Ditador incumbiu desenhista alemão de criar estúdio similar ao do americano para entreter as massas e fazer
Graça Magalhães-Ruether
Apaixonados pelos desenhos animados de Walt Disney, o ditador Adolf Hitler e seu ministro da propaganda, Joseph Goebbels, tiveram que arranjar um substituto alemão para o americano pouco depois do início da Segunda Guerra Mundial - quando a distância ideológica entre Estados Unidos e a Alemanha tornouse insuperável. Como Disney, o artista alemão fazia desenhos animados com animais e objetos que falavam.
Hans Fischer, nascido em Bad Koesen, na Saxônia, em 1896 (para ter um sobrenome que não soasse muito comum, ele acrescentou o nome da cidade de nascimento ao seu próprio, passando a se chamar Hans Fischerkoesen), já era relativamente conhecido quando foi "descoberto" por Hitler. Liberado da Primeira Guerra Mundial por sofrer de asma, ele aperfeiçoou o seu desenho, criando em 1919 o primeiro desenho animado da Alemanha, "O buraco no Ocidente" - segundo fontes da época uma prestação de contas com as pessoas que tiravam proveito do sofrimento da população com a pobreza e destruição depois da guerra.
Já por conta desse filme, Fischerkoesen atraiu a admiração de Hitler, que queria criar na Alemanha uma indústria de desenho animado capaz de concorrer com os populares desenhos de Walt Disney. Em 1931, um jornal de Leipzig, onde vivia, publicou uma reportagem sobre o desenhista, afirmando que os seus personagens seriam ainda mais interessantes do que Mickey. Nos anos 30, fez centenas de desenhos e filmes publicitários, nos quais usava métodos inovadores, como figuras que se moviam através de uma espécie rudimentar de controle remoto.
Mas quem negociou mesmo com o desenhista foi Joseph Goebbels, que controlava todas as atividades
culturais do país entre 1933 e 1945. Foi Goebbels quem incumbiu Fischerkoesen da tarefa de criar desenhos alemães capazes de superar os filmes de Disney em termos técnicos e de criatividade, e que deviam, também, preencher os objetivos da propaganda mas, ainda assim, divertir as massas.
O primeiro filme que Fischerkoesen fez para o seu novo chefe foi "Die Verwitterte Melodie" (Weather-beaten Melody), sobre uma abelha que descobre uma vitrola em pleno campo e consegue tocar os discos antigos usando o seu ferrão.
Ao contrário de outros produtos culturais da época, que seguiam normas rigorosas, os desenhos de Fischerkoesen tinham uma certa liberdade artística, como o uso de jazz (ritmo americano que era proibido) no filme da abelha, mas também em alguns detalhes dos filmes "O homem de gelo" e "O gansinho parvo" , de 1944.
Segundo o arquiteto Hans Fischerkoesen, filho do artista, seu pai trabalhava com o regime mas não era membro do partido NSDAP (Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães). Mas, claro, ele era um colaborador do regime, uma vez que seus filmes, sem texto, eram mostrados na regiões ocupadas do leste Europeu, para conquistar o apoio da população local.
- O meu pai se arranjava bem com o regime, nunca pensou em ser dissidente - diz Fischerkoesen.
Depois da guerra, Hans Fischerkoesen, o pai, foi internado pelos soviéticos no campo de Sachsenhausen, onde conseguiu sobreviver desenhando retratos dos guardas soviéticos em troca de pão.
Depois de libertado, Fischerkoesen voltou a fazer desenhos e filmes de publicidade. Ele sonhava em conseguir cumprir a ordem de Hitler de fazer com que seus estúdios um dia concorressem com os de Disney.
Seus desenhos de publicidade divulgados pela televisão eram como uma marca registrada da época do milagre econômico, quando os alemães já tinham reconstruído os prédios demolidos pela guerra.
Embora seus filmes não tenham ficado conhecidos fora da Alemanha, os estúdios funcionaram até o ano 2000. Hans Fischerkoesen morreu em abril de 1973, de infarto. Seu filho continuou o seu trabalho. Agora, seu neto, Alexander Fischerkoesen, mesmo sem o estúdio, tenta dar continuidade ao trabalho do avô.
Fonte: O Globo
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