terça-feira, 25 de junho de 2013

Te Contei,não ? - Avás - canoeiros: cacique sem tratamento para câncer



Contra o tempo. Iawi, líder do grupo, teve o baço retirado e deveria receber quimioterapia igual à usada por Dilma
Foto: André Coelho / 21-2-2013




BRASÍLIA — Iawi, cacique da tribo avás-canoeiros, que tem apenas oito integrantes e vive no interior de Goiás, está gravemente doente em decorrência de um câncer. Desde que foram retirados de sua região de origem para a construção da hidrelétrica Serra da Mesa, há 19 anos, os sobreviventes dessa etnia receberam mais de R$ 10 milhões em compensações financeiras de Furnas, responsável pela usina. Mas a burocracia federal impede o cacique — que liderou a comunidade ao longo desse tempo — de ter acesso aos recursos necessários ao seu tratamento.

“Caso esse indígena venha a óbito, a sobrevivência dessa etnia poderá entrar num risco maior do que já se encontra”, escreveu, em 28 de maio, a presidente interina da Fundação Nacional do Índio (Funai), Maria Augusta Assirati, em ofício à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada ao Ministério da Saúde, no qual tenta evitar a eventual “morosidade que o tratamento venha a ter”, colocando à disposição recursos do convênio da Funai para custear o tratamento, um expediente extraordinário.
Com 53 anos, Iawi é o principal responsável pela sobrevivência dos avás-canoeiros em Minaçu, onde vivem também Nakwatxa, de 63 anos, Matxa, 73, Tuia, 43, Thrumak, 26, Niwatima, 24, e seu filho Paxeo, de 1 ano, além de Kapitomy’i, índio da etnia tapirapé de 26 anos, pai de Paxeo. Com um português pobre, ele é o interlocutor da comunidade com o mundo externo, o articulador e até o cozinheiro.
Sem prestação de contas
Os avás-canoeiros deveriam ter recebido R$ 6,9 milhões a partir de 1992 pelo primeiro convênio original entre Furnas e Funai. Com base na Lei de Acesso à Informação, O GLOBO solicitou acesso “aos balanços e extratos financeiros do convênio 10.323/92”, firmado entre a fundação e empresa. Na pasta entregue pela Funai, com mais de 200 páginas, há indicações de depósitos feitos por Furnas referentes ao convênio, mas nenhuma indicação de onde foram gastos os recursos. Não existe balanço ou prestação de contas em todos esses anos, ou, pelo menos, não a que a sede da Funai, em Brasília, tenha acesso. A reportagem do GLOBO esteve na aldeia em fevereiro e não notou sinal de que esses recursos tenham beneficiado significativamente o grupo.
Em 20 de maio, foi diagnosticado um linfoma marginal no baço e anemia hemolítica no índio Iawi. No dia 25 de maio, após muitas tosses, um raio X realizado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG) revelou infiltrações no seu pulmão, para o que foi prescrito azitromicina. Após a retirada do baço, a equipe médica recomendou quimioterapia com o remédio rituximabe, que foi indicado à presidente Dilma Rousseff e ao ator Reinaldo Gianecchini, quando tiveram leucoses, tipo de câncer similar ao de Iawi. Mas o medicamento não está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).
Medicamento custa R$ 43 mil
Iawi, que deveria ter acesso aos milhões destinados à tribo, não conseguiu dar início ao tratamento contra o câncer por falta de recursos para a compra do medicamento. O tratamento custa entre R$ 43.128 e R$ 52.961, dependendo do número de doses necessárias.
Conforme assinalou Maria Augusta no ofício à Sesai em maio, o Estado brasileiro tem o papel de garantir a sobrevivência da etnia avá-canoeira. Assim, o governo agora corre contra o tempo para restabelecer a saúde do cacique Iawi. Para assegurar a Iawi um tratamento especial, a Funai pressiona a Sesai (do Ministério da Saúde), que, por sua vez, pressiona o Hospital das Clínicas, que é ligado ao Ministério da Educação. O esforço chegou a incomodar a equipe de hematologistas do HC da UFG.
— Para nós, não interessa a língua que fala ou o rosto que tem. Aqui no hospital são todos iguais e vamos oferecer o máximo que pudermos dentro de nossas competências — disse José Garcia Neto, diretor geral do hospital.
Se não bastasse esse jogo de empurra entre órgãos do governo federal, a Sesai apelou para uma alternativa ainda mais heterodoxa: a Justiça. Segundo informe da coordenação de acompanhamento das ações de saúde da Funai do dia 14 de junho, a Sesai havia iniciado processo junto ao Ministério Público para assegurar o tratamento do cacique avá-canoeiro no HC-UFG. O Ministério Público pode conseguir liminares que obriguem o hospital a fornecer os medicamentos, mas a Justiça não costuma indicar a origem dos recursos gastos no tratamento.
Na segunda-feira deverá ocorrer uma nova reunião entre representantes da Sesai e da Funai sobre a situação de Iawi Avá-Canoeiro, que poderá ser levado a Brasília para tratamento. A Funai também considera contratar um plano de saúde privado para os avás-canoeiros terem um tratamento diferenciado ao do sistema público.

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