Zuenir Ventura, O Globo
É inevitável o paralelo entre as manifestações de junho, uma das quais reuniu
no Rio 300 mil pessoas, e as de anteontem, com menos de 20% de participação.
As primeiras foram convocadas pelas redes sociais na internet e dispensaram a
presença de partidos políticos e sindicatos; já as do Dia Nacional de Luta, ao
contrário, foram promovidas e organizadas por oito centrais sindicais, com a
discreta colaboração de PT, PCdoB, PDT, além do MST e da UNE.
Em cerca de 20 estados houve mais sucesso nas paralisações e obstruções do
que nas mobilizações, ou seja, foi mais fácil tirar gente das ruas do que
botar.
O movimento do mês passado teve um caráter espontâneo, enquanto o de agora
recebeu em alguns casos até incentivos pecuniários. Na capital paulista, por
exemplo, repórteres chegaram a flagrar manifestantes de aluguel ganhando R$ 50
pela participação no ato sindical de quinta-feira.
“A rapaziada é #, a pelegada é $”, escreveu em seu blog o jornalista Josias
de Souza, estabelecendo comparações entre as novas formas de protesto e as mais
antigas: “A rapaziada é chapa quente, a pelegada é chapa branca”; “A rapaziada é
sociedade civil, a pelegada é sociedade organizada”; “A rapaziada é banco de
praça, a pelegada é BNDES”.
Pode-se acrescentar que um lado é o mundo digital e o outro, o analógico,
pré-revolução tecnológica, que desconhece que em política a forma é tão ou mais
importante do que o conteúdo e a função.
Foto: Marcos Bizzotto / Futura Press
De semelhante entre as duas mobilizações, o pior: a invasão dos baderneiros.
Está virando triste rotina as passeatas começarem pacíficas, civilizadas e
degenerarem em atos de violência generalizada, com confrontos, quebra-quebra,
coquetéis molotov, arruaças.
Na de anteontem, houve como novidade a presença de uma gangue que transformou
o Centro da cidade em um campo de batalha. Vestidos de preto e com máscaras ou
camisas amarradas no rosto para não serem identificados, esses vândalos,
dizendo-se anarquistas, depredaram lojas e agências bancárias, quebrando janela
do Teatro Municipal e vidro da Igreja da Candelária.
Em seguida, outro bloco de mascarados (ou seria o mesmo?) transferiu o
tumulto para o entorno do palácio do governador. A fumaça e o gás lacrimogêneo
da batalha com a polícia, que foi agredida com pedras, invadiram apartamentos,
supermercado, pizzaria e até uma clínica médica. O pânico foi geral. Mais uma
vez ficou demonstrado que as manifestações políticas, seja no estilo antigo ou
no novo, têm como inimiga comum a baderna.
Zuenir Ventura é jornalista.
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