segunda-feira, 9 de julho de 2012

Te Contei, não ? - Baixa umidade é um mito


SÃO PAULO - Os brasileiros se preocupam de forma exagerada com a baixa umidade tão comum no inverno, já que o fenômeno acontece em poucos dias, por poucas horas e não atinge índices tão preocupantes. Quem garante é o professor do Departamento de Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (USP) Fábio Luiz Teixeira Gonçalves. Nesta época do ano em que as prefeituras costumam emitir alertas quando consideram que o ar está seco demais, principalmente no Centro-Oeste e no estado de São Paulo, os alérgicos deveriam comemorar: ácaros e fungos se proliferam menos quando os índices de umidade estão mais baixos.

É claro que dias mais secos trazem problemas, como o ressecamento das mucosas, porta de entrada para agentes infecciosos. Só que isto ocorre abaixo dos 20% de umidade, que raramente acontece, principalmente no Rio. Mesmo assim os índices se referem sempre às áreas externas: dentro de casa, as pessoas, as plantas, os cachorros, todos os seres jogam água no ambiente. Em época de baixa umidade, portanto, aproveite a dica do professor: corra para limpar os armários e colocar as roupas no sol.
O GLOBO: O medo da baixa umidade é um exagero?
FÁBIO GONÇALVES: É um mito. É muito pouca a baixa umidade aqui em São Paulo, tanto no que se refere ao percentual da umidade quanto em relação à quantidade de dias em que é registrada a baixa umidade. São poucos dias secos e a umidade atinge por pouco tempo valores baixos, como uma hora por dia em ambientes externos.
É um mito no Brasil todo?
GONÇALVES: Na Costa Leste a umidade é alta. Mesmo em cidades do interior a umidade não é muito baixa. Isso aqui não é deserto, o Brasil como um todo é um país úmido. Os valores baixos de umidade ficam mais ou menos similares a países desérticos, mas por um período pequeno e por algumas horas, nada grave. Se todo estado de alerta emitido no Brasil fosse aplicado na Jordânia ou na Arábia Saudita eles se matariam (risos). Eles devem rir muito de nós, aliás.
Mas a baixa umidade traz alguns problemas, certo?
GONÇALVES: Quando se fala no desconforto causado pela umidade em 20%, isso se refere à área externa. No interior dos ambientes a umidade é sempre maior. Há dois lugares em que a preocupação com a baixa umidade faz bastante sentido: os desertos e lugares frios durante o inverno, pois a calefação deixa a umidade muito baixa, como o Canadá, o norte dos Estados Unidos e da Europa, a Rússia. A umidade lá fica entre 5% e 10% durante todo o inverno, durante 24 horas. Aqui não atingimos essa umidade. Atingimos 20% dentro das casas talvez em Brasília, mas em São Paulo, nunca.
Por que a umidade é sempre maior dentro das casas?
GONÇALVES: Porque as pessoas cozinham, tomam banho, há plantas e gente. Todos os seres jogam água no ambiente.
Uma casa com plantas e cachorro tende a ser mais úmida que outra sem?
GONÇALVES: Exatamente. Além disso, o chão de madeira tem mais umidade, enquanto o piso frio tem menos. Roupas, sapatos, tecidos e madeira absorvem água e a retêm.
Que percentuais de umidade preocupam?
GONÇALVES: Os valores ideais, em que há conforto, são de 40% a 70%, dentro de casa ou na rua. De 20% a 40% consideramos desconfortável, e abaixo de 20% é preocupante. Abaixo de 12% você começa a ter muitos problemas, mas depende do tipo físico da pessoa. Há pessoas mais adaptadas que outras.
A umidade costuma baixar todos os dias durante o inverno?
GONÇALVES: Costumamos ter umidade baixa das 14h às 16h, em alguns dias de agosto e setembro.
Por que há queda nessa época do ano?
GONÇALVES: Normalmente o clima dessa época do ano faz com que as chuvas do final da tarde não aconteçam. Não existe calor suficiente para ter chuva e aí fica mais seco. Mas este ano temos uma enorme exceção.
Por que?
GONÇALVES: Porque este inverno está sendo muito mais chuvoso. Neste ano já tivemos recorde de chuva. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia choveu mais de 200 mílimetros em São Paulo em junho, o que é normal em janeiro, não em junho.
Por que isso está acontecendo?
