Sob os olhares de uns poucos curiosos, o francês Pascal Maurice Kahan retira da bolsa a engenhoca de madeira, as bobinas e as partituras com as letras das músicas que logo se espalharão pelo ar em clima de nostalgia. Tocador de realejo, ele é um representante de um grupo de profissões que marcou os costumes de séculos passados, mas que hoje está mais presente na memória de antigas gerações do que nas ruas da cidade.
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São charreteiros, lambe-lambes, entregadores de leite fresco, funileiros, amoladores de faca e outros tantos artesãos, que, assim como muitas espécies da nossa fauna, estão em extinção. Eles são quase uma realidade paralela num Rio que, sempre apressado, vive contrariando um principio básico de Lavoisier, aquele que diz que na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Em relação às antigas profissões, aqui nada mais se transforma, tudo se descarta.
— A falta de segurança transformou as ruas em corredores de passagem para quem vai de um ponto ao outro. O medo fez com que as pessoas perdessem o hábito de passear pelas ruas e praças, aproveitando o dia. Estão sempre correndo, vivem para trabalhar e só saem às ruas para fazer compras — opina Maurice, enquanto monta seu pequeno palco, na Praça General Glicério, em Laranjeiras, onde costuma se apresentar nas manhãs de sábado.
Guia turístico por profissão, há alguns anos ele decidiu se tornar tocador de realejo. O instrumento comprado na França é cópia de um modelo criado em 1890:
— Na Europa o realejo ainda está bem vivo. Mas lá eles não vêm acompanhados de aves que tiram a sorte, como era a antiga tradição do Rio — diz o artista, que não conhece outros tocadores de realejo no Rio, apenas em São Paulo e no Sul do país.
Conhecidos pela raridade do serviço que realizam, outros artistas espalhados pela cidade recebem encomendas até mesmo de estados distantes. É o caso do funileiro Arturo Bloise Filho, que conserta panelas e é famoso no Leblon. O artesão pode ser visto diariamente na esquina da Rua João Lira com a Avenida Ataulfo de Paiva:
— Tenho fregueses em Brasília, Fortaleza e até em Manaus. São profissionais que viajam para cá em serviço e aproveitam para fazer consertos, já que não encontram funileiros onde moram — comentou o artesão, que aprendeu a profissão com o pai.
Já o amolador de facas Antônio Barbosa Lima chama a clientela da forma mais tradicional, com o ruído inconfundível do metal em contato com o afiador.
— Esse aparelho tem uns cem anos. Só eu, trabalho com ele há 40 — afirmou.
Ele, no entanto, lamenta “a invasão chinesa” que teria feito com que a maioria dos amoladores desaparecesse.
— Eu cobro R$ 5 para amolar e tem faca custando R$ 2. Desde que os produtos chineses invadiram o mercado, as pessoas não consertam mais seus objetos. Descartam — afirmou .
O empalhador Francisco da Silva concorda. Um dos raros artesãos que trabalham com palha indiana para recuperar móveis, ele reclama também da falta de incentivos:
— Além dessa invasão de mercadorias baratas e descartáveis, existe o problema da legislação. Hoje não existe mais a figura do aprendiz.
Os produtos chineses também ajudaram a acabar com a maior parte dos consertadores de guarda-chuvas. No Rio, uma das únicas sobreviventes é a loja Guarda-Chuvas Tia Lu, na Avenida Passos.
— Depois da abertura no governo Collor, o mercado brasileiro sofreu muito, pois os impostos dos produtos brasileiros não caíram. Mas haverá sempre os consumidores de produtos de qualidade, que ainda preferem o conserto — comenta Ailton Barbosa, terceira geração da empresa criada por seu avô em 1956.
Lambe-lambe do Jardim do Méier é raridade
Outro profissional que sumiu das praças é o fotógrafo lambe-lambe. Responsáveis pelos registros instantâneos de gerações de brasileiros desde Dom Pedro II, foram varridos pela tecnologia digital. O último a deixar a rua foi Bernardo Soares Lobo, depois de 56 anos trabalhando na Praça Jardim do Méier:
— Eu só parei devido a um enfarte que sofri há dois anos.
Aos 85 anos, ele lembra que o mercado de fotografia de rua era bastante aquecido.
— Havia muita procura. Só aqui no Jardim do Méier éramos oito. Também tinham 18 no Campo de Santana, seis na Praça Tiradentes, outros seis no Largo do Machado, 11 na Praça XV, e quatro na General Osório. Hoje não tem mais nenhum — conta o português Bernardo, que aprendeu a profissão ao chegar ao Rio.
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