sexta-feira, 5 de julho de 2013

Te Contei, não ? - Dilma sob pressão

A presidenta tenta dar um novo rumo à sua gestão, enquanto enfrenta o descontentamento da opinião pública, da base aliada e do próprio PT

Izabelle Torres
Na segunda-feira 24, um pequeno grupo de assessores entregou à presidenta Dilma Rousseff um relatório com o resultado de um monitoramento feito durante sete dias sobre nove mil indivíduos ativos nas redes sociais. Os dados mostravam uma situação mais grave do que se poderia imaginar. Segundo o levantamento, cresciam em volume preocupante as manifestações que pediam sua saída do governo, chegando a 21%. Apenas os apelos por melhorias nos serviços públicos, na faixa de 47%, superavam as citações englobadas pelo termo “Fora Dilma”.
 
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Dilma recebeu relatório com base num monitoramento de redes
sociais em que 21% das pessoas pediam sua saída do governo.
O PT cobra reação, mas nem no partido há unidade
 
 
Naquele momento, quando os protestos iniciados para revogar a tarifa de ônibus haviam se transformado numa insurreição espalhada pelo País inteiro, estava claro que o governo fora derrotado no sistema nervoso típico das lutas políticas do século XXI, cuja arena é a internet, onde militantes e ativistas, abrigados atrás de nomes que sugerem slogans e gritos de guerra, costumam definir os humores, sensibilidades e caminhos que serão seguidos pela etapa seguinte – nas manifestações de rua. Não era uma situação surpreendente. Vitorioso em 2010 com o auxílio da malha de blogueiros ligados ao PT, que cravaram vitórias naquela campanha presidencial, virando diversas denúncias e acusações a José Serra, então candidato do PSDB ao Planalto, o governo Dilma desmobilizou as redes sociais ligadas ao partido. Enquanto isso, um temido condomínio de blogueiros e ativistas que fazem oposição ao governo, uma parte ligada ao PSDB, manteve-se em posição de alerta e, em pouco tempo, assumiu uma situação de domínio nas disputas políticas da rede.
Mas, se a internet define uma parte da luta política de uma sociedade, e costuma fazer isso de modo relativamente artificial, pois não envolve a totalidade de uma sociedade, na semana passada os problemas de Dilma Rousseff se encontraram no mundo real da política brasileira. Envolveram a internet, a rua, a governabilidade, o Congresso e os ministros. Em um reunião fechada, durante a semana, Rui Falcão, presidente do PT, declarou em tom de advertência: “Já fomos um partido que ganhava na rua e perdia na urna. Depois, viramos um partido que perde na rua e ganha na urna. Se continuarmos desse jeito, vamos acabar perdendo nos dois”, alertou.
 
DILMA-03-IE-2276.jpgCONSELHEIRO MOR
Quem mais deu orientações a Dilma, na última semana,
foi o ministro da Educação, Aloizio Mercadante
 
 
Os dramas do governo Dilma, nos últimos dias, incluíram vários personagens, a começar pelo ex-presidente Lula. Numa convivência formada por atos frequentes de lealdade política e solidariedade, as relações entre ambos esfriaram na mesma proporção em que a temperatura política do País se aqueceu. No Planalto, ouve-se a queixa de que Lula, tão presente para dar sua opinião em assuntos do governo e dizer aos jornais, com a elegância devida, o que pensava de temas tão variados, inclusive mudanças no ministério, desta vez ficou mais calado do que gostaria o Planalto. Não se ouviu uma palavra de solidariedade, uma declaração efetiva. Quem mais aconselhou Dilma foi o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, que se consolida na Esplanada como principal auxiliar da presidenta.
Coube a um soldado de Lula, o ex-ministro Franklin Martins, a tarefa de formatar o pronunciamento de Dilma Rousseff na noite da sexta-feira, 21 de junho, quando a presidenta foi à TV afirmar seu respeito a luta dos brasileiros e defender os valores da democracia e da Constituição. Num mundo onde a influência do marqueteiro João Santana é muito acentuada, e criticada com freqüência cada vez maior, o pronunciamento foi politizado, preocupado em apontar um rumo político claro. Mas, num país que enfrenta um terremoto, com várias erupções subterrâneas, seus benefícios se mostraram pouco duráveis.
 