GONÇALVES: O Oceano Pacífico está mais quente, assim como o Oceano Atlântico, e isso favorece chuvas maiores durante o inverno. Os últimos invernos têm sido muito mais chuvosos que o normal, e este é um deles.
Que problemas a baixa umidade pode causar?
GONÇALVES: A umidade abaixo de 20% é ruim porque resseca muito as mucosas nasais e isso facilita a entrada de agentes infecciosos.
Como esse mito em torno da baixa umidade surgiu?
GONÇALVES: A mídia criou esse mito. Deveríamos comprar um desumidificador e não um nebulizador. A não ser que você queira criar ácaros e cogumelos na sua casa, não compre aquilo (umidificador). Esse conselho vale inclusive para quem mora em São Paulo, e principalmente para os moradores de todo o estado do Rio. Em Brasília os moradores devem ter o umidificador, mas só devem usá-lo entre julho e setembro.
E a alta umidade, também traz problemas?
GONÇALVES: Ácaros e fungos adoram umidade acima de 70%, e as casas frequentemente passam desse percentual. Os problemas de saúde são ligados aos ácaros, como rinite, bronquite, asma. Alergias podem surgir devido tanto à alta umidade quanto à baixa, mas é mais comum que elas estejam relacionadas à umidade alta, o que também é ruim para os reumáticos e para pessoas que têm gota.
Como medir a umidade em casa?
GONÇALVES: O higrômetro é o aparelho que mede a umidade, e não é caro. Mas uma maneira fácil é abrir o armário e ver se há manchinhas brancas nele. Cheque se as roupas, principalmente as brancas, estão levemente amareladas e se os sapatos estão levemente esverdeados. Isso já mostra que a umidade está acima de 70%. Isso significa que o fungo está crescendo no lugar que tem comida e umidade.
O que fazer para manter a umidade em níveis ideais dentro de casa?
GONÇALVES: Nessa época do ano, abra os armários, tire toda a roupa, e passe pano seco nos armários ou algum produto de limpeza que mate fungos. Coloque coletores de umidade, desses que vendem nos supermercados em potinhos, dentro do armário. Coloque as roupas e os lençóis no sol, para desinfetar o máximo possível. O desumidificador é um aparelho um pouco mais caro que o umidificador. Mas para quem tem crianças asmáticas e para os alérgicos, que são sensíveis aos ácaros e fungos, o desumidificador é bom, pois faz com que fungos não soltem esporos e que os ácaros se desenvolvam menos.
Qual a umidade ideal para os ácaros?
GONÇALVES: É de 85%. No meu quarto, nos dias em que chove muito, a umidade chega a essa faixa. A mesma coisa acontece em todos os quartos de São Paulo, do Rio e mais ainda na Região Serrana do Rio. Algumas bactérias gostam de secura e outras gostam de umidade. Os dois tipos têm que ser combatidos.
No que se refere à saúde, para que tipo de pessoa a baixa umidade é boa e para quem é ruim?
GONÇALVES: Quando a umidade está entre 40% a 70%, todo mundo se sente bem. Para os alérgicos, quanto mais baixa a umidade, melhor, porque tem menos ácaros e fungos. Num avião, a umidade chega a 5%, porque o ar é misturado ao ar externo e lá em cima é muito seco. Essa umidade muito baixa faz com que todos os equipamentos fiquem preservados. Umidade alta estraga tudo, não só comida. Mas para os alérgicos é bom, porque não se espirra. É claro que ficar muito tempo nessa umidade não é bom, tem que beber muita água e evitar álcool.
Muitos aconselham colocar toalhas molhadas e baldes de água pela casa em época de baixa umidade. Isso é bom ou ruim?
GONÇALVES: É ruim. Fui na casa de uma pessoa com uma colega que mede o número de esporos jogados pelos fungos na atmosfera aqui em São Paulo, em setembro, na época seca. Onze pessoas viviam na casa, a sala não tinha janelas, tinha tapete, um cachorro e a quantidade de esporos que registramos foi absurda: 30 mil por metro cúbico, sendo que acima de mil esporos por metro cúbico já se considera o ambiente insalubre.
O que fazer quando a umidade fica entre 12% ou 15%?
GONÇALVES: Abra os armários e seque as coisas em casa. À noite, quando as pessoas vão dormir, a umidade quase sempre vai para 80% ou 90%.

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