O novo presidente da Comissão de Direitos Humanos e suas declarações preconceituosas e racistas
Flávia Tavares
Flávia Tavares
O deputado e pastor Marco Feliciano deu início à cruzada de sua vida: pôr fim àquilo que chama de “ditadura gay” no Parlamento brasileiro. Na quinta-feira da semana passada, apesar de protestos daqueles que se recusaram a compreender as razões de sua missão em Brasília, Feliciano foi eleito presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Caberá a ele conduzir debates sobre cotas para negros em universidades e sobre leis para assegurar o pleno direito de homossexuais. Graças ao Twitter de Feliciano, seguido por 140 mil almas, sabe-se com clareza o que ele pensa sobre esses assuntos. “Africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé. Isso é fato”, diz um dos tuítes, noticiado na semana passada pelo colunista de ÉPOCA Felipe Patury. Outro: “A podridão dos sentimentos dos homoafetivos leva ao ódio, ao crime, à rejeição”.
Num vídeo que promete virar hit no YouTube, gravado num dos cultos do Ministério Tempo de Avivamento, igreja fundada por Feliciano em Hortolândia, no interior de São Paulo, ele domina o púlpito como quem domina o plenário da Câmara. “É a última vez que falo: o Samuel de Souza doou o cartão, mas não doou a senha. Aí não vale. Depois vai pedir o milagre pra Deus e Deus não vai dar e vai falar que Deus é ruim.” Os fiéis permanecem em silêncio. “Você vai mesmo ficar com esse dinheiro na carteira?” Alguns se aproximam, entregam cheques e dinheiro. “Estou sentindo Jesus aqui. As lágrimas da redenção tocaram meu coração. Todo mundo que tem talão de cheque tem de fazer alguma coisa. Amém!”
Feliciano sabe como seduzir uma plateia. Começou os cultos aos 19 anos; hoje, tem 40. Já escreveu 17 livros, gravou 100 DVDs e fundou a própria igreja. Tem 13 templos espalhados pelo interior de São Paulo. Em 2010, o triunfo: elegeu-se deputado, com 211 mil votos, pelo Partido Social Cristão, o PSC, agremiação de evangélicos. À frente da Comissão de Direitos Humanos, Feliciano afirma querer trabalhar “em defesa da família”. Diz que tentará, “com a força de Jesus”, impedir a aprovação do projeto de lei que torna crime atos homofóbicos. “Suponhamos que eu esteja num restaurante com minhas filhas e um casal homossexual comece a se agarrar, atracadamente. Se eu mudar de mesa e eles entenderem que é um preconceito, pá, pena de 2 a 6 anos”, diz Feliciano. Ele afirma que não ser preconceituoso: “Tenho amigos homossexuais, como os cabeleireiros da minha mulher e as pessoas que decoram minha casa”.
A eleição de Feliciano à presidência da Comissão Direitos Humanos, não fosse por sua presença, talvez nem virasse notícia. Criada em 1995, essa comissão se tornou um dos principais espaços para o debate de assuntos que não mereciam a atenção do Congresso. A presidência da comissão era considerada um feudo do PT. Até a ascensão de Feliciano e seus colegas evangélicos. “Essa comissão dá muito trabalho, e o partido que a comanda por 18 anos estava esgotado. Virou moeda de troca e ninguém queria”, diz Feliciano. O PT, de fato, rifou a comissão. Preferiu outras. O pequeno PSC nem precisou pechinchar muito.
Apesar da origem pobre, Feliciano já tem cinco empresas e roda num BMW X5. O dinheiro provém da venda de CDs, livros e DVDs – e, aleluia! – das doações dos 3 mil fiéis do Ministério Tempo de Avivamento. Segundo um dos assessores de Feliciano, os templos dão “prejuízo, não têm arrecadação nenhuma”. “O deputado paga os aluguéis do bolso”, diz o assessor. Quem crê dá um jeito.
Revista Época
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