É urgente efetivarmos um Estado verdadeiramente laico
Rio - Reclamar contra o estupro e o aumento de casos de violência contra
mulheres negras, indígenas, lésbicas, travestis, transexuais é justíssimo, mas
usar como nome do protesto o termo ‘vadias’, ah... aí é demais!
Em um país onde ser ‘o galinha’ é ser o ‘garanhão’, enquanto ser ‘a galinha’
é ser vadia; ser o aventureiro é sinal de bravura e audácia, já ser a
aventureira...; estar puto é ficar irritado, mas ser puta já ‘são outros
quinhentos’; não era sem tempo perguntar: seriam roupas (ou ausência delas),
comportamentos e escolhas afetivas indícios suficientes para respeitar algumas
mulheres e violentar moralmente e fisicamente outras?
Infelizmente, para muita gente, a resposta é sim. De acordo com o Instituto
de Segurança Pública, em 2012 houve aumento de 23% nos casos de estupro
registrados em delegacias do estado. Foram cerca de 16 casos por dia, contra 13
ocorrências diárias em 2011. Apesar disso, assistimos, este ano, ao governador
Sérgio Cabral minimizar a frequência deste tipo de crime após dois casos de
estupro ganharem repercussão na mídia (um deles por envolver uma turista
estrangeira).
Pelo terceiro ano um grupo de cidadãs, que se identificam com a luta por
justiça social, resolveu construir o movimento autônomo Marcha das Vadias e, de
modo irreverente, dialogar com a sociedade afirmando que nossos corpos não são
nem um insulto, muito menos um convite à violação. Afirmamos a igualdade de
direitos e não discriminação aos seres humanos de todas as cores, formatos e
classes sociais. Mas como ter de fato relações sociopolíticas mais igualitárias
e justas?
É urgente efetivarmos um Estado verdadeiramente laico. Políticas públicas
devem ser feitas não a partir de morais religiosas, mas como respostas às
práticas e necessidades de determinada comunidade. O dinheiro público deve ser
revertido para uma sociedade que seja capaz de amar, como se não houvesse
religiões. Sem pretendermos ser ‘donas da verdade’, levantamos bandeiras,
sugerimos respostas e incitamos o debate. Muito mais que peitos, o que temos se
chama vontade de justiça e coragem!
Nataraj Trinta é historiadora e co-organizadora da Marcha das
Vadias
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