quinta-feira, 12 de julho de 2012

Te Contei, não ? - A Imprensa que deturpa



A interferência da mídia na discussão das cotas nas universidades se deu até o momento de forma controversa, dada a influência que esta exerce na opinião pública de modo geral e, principalmente, na parcela intelectual do país

A partir de sua pretensão de imparcialidade, os principais veículos de comunicação reforçam ideias contrárias às cotas. A chamada da revista Veja de junho de 2007 com o título Raça não existe, é um bom exemplo de texto polêmico que disfarça a inconsistência dos argumentos. A capa resume o caso de irmãos gêmeos que tiveram classificação diferente no sistema de cotas, embora dentro da matéria os exemplos utilizados levem em consideração apenas o viés negativo das medidas propostas na política de cotas. A mídia brasileira começou a dar mais visibilidade às discussões envolvendo as cotas nas universidades a partir de 2003, segundo a pesquisa A Mídia Impressa no Brasil e a Agenda da Promoção da Igualdade Racial, que analisou as matérias publicadas entre os anos de 2001 e 2008. De acordo com o Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) e Observatório de Mídia, a tendência desfavorável dos três maiores jornais do país ficou clara nos textos opinativos, em sua maioria, contrários às cotas. O tema só recebeu atenção destes jornais quando um fato político de grande repercussão propunha discutir a estrutura do ensino no país, como em 2006, quando foram publicados 86 textos sobre cotas, impulsionados, principalmente, pelo projeto de lei apresentado na Câmara dos Deputados, que instituía a política de cotas nas Universidades e Escolas Técnicas Federais.
Entre as três principais revistas de circulação nacional, o número de textos publicados sobre cotas nas universidades superou outros temas como Ações Afirmativas, Cultura e Religião, e Estatuto da Igualdade Racial, dentre outros. A iniciativa de algumas Universidades em apoio às cotas foi reportada sempre com a preocupação de mostrar os conflitos gerados e a incongruência dos critérios, minimizando as ações e metodologias do processo de inserção dos alunos pelo sistema de cotas.
UMA VISÃO RUIM
De acordo com um estudo realizado por Ana Paula Evangelista de Almeida (UFJF) e Glauber Loures de Assis (UFMG), o enquadramento contrário das cotas aparece como predominante em três das quatro revistas mais influentes do país. Das cinco reportagens publicadas pela revista Veja, todas tinham o viés contrário às cotas nas universidades, enquanto a Carta Capital - sua concorrente direta em relação à posição política - apresentou o mesmo número de reportagens sobre a temática, mas todas com enquadramento favorável às ações afirmativas. Esta diferença evidente entre a posição das revistas representa a importância destas no cenário político nacional, uma vez que a relação entre política e revistas se dá de forma clara e parcial.
Outro aspecto destacado no estudo de Almeida e Assis foram os argumentos usados frequentemente sobre o caráter de "meros atos de benevolência do governo" e "violadores de princípios constitucionais". O abuso de adjetivações, metáforas e dados estatísticos que ressaltam os problemas enfrentados em outros países na adoção de cotas foram utilizados a exaustão pelas revistas Veja, Isto É e Época, que se baseavam em opiniões desfavoráveis de cientistas, acadêmicos e de alunos que se consideram prejudicados com a implantação do sistema de cotas.
O estudo indicou que apenas a Carta Capital oferecia informações de fontes favoráveis à medida educacional
implementada na UnB, utilizando o argumento de que esta é uma maneira de tornar a sociedade mais justa, propiciando uma igualdade fática.
Mesmo com a capacidade de agendamento que a mídia tem ao fornecer e formar opinião, o insucesso dos jornais e revistas em depreciar a política de cotas junto à população é evidente antes mesmo da decisão do STF. Em julho de 2006, uma pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha mostrou que 65% dos entrevistados eram favoráveis às cotas nas universidades, principalmente após os resultados das primeiras turmas de alunos cotistas, que ajudou a desmistificar alguns argumentos do discurso das pessoas contrárias às cotas.
A grande imprensa discutiu o assunto de forma conotativa, opinativa e, muitas vezes, sensacionalista, fazendo com que as notícias sobre a constitucionalidade das cotas tenham que ser analisadas quanto ao conteúdo e à estrutura destes discursos. A aversão em admitir as cotas como um assunto importante na sociedade mostrouse persistente este ano, mesmo com o debate aberto realizado no mês de abril. Embora a decisão do STF tenha sido histórica - uma vez que o principal argumento utilizado por estes veículos questionava a legitimidade e a constitucionalidade das cotas - a decisão sobre o novo Código Florestal teve mais destaque que os processos
julgados pelo Supremo Tribunal Federal. Ainda que o assunto tenha sido reconhecido como importante nas reportagens on-line, a cobertura dos veículos impressos foi pífia perto da magnitude da discussão sobre o tema.


Raça Brasil

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