já tem o racismo em sua cabeça.
Lara Gomes - 701