 
DILMA-07-IE-2276.jpgUNANIMIDADE PERDIDA
Na última semana, João Santana passou a ser criticado
no governo por ter perdido a batalha nas redes sociais
 
A convivência entre Dilma e as lideranças do Congresso sempre foi péssima. Ficou mais grave na última semana, depois que o terremoto colocou cada um dos integrantes do Congresso diante do dilema real de todo político em hora de dificuldade, preocupado, acima de tudo, em salvar a própria pele. O vice-presidente Michel Temer (PMDB) disse a colegas de partido que foi surpreendido com a declaração da presidenta de que pretendia convocar um plebiscito para decidir sobre uma constituinte exclusiva para a reforma política e passou a semana inteira de cara amarrada – quando era indispensável que fizesse o possível para exibir um sorriso feliz. Nos bastidores, Temer deu munição para os ataques dos políticos, afiando argumentos. Sem fazer muita cerimônia, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o da Câmara, Henrique Eduardo Alves, aproveitaram uma reunião convocada para encaminhar o plebiscito pelo Congresso para lembrar a presidenta de um detalhe que poucos haviam percebido. Talvez não fosse possível evitar, disseram, que o direito à reeleição fosse incluído no debate da reforma política. Mesmo sem fazer referências diretas, o alvo era óbvio. Como se pretende promover uma reforma capaz de ser aplicada já nas eleições de 2014, o próprio direito de Dilma candidatar-se à reeleição poderia ser colocado em questão.
Em outro gesto, Renan entregou a Dilma uma relação com dez páginas de projetos que, prontos para ir à votação, poderiam servir de resposta às ruas. Ao mostrar o documento, o senador fez questão de sublinhar que, se o Planalto tivesse se empenhado em manter boas relações com o Congresso, talvez a tensão do outro lado da calçada não estivesse tão grande. Desconfiado, cada vez mais, que pode ser entregue à fúria da multidão que passou a mencionar seu nome na lista de quem deveria ser cassado, Renan Calheiros passou a multiplicar gestos de hostilidade ao Planalto e produzir demonstrações de alta produtividade para a plateia. Convocou os senadores para aparecer em plenário ao meio-dia e meia, duas horas antes do habitual. Ao anunciar um projeto de criação de passe livre, deixou o governo na incômoda obrigação de tomar duas providências, antipáticas em qualquer caso. Rejeitar o projeto em nome do controle de gastos. Ou aceitar a ideia e ir atrás do prejuízo num universo de gastos que parecem sem fim por causa da nobre necessidade de atender ao clamor das ruas – e não aos repentes de Renan Calheiros. Mas não foi só. Quando decidiu colocar em votação uma proposta de transformação da corrupção em crime hediondo, Renan fez questão de homenagear a oposição. Colocou em pauta um projeto do senador Pedro Taques (PDT-MS), relatado por Álvaro Dias (PSDB-PR). Num esforço para apresentar uma emenda para agravar a pena de autoridades condenadas como corruptas, o senador Wellington Dias (PT-PI) precisou valer-se de um lance de astúcia. A votação ocorria durante o jogo Brasil x Uruguai, que muitos senadores assistiam em seus gabinetes, longe do plenário. Bastava um parlamentar pedir verificação de quorum, lembrou Wellington, para a deliberação vir abaixo, gerando uma anedota escandalosa num plenário que não necessitava disso naquela semana de tantos riscos. Seu direito de apresentar uma emenda foi garantido.
 
 
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Aconselhada a conversar e, especialmente, ouvir mais, Dilma Rousseff enfrentou na semana passada uma memória ruim de atitudes e comportamentos. Os petistas ainda se dizem fiéis a seu governo pelo que chamam de “projeto”, mas tem ânimo cada vez menor para identificar-se com a presidenta e defender sua sorte. A bancada de senadores reclama que em dois anos e meio de governo só foi chamada uma vez para ouvir a presidenta e, mesmo assim, um dos senadores ouviu uma bronca constrangedora na frente dos demais, e uma das mulheres presentes foi interrompida no meio da fala.
Entre sindicalistas, a vontade de socorrer a presidenta é idêntica à de lhe fazer pedidos. Num encontro com Lula, ao lado de outros sindicalistas e dirigentes do partido, o presidente da CUT, Wagner Freitas, lembrou que há 36 meses a entidade ganhou o direito de possuir um canal de TV, mas até agora não pode usufruir da conquista – pois o ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, não assina a concessão. Wagner pediu ajuda a Lula, que prometeu fazer o possível.

Fotos: DIDA SAMPAIO/AGÊNCIA ESTADO/AE; Renato Araujo / ABr; WILSON PEDROSA / agência estado/ae; Ueslei Marcelino / Reuters

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