A repórter Andréia Sadi revelou que o presidente do Senado, doutor Renan
Calheiros, preocupado com sua cabeça, requisitou um jato da FAB para voar de
Brasília a Recife, onde fez um implante de 10 mil fios de cabelo. Quem nestas
festas viajou com seu dinheiro deve perceber que esse tipo de coisa só acabará
pela associação dos direitos de voto e de manifestação em torno de políticas
públicas. Só com o voto isso não muda. Pelo voto, Renan começou sua carreira
política em 1978, elegendo-se deputado estadual pelo MDB de Alagoas.
Renan Calheiros é um grão-mestre da costura política. Foi líder do governo de
Fernando Collor de Mello e ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso.
Desde 2003 é um pilar da coligação petista no Congresso. Pertence a uma
categoria imune à vontade popular. Ela pode ir para onde quiser, mas ele
continuará no poder, à sua maneira. Como ministro da Justiça do tucanato, tendo
seu nome exposto na Pasta Rosa dos amigos do falecido banco Econômico, defendeu
o uso do Exército para reprimir saques de famintos durante a seca de 1998.
Politico da Zona da Mata alagoana, estava careca de saber que tropa não é
remédio para esse tipo de situação. Nessa época, dois de seus irmãos foram
acusados de terem mandado chicotear um lavrador acusado de roubar um aparelho de
TV numa fazenda. Um desses irmãos elegeu-se deputado federal. Entre 1998 e 2006
teve uma variação patrimonial de 4.260%, amealhando R$ 4 milhões.
Renan teve uma filha fora do matrimônio quando ganhava R$ 12.720. A mãe da
criança era ajudada por uma empreiteira amiga que lhe dava uma mesada de R$ 16,5
mil. Por causa desse escândalo por pouco não foi cassado, mas renunciou à
presidência do Senado. Reelegeu-se e voltou à cadeira que já foi de Rui Barbosa
prometendo uma agenda ética, de "transparência absoluta". Contudo, como diz o
senador Edison Lobão Filho, filho e suplente do senador Edison Lobão, ministro
de Minas e Energia, "a ética é uma coisa muito subjetiva, muito abstrata". Nesse
mundo de abstrações, Renan, vendo a despensa de sua casa concretamente
desabastecida, mandou abrir um pregão de R$ 98 mil para a compra de salmão,
queijos, filé-mignon, bacalhau e frutas. Apanhado, cancelou a compra.
Renan não é um ponto fora da curva. Ele é a própria curva. Em 2005, como
presidente da Casa, deu sete cargos de R$ 10 mil a cada colega. Seu mordomo
ganha R$ 18 mil. Em julho, quando ainda havia povo na rua, usou um jatinho da
FAB para ir a um casamento em Trancoso. Apanhado, devolveu o dinheiro. Passados
cinco meses fez o voo do implante.
Estabeleceu-se uma saudável relação de causa e efeito entre esse tipo de
comensal da Viúva e a opinião pública. Eles não se corrigem, mas, uma vez
denunciados, recuam. São muitos os maganos que não toleram saguão de aeroporto,
despensa vazia e parente desempregado. Nessas práticas, é fácil colocá-los
debaixo da luz do sol. Quando se trata de convênios, contratos de empreiteiras e
grandes negócios, a conversa é outra.
Em 2014 a turma que paga as contas irá as urnas. Elas poderão ser um bom
corretivo, mas a experiência deste ano que está acabando mostra que surgiu outra
forma de expressão, mais direta: "Vem pra rua você também".
Elio Gaspari, nascido na Itália, veio ainda criança para o Brasil,
onde fez sua carreira jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em
2003 por "As Ilusões Armadas". Escreve às quartas-feiras e domingos na versão
impressa de "Poder".
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